03 Agosto 2024
O governador do Paraná, Ratinho Jr. (PSD), referiu-se aos indígenas Avá Guaranis do Oeste do estado como “índios paraguaios”, durante uma entrevista à imprensa nesta quarta-feira (31). A fala se referia ao posicionamento de Ratinho, que diz não aceitar “invasões indígenas”, referindo-se à ocupação de terras nas cidades de Terra Roxa e Guaíra. O Departamento de Antropologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR) repudiou a fala do governador por meio de uma nota que destaca o quanto se desrespeita e desconsidera a história e os direitos dos povos indígenas brasileiros, além de reforçar estigmas e preconceitos que alimentam a violência contra esses povos.
A reportagem é publicada por Brasil de Fato – Paraná, 01-08-2024.
Segundo informações do site Parágrafo 2, fazendeiros da região ingressaram com ações judiciais para reintegração de posse de terras na região sendo atendido pelo juiz João Paulo Nery dos Passos Martins, da 2ª Vara Federal de Umuarama. O governador do Paraná solicitou reunião com o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, e chegou a dizer que se não houver nenhum tipo de interferência do governo federal, entrará com medidas judiciais.
Segundo informou a Agência Estadual de Notícias, existem liminares de sete ações de reintegração de posse e cinco interditos proibitórios. Importante destacar que para questões relativas aos povos indígenas é necessário a intermediação do Ministério da Justiça, Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e Polícia Federal.
A nota do Departamento de Antropologia ainda expressa solidariedade à luta dos Avá Guarani pela demarcação da Terra Indígena Guasu Guavirá. A demarcação é essencial para a proteção dos direitos e da cultura desse povo, que historicamente ocupa essa região.
“Evidências arqueológicas e antropológicas, amplamente documentadas, atestam a ancestralidade da presença indígena na região. O documentário “Ygá Mirî – Resgate emergencial de canoa localizada no sítio arqueológico Ciudad Real del Guayrá”, produzido em parceria entre o Iphan, as lideranças Avá Guarani e a Coordenação do Patrimônio Cultural do Estado do Paraná, evidencia a longa ocupação do povo Avá-Guarani no território paranaense. Essas descobertas são fundamentais para a compreensão da história e da cultura desse povo, destacando a continuidade de sua ocupação e sua conexão inalienável com a terra”, diz a nota.
O Departamento de Antropologia e o Programa de Pós-Graduação em Antropologia e Arqueologia da Universidade Federal do Paraná vêm a público manifestar seu repúdio às declarações recentes do governador do Paraná, Ratinho Jr., que de forma equivocada e permeada de preconceito, referiu-se aos Avá Guarani do oeste paranaense como “índios paraguaios”. Esta fala desconsidera a história e os direitos dos povos indígenas brasileiros, além de reforçar estigmas e preconceitos que alimentam a violência contra esses povos.
Mais do que refutar uma fala preconceituosa, esta nota tem como objetivo expressar nossa solidariedade à luta dos Avá Guarani pela demarcação da Terra Indígena Guasu Guavirá. A demarcação é essencial para a proteção dos direitos e da cultura desse povo, que historicamente ocupa essa região.
Evidências arqueológicas e antropológicas, amplamente documentadas, atestam a ancestralidade da presença indígena na região. O documentário “Ygá Mirî – Resgate emergencial de canoa localizada no sítio arqueológico Ciudad Real del Guayrá”, produzido em parceria entre o IPHAN, as lideranças Avá Guarani e a Coordenação do Patrimônio Cultural do Estado do Paraná, evidencia a longa ocupação do povo Avá-Guarani no território paranaense. Essas descobertas são fundamentais para a compreensão da história e da cultura desse povo, destacando a continuidade de sua ocupação e sua conexão inalienável com a terra. Além disso apontam caminhos fundamentais para uma melhor compreensão da história e formação do Estado do Paraná como um todo.
Os Avá Guarani, também conhecidos como Nhandéva, são descendentes dos antigos guaranis de Guairá e Mbaracayú, que tiveram contato com colonizadores europeus desde o século XVI. Como destacado pelo antropólogo Bartomeu Meliá, estes povos foram fortemente explorados na lavoura de erva-mate, e muitos foram forçados a buscar refúgio em reduções jesuítas ou a empreender um dramático êxodo para o sul.
O atual conflito se agrava devido à demora na demarcação da Terra Indígena Guasu Guavirá, historicamente ocupada pelos Avá Guarani. A região tem sido palco de conflitos e violência, e os remanescentes deste povo têm enfrentado dificuldades, incluindo remoções forçadas e separação de famílias. Após anos de luta, em 2018, a Funai identificou e delimitou a terra indígena, mas essa decisão foi anulada pelo próprio órgão em 2020. Em 2023, a Funai retomou o processo de demarcação, desencadeando duas ações judiciais no Tribunal Regional da Quarta Região (TRF-4), uma delas movida pelo município de Guaíra.
Neste contexto, ressaltamos o disposto no Artigo 231 da Constituição Federal, que reconhece os direitos dos povos indígenas às terras que tradicionalmente ocupam, e assegura o respeito a suas formas de organização social, costumes, línguas, crenças e tradições. As terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas são de sua posse permanente e os direitos sobre elas são inalienáveis. Qualquer decisão que desconsidere esses direitos constitucionais representa uma grave violação às garantias fundamentais dos povos originários.
A ameaça de uso de força policial em ações de reintegração de posse não apenas viola os direitos fundamentais dos povos indígenas, mas também exacerba o clima de tensão e violência na região. Apelamos às autoridades para que respeitem os direitos dos povos indígenas e reiteramos nosso apoio às comunidades Avá Guarani de Guaíra e Terra Roxa e nos solidarizamos com sua luta por reconhecimento e justiça.
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Departamento de Antropologia da UFPR repudia fala de Ratinho Jr. sobre indígenas do Paraná - Instituto Humanitas Unisinos - IHU