08 Janeiro 2016
Numerosos líderes de países insulares do Oceano Pacífico aclamaram o acordo alcançado na COP 21 para deter a mudança climática, por considerarem que reflete um momento sem precedentes em matéria de solidariedade mundial em torno de um tema caracterizado pelo fratura entre as nações em desenvolvimento e as industrializadas. Entretanto, para esses países, que consideram o aquecimento global a principal ameaça à sua existência, o acordo somente será um êxito se as palavras forem seguidas por ações concretas.
A reportagem é de Catherine Wilson, publicada por Envolverde, 06-01-2015.
“É um grande avanço e não creio que teria sido possível sem as vozes dos indígenas dos países insulares do Pacífico, unidos e reclamando ação e justiça”, afirmou à IPS a ativista e poeta Kathy Jetnil-Kijiner, das Ilhas Marshall, que participou da 21ª Conferência das Partes (COP 21) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática (CMNUCC), realizada em Paris entre os dias 30 de novembro e 12 de dezembro. “Sou muito otimista sobre o futuro”, acrescentou.
A COP 21 se caracterizou por intensos compromissos e fortes negociações por parte dos 195 países, além da União Europeia (UE). Dame Meg Taylor, secretária-geral do Fórum das Ilhas do Pacífico, destacou que, “apesar de não estarem incluídos todos os assuntos identificados pelos países da região no documento final, houve avanços substanciais”. Por exemplo, “o reconhecimento da importância de se continuar os esforços para limitar o aumento da temperatura em 1,5 grau Celsius, a inclusão de danos e perdas como um elemento separado no acordo, bem como acesso simplificado e ampliado aos fundos para a mudança climática”, pontuou.
Claire Anterea, da Rede de Ação Climática de Kiribati, um atol de aproximadamente 110 mil habitantes, acrescentou que o resultado foi “bom, mas não perfeito”, e destacou que o novo objetivo em relação ao aumento da temperatura e o chamado para melhorar os fundos para o clima foram particularmente importantes.
A Organização Meteorológica Mundial prognosticou que 2015 terá sido o ano mais quente já registrado, com elevação da temperatura global média um grau acima da era pré-industrial. Enquanto isso, os países do Pacífico se preparam para um século com maior aumento da temperatura e do nível do mar, para a acidificação dos oceanos e branqueamento dos corais. O aumento máximo do nível do mar poderia chegar a 0,6 metros em muitos Estados insulares, segundo o Programa Científico de Mudança Climática do Pacífico.
No melhor dos casos, Kiribati e Papua-Nova Guiné poderiam registrar aumento de 1,5 grau na temperatura, mas com elevadas emissões contaminantes, podendo chegar a dois graus em 2090. O aquecimento global poderia levar a produção de batata doce, alimento básico em muitos países, a diminuir mais de 50% em Papua-Nova Guiné e nas Ilhas Salomão até 2050, segundo estimativas do Banco de Desenvolvimento Asiático.
O peso de perder a produção agrícola recairá sobre a população feminina dos países insulares, principais responsáveis pelo cultivo e produção de alimentos, e busca de água. Os moradores dos Estados insulares encabeçaram uma campanha em Paris, em 2015, para fixar um novo limite ao aumento de temperatura de 1,5 grau. Argumentaram que isso é fundamental para deter futuros golpes climáticos e também mitigar os deslocamentos forçados, pois as ilhas se tornam cada vez mais inabitáveis devido à perda de alimentos, água e terras.
Em um claro sinal da mudança de opinião nos países industrializados, os Estados insulares contaram com apoio de numerosas nações em desenvolvimento e ricas na Coalizão de Grande Ambição, surgida na segunda semana da COP 21. Entre os países que expressaram sua solidariedade, destacaram-se Alemanha, Brasil, Estados Unidos, México, Noruega e União Europeia. O acordo final de Paris, que busca limitar o aumento global de temperatura a menos de dois graus e “perseguir esforços” para reduzi-la outro 0,5 grau, foi um êxito da Coalizão.
O limite de “1,5 grau nem mesmo estava na mesa antes do início da Conferência, por isso, na primeira vez que ouvi que havia sido integrado ao texto, chorei aliviada. Mas a redação imprecisa definitivamente me preocupou e sei que exigirá uma pressão contínua de todos nós para que efetivamente esse objetivo seja alcançado”, destacou Jetnil-Kijiner. Isso não diminuirá os enormes desafios que a região já enfrenta para adaptar-se a um clima extremo, ao qual as pequenas economias insulares sem acesso a fundos internacionais não poderão fazer frente.
Os governantes da região pediram à comunidade para honrar seu compromisso de reunir US$ 100 bilhões por ano até 2020 para financiar a adaptação nos países em desenvolvimento, objetivo fixado pela primeira vez na COP 15, realizada em Copenhague em 2009. Desde então,as avaliações sobre quanto se conseguiu reunir variam, mas o Banco Mundial afirmou, em abril do ano passado, que ainda faltavam US$ 70 bilhões.
Taylor acredita que “é positiva a perspectiva dos fundos climáticos para depois de 2020, pois o Artigo 9 do Acordo de Paris identifica que, para os pequenos Estados insulares em desenvolvimento, os fundos para a adaptação têm que ser públicos e baseados em concessões”.Debateu-se sobre os mecanismos financeiros, como o Fundo Verde para o Clima, serem concedidos a fundos livres ou empréstimos condicionados.
Anterea destacou que, para serem efetivos, os fundos “precisam chegar às pessoas necessitadas por meio de um método simples de processamento”. O reconhecimento das perdas e dos danos causados pelo clima extremo e pelos desastres naturais no acordo final também foi um êxito, acrescentou a secretária do Fórum das Ilhas do Pacífico, ainda que isso não habilite as nações vulneráveis a reclamarem nenhuma dívida ou compensação aos grandes contaminadores.
A maior esperança está nos compromissos vinculantes contraídos pelas nações para fixar objetivos de redução de emissões e se submeterem a um longo processo de controle e revisões, medida que vai acelerar a transição global para as energias renováveis e dificultará mais a queima de combustíveis fósseis, os maiores responsáveis pelas emissões contaminantes.
“Necessitamos de uma revisão de cinco anos como passo fundamental para que os governos sejam responsáveis por nossos objetivos e nossas metas”, ressaltou Jetnil-Kijiner. Se não se incentivar as nações a melhorarem cada vez mais seus objetivos, o planeta poderá continuar rumo a um aumento devastador de temperatura de 2,7 graus ou mais, concluíram os especialistas.
A questão mais grave, depois que passou a euforia pelo acordo global alcançado em Paris, é como serão implantadas essas nobres promessas. Os habitantes dos países insulares do Pacífico dependem disso.
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Acordo climático: “bom, mas não perfeito” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU