26 Outubro 2011
O célebre cientista Roger Penrose ilustra a sua teoria cosmológica. "A minha ideia é um pouco maluca e se baseia no fato de que, para uma entidade como o fóton, não existe o transcorrer do tempo". "Nessa hipótese, misturam-se ingredientes muito diferentes: filosofia, geometria, física e talvez religião".
A análise é de Roger Penrose, físico matemático inglês e professor emérito de matemática da Universidade de Oxford, em artigo publicado no jornal La Repubblica, 21-10-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Gostaria de explicar uma ideia um pouco maluca (que poderia não ser tão maluca, afinal!) que eu tive há pouco tempo refletindo sobre a cosmologia e a natureza do Big Bang e do tempo. Em poucas palavras, essa ideia fornece uma perspectiva completamente nova em relação à pergunta, muito frequente: "O que havia antes do Big Bang?". A resposta que eu proponho contém um modo curioso, mas plenamente racional, de considerar aquilo que esperamos ser o destino do nosso universo em expansão acelerada, e mostra como tudo isso pode ser reinterpretado como o "Big Bang" de um universo completamente novo! (...)
À parte da "ideia maluca" – e as ideias ligadas a ela –, todos os assuntos sobre os quais eu falarei são absolutamente normais e em nada "loucos". Descreverei, por necessidade, algumas noções de física das partículas, de cosmologia e de relatividade geral, especialmente os aspectos relacionados com o Big Bang, os buracos negros e os seus vínculos essenciais com a segunda lei da termodinâmica. É necessário, ao mesmo tempo, que eu vincule a minha "ideia maluca" a algumas outras tentativas de obter algo vagamente semelhante e que eu explique uma certa inadequação geométrica da qual sofrem essas tentativas anteriores.
Mais exatamente, conectarei as minhas ideias ao que foi sugerido por Lee Smolin em 1997 com A Vida do Cosmos. Outros físicos, dentre os quais J. A. Wheeler, já sugeriram coisas semelhantes. Segundo a proposta de Smolin, todas as vezes em que um buraco negro entra em colapso, a singularidade do espaço-tempo resultante não representa "o fim dos tempos" para o material que entra em colapso, mas fornece sim as "sementes" para um universo novo, onde a singularidade final do colapso, de algum modo, é "revirada" e constitui a singularidade inicial (ou seja, o Big Bang) de um universo completamente novo!
Seguindo a ideia original de Wheeler, que não se referia aos buracos negros, mas sim ao Big Crunch de um universo fechado em fase de colapso, Smolin explica que, nas condições incrivelmente extremas dessa singularidade espaço-temporal (que entre em colapso e depois se expande) se verificariam minúsculas mudanças nas constantes fundamentais da natureza (...).
Em todos esses modelos, propõe-se que haja algum efeito de gravidade quântica, que transforma a singularidade derivante do colapso em uma singularidade que causa uma expansão (um "Big Bang") de um novo universo. Mesmo que uma ideia como essa seja altamente especulativa, trata-se de uma proposta apresentada muitas vezes, a partir da solução cosmológica de Friedmann para um universo fechado de 1922, em que há ciclos infinitos de expansão e de colapso, com o "Big Crunch" de um ciclo que se torna o "Big Bang" do posterior por meio de um efeito qualquer (desconhecido) de gravidade quântica.
O efeito que eu sugiro é completamente especulativo, mas eu mesmo, há muito tempo, tenho uma outra objeção a esse tipo de propostas que deriva da segunda lei da termodinâmica e dos argumentos a ela relacionados da geometria de um "Crunch" e de um "Bang", que nos dizem que os dois não se "encaixam" um no outros, nem mesmo com os melhores esforços da imaginação. Por essas razões, de fato, por muito tempo eu tive a tendência de considerar todos esse tipo de ideias como muito "loucas" para ser levadas a sério!
