14 Janeiro 2025
Pelo menos 17 indígenas foram baleados entre dezembro e janeiro, entre eles crianças e adolescentes; lideranças denunciam tortura, racismo e falta e proteção do Estado.
A reportagem é publicada por ClimaInfo, 13-01-2025.
Uma semana após ser baleado num ataque em área reivindicada pelos Avá-Guarani entre os municípios de Guaíra e Terra Roxa, no oeste do Paraná, um indígena de 25 anos, cujo nome não foi revelado, recebeu alta hospitalar na 6ª feira (10/1). Outro baleado no ataque, de 28 anos, continua internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) no Hospital Bom Jesus de Toledo.
Segundo o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), o ataque ocorreu na noite de 3 de janeiro na comunidade Yvy Okaju – antiga Y’Hovy –, na Terra Indígena Tekoha Guasu Guavirá, em Guaíra, e deixou quatro Avá-Guarani feridos por tiros. Além dos dois adultos, uma criança de 7 anos e um adolescente de 14 anos foram atingidos por tiros, informa o g1.
A violência contra os indígenas começou dias antes. Em 29 de dezembro, plantações e barracos da comunidade foram queimados. No dia 31, duas horas antes da virada do ano, novas áreas foram queimadas, e um indígena foi baleado no braço, segundo a Carta Capital.
Esse episódio de violência se soma à série de ataques que os Avá-Guarani vêm sofrendo há tempos, enquanto aguardam a conclusão da demarcação de suas terras. E ocorre dias antes do aniversário de 1 ano do ataque mais brutal que os indígenas sofreram na história recente, em 10 de janeiro do ano passado, lembra a Agência Pública, em matéria reproduzida por Nexo e ICL Notícias.
“Não teríamos coragem de fazer isso com uma criança dos brancos. É uma verdadeira covardia”, afirmou uma liderança indígena que preferiu não se identificar por falta de segurança. “Já falamos para as autoridades, mais de uma vez, que a nossa situação é uma verdadeira calamidade. Parece que ninguém vai conseguir fazer nada por nós”, desabafou.
A autoria do recente ataque ainda é desconhecida, mas as ameaças já eram de conhecimento público e das autoridades na região, mostram áudios compartilhados em grupos de mensagens de Guaíra. Neles, homens não identificados planejavam contra a vida dos indígenas e até mesmo dos militares da Força Nacional.
“Enquanto não matar uns dez caras desse aí, vai continuar essa patifaria de querer invadir tudo…”, diz um dos áudios. Em outro se ouve: “Tem que meter chumbo nessa Nacional, nessa polícia que tá protegendo eles [os Avá-Guarani]. Se aparecer um doido com fuzil e peneirar as viaturas dessa Nacional, quero só ver se eles vão ficar ali protegendo bugre [forma pejorativa que usam para se referir aos indígenas].”
No domingo retrasado (5/1), a Justiça Federal do Paraná determinou que os governos federal e do Paraná aumentassem a proteção policial próximas às comunidades Avá-Guarani, relata o Correio Braziliense. A decisão foi do juiz Pedro Pimenta Bossi, da 3ª Vara Federal de Umuarama (PR), após pedido do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU).
Com o aumento da violência, os indígenas vivem em estado de alerta permanente, e crianças não conseguem mais dormir com medo de ataques realizados à noite, contou à Revista Fórum uma das lideranças da comunidade, cuja identidade também foi preservada por segurança.
“O que mais tememos é pelas nossas crianças, porque a gente não tem mais a segurança de andar pela nossa aldeia, porque um desses baleados estava andando pela estrada de dentro da aldeia, acharam ele e simplesmente atiraram. Ele perdeu parte do queixo, que foi destruído”, relatou. “A gente não consegue mais fazer nem a nossa refeição, porque o menino de 7 anos e o irmão dele estavam jantando dentro de casa quando foram baleados. Seis pessoas encapuzadas chegaram atirando.”
Os Guarani Kaiowá também continuam sob ameaça. A Agência Pública esteve recentemente no chamado Cone Sul do Mato Grosso do Sul visitando Laranjeira Nhanderu e outras retomadas Guarani Kaiowá. Desde julho, a região passa por uma grave crise de segurança após seguidos ataques de pistoleiros e fazendeiros contra jovens indígenas. Em 17 de dezembro último, completaram-se cinco meses de presença contínua de agentes da Força Nacional em áreas ocupadas por indígenas. Mas não há sinal de diminuição da tensão na área – vide recentes denúncias de violência policial contra indígenas da Reserva Indígena de Dourados (MS) atacados durante um protesto por acesso à água em novembro.
O inquérito da Polícia Federal que apura genocídio e omissão de socorro contra os indígenas Yanomami vai completar dois anos sem ter sido concluído. A investigação começou após determinação do ex-ministro da Justiça, Flávio Dino, em 23 de janeiro de 2023, logo nos primeiros dias do governo Lula. O decreto de Dino que determinou a abertura do inquérito citava o incentivo político a garimpos ilegais em Terras Indígenas, além da falta de ações de saúde e estratégias para segurança alimentar dos Yanomamis durante a gestão Bolsonaro. O Metrópoles apurou que os investigadores da PF estudaram vasta documentação sobre o assunto, mas há um desafio por conta da falta de dados consistentes sobre a situação dos indígenas. Vários delegados já passaram pelo inquérito.
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No Paraná, violência contra indígenas Avá-Guarani atinge até crianças - Instituto Humanitas Unisinos - IHU