17º domingo do tempo comum – Ano B – Subsídio exegético

26 Julho 2024

"Quem é Jesus? É aquele que reparte o pão e mostra o caminho para uma nova forma de se relacionar com os bens da criação e com os irmãos e irmãs!"

O subsídio é elaborado pelo grupo de biblistas da Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana – ESTEF:

Dr. Bruno Glaab
Me. Carlos Rodrigo Dutra
Dr. Humberto Maiztegui
Me. Rita de Cácia Ló
Edição: Prof. Dr. Vanildo Luiz Zugno

Leituras do dia

Primeira Leitura: 2Rs 4,42-44
Salmo: 144, 10-11.15-16.17-18
Segunda Leitura: Ef 4,1-6
Evangelho: Jo 6,1-15

Eis o texto.

Contexto literário

O Evangelho deste Domingo está dentro do chamado “Livro dos Sinais” (1,19-12,50), que, segundo alguns comentaristas, busca responder à pergunta: “Quem é Jesus?”. Em João 6 trata-se da “comensalidade”. Jesus se revela como “Palavra Encarnada” (Jo 1,14) na história humana e o faz em forma de alimento compartilhado (Jo 6,53). Mas, por que o alimento é tão importante para a revelação do “ser” de Jesus Cristo?

O texto em si (Jo 6,1-15)

O sinal e seu contexto – vv. 1-4

A palavra grega semeion, isto é, “sinal”, está relacionada neste texto às pessoas doentes (excluídas do sistema sócio-religioso de pureza-impureza imposto pelas autoridades de Jerusalém e do Templo). Jesus realiza o sinal no meio daquelas pessoas que a religião dominante não considerava dignas do amor de Deus (v.2). Junto a esta referência social está o fato do sinal ser feito próximo a celebração da “Páscoa dos judeus”. “Os judeus” não é uma referência “religiosa”, mas política, mostrando que Jesus se revela na periferia (Galileia), entre pessoas excluídas, em territórios desconsiderados, dando um novo sentido ao centro da revelação judaica que é Páscoa!

O enfrentamento dos sofrimentos e a fome do povo – vv. 5-7

A multidão não é um povo organizado, mas um grupo de pessoas em busca de ajuda para enfrentar seus sofrimentos e que tem que comer. Jesus desafia a sua comunidade de discipulado a enfrentar esta questão social e econômica de alimentar a multidão. Felipe, condicionado pela na lógica de uma economia de mercado, entende que o desafio é sem solução, pois não considera a partilha como valor, mas apenas a capacidade de compra com dinheiro.

O sinal: uma criança pobre e a alternativa que Jesus promove no meio do povo – vv.8-11

Outro discípulo, André (um antigo discípulo de João, que reconhece Jesus e chama seu irmão, Pedro, cf. Jo 1,35-41), traz uma criança – paidarion – menor de 13 anos quando se considerava adulto – que, possivelmente ouvindo a conversa, coloca aquilo que tinha para compartilhar. Embora esta narrativa apareça também nos Evangelhos Sinóticos (Mt, Mc e Lc) a presença da criança só acontece aqui! A contagem total de sete (cinco pães e dois peixes) – comum a todas as narrativas – tem o sentido simbólico de ser tudo o necessário – como os sete dias da criação – para ser compartilhado. Mesmo assim, André – se somando a Felipe – ainda duvida desta possibilidade. O pão de cevada é o das pessoas mais pobres, que não conseguiam comprar pão de trigo. A criança pobre traz a alternativa da partilha! Jesus a concretiza organizado as pessoas em grupos – pequenas comunidades e dando graças (eucaristia, como referencial de fé para a partilha comunitária, vv.10-11).

O reconhecimento da identidade de Jesus através do sinal da partilha – vv.12-14

Na nova relação econômica e organização da partilha, de economia solidária, nada se perde! O sinal alcança seu objetivo ao ser reconhecido pelos “homens”, isto é, aqueles que antes estavam “presos” à visão de mercado, e agora vem no “ser” de Jesus uma alternativa a exclusão e o abandono, dizendo: “Este é verdadeiramente o profeta que devia vir ao mundo” (v.14).

O perigo da má interpretação do sinal – v.15

O povo percebeu que Jesus apresentou uma alternativa social-econômica-política e religiosa ao sistema de exclusão, no entanto, pretendem fazer dele um “rei” reproduzindo o mesmo sistema. A fuga de Jesus desta não deve ser interpretada como uma opção “apolítica”, mas como sinal de que a proposta política de centralização de poder não era compatível com o Evangelho de Jesus.

Relacionando com os outros textos

Este sinal da partilha, completado por Jesus como revelação central de seu “ser”, presente em todos os Evangelhos, já tinha sido apresentado antes. Na primeira leitura deste Domingo, o profeta Eliseu promove a partilha de pães consagrados de cevada – pão dos pobres – dado a Deus em oferta dos primeiros frutos, para alimentar o povo faminto (2 Rs 4,42).

Na Carta aos Efésios se destaca que a fé se vive nas relações interpessoais de apoio mutuo (Ef 4,1). Portanto, o projeto de Deus concretizado na Palavra Encarnada, Jesus Cristo, não pode ser desenvolvido sem que promova novas relações sociais, econômicas, políticas e religiosas capazes de abraçar todas as pessoas, sem exclusão, a começar por aquelas mais sofridas e necessitadas.

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