11 Abril 2025
As hóstias e o vinho litúrgico usados na missa vêm da agricultura convencional, o que evidencia a incoerência de se comungar com produtos da agroindústria, em conflito com os valores espirituais de cuidado e respeito pela criação.
A informação é de Sophie Vincelot, publicada por La Croix, 11-04-2025.
Durante a Eucaristia, “fonte e ápice da vida cristã”, o pão e o vinho, frutos da terra e do trabalho humano, tornam-se o corpo e o sangue de Cristo. Mas as hóstias e o vinho usados na missa são dignos de tal sacramento? Não, responde Benoît Sibille, professor de filosofia no Instituto Católico de Paris, ao expressar surpresa diante da indiferença que a Igreja parece demonstrar quanto à origem das hóstias e do vinho.
“Comungamos com pão feito de trigo cultivado em solo morto, saturado de fertilizantes sintéticos e pesticidas […] e com vinho produzido a partir de uvas impregnadas de insumos químicos, muitas vezes colhidas por mão de obra estrangeira explorada”, escreveu ele. “Damos graças ao cosmos ao mesmo tempo em que o destruímos”, esclareceu ao La Croix. “Para que o simbolismo eucarístico funcione, é preciso considerar a dimensão material. Caso contrário, temos uma espiritualidade que se recusa a encarar a realidade do mundo.”
Em 2017, em uma carta dirigida aos bispos do mundo inteiro sobre a escolha do pão e do vinho, o Vaticano permitiu a presença de transgênicos na “matéria eucarística”. Para alguns, isso pareceu distante da ecologia integral promovida pelo Papa Francisco em sua encíclica Laudato si’, onde o respeito à natureza, a justiça social e a fé cristã estão interligados. O direito canônico, por sua vez, permanece firme: “O pão deve ser feito de trigo puro, recentemente preparado, de modo a evitar qualquer risco de corrupção. O vinho deve ser natural, feito de uvas, e não pode estar corrompido.”
“Se o pão e o vinho exploram seres humanos e a Criação por meio de pesticidas, há um problema sério”, alertou o padre Xavier de Bénazé, jesuíta e coordenador do centro espiritual ecológico de Châtelard. “O impacto ecológico pode ser mínimo, mas religiosamente, é enorme.”
No entanto, o tema teve dificuldade para emergir entre os católicos, mesmo que algumas paróquias demonstrem espírito de iniciativa. “Essa questão nunca nos foi colocada”, admitiu o padre Gilles Drouin, diretor do Instituto Superior de Liturgia do Instituto Católico de Paris. “Ao utilizarmos água, pão, vinho e óleo, a sacramentalidade nos revela o sentido profundo da Criação”, insistiu. “A ligação entre a Eucaristia e a Criação não reside tanto na rastreabilidade do pão e do vinho, mas em algo mais profundo. O pão e o vinho são a matéria que o Espírito utiliza para fazer surgir um mundo novo. Isso fundamenta um amor à Criação que vai além de uma simples resposta a um preceito moral.”
Uma diferença de interpretação se junta a uma questão mais material: a oferta de produtos orgânicos ainda é escassa. Mesmo dentro da Église verte (Igreja verde), um selo que ajuda comunidades cristãs em sua conversão ecológica, o eco-diagnóstico oferecido aos membros não menciona nem o vinho nem as hóstias. “Ouço falar mais de hóstias orgânicas por parte de não cristãos do que de católicos”, admitiu Juliette Maupas, responsável pela rede de embaixadores. “Enquanto não houver demanda por parte dos fiéis, os mosteiros não adotarão farinha orgânica.”
E os produtos litúrgicos não escapam à dura lei da concorrência. Na França, cerca de 100 milhões de hóstias são produzidas anualmente, divididas entre aproximadamente 20 mosteiros e produtores industriais. A chegada à Europa do gigante americano Cavanagh, uma padaria atacadista que fabrica hóstias, abalou o equilíbrio do mercado. Com uma filial na Polônia, a empresa pratica preços mais baixos, obrigando as religiosas a lutar para continuar competitivas.
As Clarissas de Cormontreuil, perto de Reims, cidade no norte da França, estão entre as poucas que utilizam farinha orgânica. “É um custo extra, mas não intransponível, graças ao nosso moleiro, que aceitou produzi-la”, disse a irmã Élisabeth Marie. Para essa comunidade, trata-se de uma questão de coerência. “Buscamos respeitar a Criação. Fazer uma hóstia não é apenas usar farinha orgânica, é também manter uma relação com o nosso moleiro.”
Em 2024, foram vendidas ali 2,5 milhões de hóstias — bem atrás da abadia de Blauvac, com seus 20 milhões. “Os mosteiros franceses não conseguem atender toda a demanda. Aqui, já não temos capacidade de produção para sustentar mais dez anos”, continuou a irmã Élisabeth Marie.
Para o vinho litúrgico, que se aproxima dos vinhos naturais e orgânicos, os desafios são semelhantes. O mercado representaria cerca de 300 mil garrafas compradas por ano, segundo a La Revue du vin de France, uma prestigiada revista francesa sobre vinhos publicada desde 1927. O problema é que os produtores frequentemente precisam competir com os preços de entrada dos supermercados, observou Aude-Reine Anouil, coproprietária da vinícola biodinâmica Domaine de La Bénisson-Dieu, que forneceu 12 garrafas para a consagração de Notre-Dame de Paris em dezembro de 2024 — e também o vinho da missa presidida pelo Papa Francisco no estádio Vélodrome, em Marselha, em setembro de 2023. A reação das paróquias foi morna: “Algumas compraram nossas garrafas, para estar em comunhão com Notre-Dame, mas foi só isso”, lamentou.
A conservação do vinho permanece um obstáculo. “Por isso ele é frequentemente adocicado e sulfitado. É preciso pensar em recipientes específicos para evitar a oxidação”, explicou Anouil. Mas, por falta de demanda, sua vinícola ainda não desenvolveu uma solução dedicada.