11 Outubro 2024
O aquecimento global torna os furacões superdestrutivos duas vezes mais prováveis e esgota até mesmo os recursos de uma potência como os EUA: 250 milhões de pessoas em todo o mundo foram deslocadas por desastres climáticos entre 2013 e 2023.
A reportagem é de Raúl Rejón, publicada por El Salto, 10-10-2024.
Desde que, em 2006, a revista Time ilustrou sua manchete de capa "Preocupe-se muito" sobre a mudança climática com a imagem de um urso polar buscando um pedaço de gelo marinho para pular, esse animal se tornou o ícone da crise climática – "é quase impossível não associá-los à mudança climática", descreve esta pesquisa sobre o simbolismo do animal. Talvez uma atualização plausível fosse passar do urso polar para uma fila quilométrica de seres humanos fugindo de um furacão, uma inundação ou uma seca. Mesmo que seja nos Estados Unidos.
Não sai de graça. Saturar a atmosfera com gases de efeito estufa resulta em aquecer o planeta – e especialmente o mar – a níveis perigosos. Esses oceanos alimentam furacões superdestrutivos como Helene ou Milton, que atingem a todos: a maior economia do mundo é incapaz de se blindar, apesar de seus recursos, diante da força da mudança climática. Só Milton obrigou três milhões de pessoas a fugir de uma vez na Flórida.
O aquecimento global causado pelas emissões de gases das atividades humanas torna os furacões devastadores agora duas vezes mais prováveis, segundo concluem os cientistas do World Weather Attribution (WWA). Esta semana, foi observado algo inédito nos registros por satélite: três furacões ativos ao mesmo tempo no Atlântico Norte já entrados no mês de outubro: Leslie, Milton e Kirk – cuja fase final passou perto da Espanha e deixou rajadas de vento de 200 km/h.
Milhões de pessoas precisam abandonar suas casas a cada ano devido a episódios meteorológicos extremamente violentos provocados pela alteração do clima. A crise de Milton fez a transição de imagens de animais em perigo para imagens do primeiro mundo assolado pelo impacto, previsto e cumprido, da crise climática.
O Banco Mundial calculou em 2021 que a mudança climática "poderia forçar o deslocamento de 216 milhões de pessoas até 2050". Entre 2013 e 2023, esse fenômeno acumulou 250 milhões de deslocados em todo o mundo, segundo o Centro de Vigilância do Deslocamento Interno (IDMC). O próprio Banco Mundial – sob a presidência de David R. Malpass, que foi proposto por Donald Trump – explicava que "reduzir as emissões globais de gases e apoiar um desenvolvimento verde, resiliente e inclusivo poderia reduzir a migração climática em até 80%".
Somente em 2022, foram contabilizados 31 milhões de deslocados por causa do clima, sendo 7,5 milhões especificamente por ciclones. No ano seguinte, em 2023, foram mais 20 milhões (9,8 deles por inundações e outros 9,5 por tempestades).
Embora seja verdade que os Estados Unidos "costumam registrar algumas das cifras de deslocados por desastres naturais mais elevadas da região" – 500 mil pessoas em 2022 e 200 mil em 2023, segundo o IDMC – esses dois anos os países com o maior número de deslocados por esses fenômenos foram China – com mais de sete milhões – Filipinas – sete milhões – Paquistão, Índia, Nigéria, Somália e Bangladesh.
Um relatório do Departamento do Tesouro dos Estados Unidos afirmava que os desastres meteorológicos de 2022 provocados pela mudança climática (não apenas os furacões) custaram ao país 165 bilhões de dólares "sem contar o impacto em vidas perdidas, a carga sobre o sistema de saúde e sobre as famílias deslocadas pela crise climática".
Os Estados Unidos têm a maior potência econômica do mundo, em termos globais, para enfrentar esse impacto, com um produto interno bruto de 27 trilhões de dólares, segundo o Banco Mundial. Somente em Miami Beach, desde 2017, há um orçamento de 500 milhões de dólares para tentar suportar os impactos do mar, por meio da elevação do nível das estradas, instalação de estações de bombeamento e melhoria do sistema de drenagem de água da chuva.
É verdade que muitas cidades dessa região nem conseguem contar com um orçamento dessas características. A Flórida é o sexto estado do país com mais desigualdade econômica, segundo o coeficiente de Gini, e também tem um governador, Ron DeSantis, que eliminou qualquer referência à mudança climática de sua legislação, ao mesmo tempo em que afirmava: "Estamos devolvendo a sanidade ao nosso enfoque sobre energia e expulsando a agenda dos fanáticos verdes radicais".
Se olharmos para os países com mais deslocados por desastres climáticos, a China tem um PIB de 17 trilhões, as Filipinas têm uma economia de 437 bilhões, similar à de Bangladesh. O Paquistão dispõe de um PIB de 374 bilhões de dólares.
O pesquisador de furacões da Universidade de Miami, Brian McNoldy, disse no último dia 6 de outubro: "O alto conteúdo de calor no oceano fornece a um furacão uma fonte constante de combustível". E como esse conteúdo de calor está subindo? A maior parte do excesso de calor retido pela "crescentes quantidade de gases de efeito estufa" fica no mar.
Os pesquisadores estão alertando há mais de um ano e meio sobre o calor extremo nos oceanos. "Território desconhecido", foi como o chamaram em abril de 2023. A tendência não diminuiu nos meses seguintes, que começaram a tornar obsoletas as escalas dos meteorologistas. Em 2024, a temperatura do Atlântico Norte, em geral, e do Golfo do México, em particular, indicavam um ano perigoso para furacões. Nas últimas semanas, o número de furacões neste período chegou a nove, enquanto a média de 1991-2020 é de 5,5.
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A imagem da fatura climática já não é mais um urso polar, mas sim milhões de evacuados em Milton, na maior economia mundial - Instituto Humanitas Unisinos - IHU