Hoje, no entanto, foi introduzido um fator novo, que emerge de uma recente observação cosmológica (1998): a expansão do universo está se acelerando e, por consequência, provavelmente, a constante cosmológica de Einstein (introduzida por ele relutantemente em 1917) é diferente de zero e tem valor positivo, embora pequeno. Muitas vezes, referimo-nos a ela como "energia escura". Essa expansão acelerada leva a uma imagem mais "chata" das últimas fases do destino do universo. Não haverá nenhum Big Crunch, e o universo se tornará (exponencialmente) cada vez mais vazio. No fim, a matéria dotada de massa e os buracos negros (segundo uma ideia contemporânea muito plausível) decairão ou evaporarão (os buracos negros, depois de um período incrivelmente longo, desaparecem emitindo força sob forma de radiação de Hawking) e não vai restar nada mais do que radiação sem massa. Uma verdadeira chatice!
Em 1979, Freeman Dyson descreveu uma representação desse tipo em um artigo intitulado Tempo sem fim: Física e biologia em um universo aberto, argumentando com grande habilidade – e talvez com um otimismo ainda maior – que um universo como esse não deveria ser tão chato, afinal de contas. Mas isso foi antes que se soubesse da expansão acelerada!
E aqui entra em jogo a minha "ideia maluca": como os elementos que sobrevivessem a esse (chato) universo na sua fase final veriam a sua própria existência? De um modo muito diferente do quadro pintado pouco acima, porque, para uma entidade sem massa como um fóton, não existe o transcorrer do tempo (efeito bem conhecido da relatividade especial de Einstein).
Para um fóton livre ou para uma outra partícula sem massa, o "fim dos tempos" já está aqui! Os fótons conhecemos apenas o cone de luz [a superfície que descreve a evolução temporal de um raio luminoso em um formalismo matemático usado na relatividade especial], e não o "tique-taque do relógio", que confere ao espaço-tempo a estrutura métrica de Einstein.
Os cones de luz não conferem uma métrica, mas apenas aquilo que chamamos de estrutura conforme. A eternidade sem fim desse universo sempre em expansão, do ponto de vista da conformidade, não é de maneira nenhuma sem fim, mas é equivalente a um universo em colapso que abre espaço para um "Big Crunch", ou, consequentemente, para um universo novo que se expande a partir de um "novo" Big Bang. Não há um "Big Crunch" verdadeiro, mas algo que se comporta exatamente como ele do ponto de vista das entidades sem massa, que, agora, são os únicos constituintes materiais de todo o universo! É esse estado das coisas que faz com que nasça o "novo universo" com o seu novo Big Bang.
Para que essa ideia funcione, o novo Big Bang deve necessariamente ter os vínculos extraordinariamente especiais que parecem existir no nosso universo e que nos dão a segunda lei da termodinâmica assim como a conhecemos, por coerência com as observações cosmológicas. Agora descobrimos que esse "Crunch" (conforme) e esse "Bang" se encaixam bem geometricamente (no sentido preciso que se dá ao termo em geometria conforme), mas isso só acontece se essa extraordinária peculiaridade ocorre realmente – a fim de explicar o segundo, em certo sentido – e as diversas características geométricas e observacionais parecem estar em harmonia umas com as outras. Além disso, espera-se que as características observacionais do nosso universo possam ser postas em relação com as previsões do esquema que proponho.
Claramente, essas ideias envolvem inúmeros ingredientes de tipo muito diferentes entre si: encontramos motivações filosóficas (religiosas até?), geometria cosmológica, geometria conforme, física conforme, constantes (variáveis?) da Natureza e princípio antrópico, física das partículas, física estatística e cosmologia. Há também uma mistura da boa velha física e matemática e de algumas ideias altamente especulativas. E, como sempre, é essencial deixar muito claro onde terminam umas e começam outras.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Por que pode nascer um universo novo. Artigo de Roger Penrose - Instituto Humanitas Unisinos - IHU