14º domingo do tempo comum – Ano B – A fé que gera compromisso com a justiça e a dignidade humana

05 Julho 2024

"Hoje, essa passagem desafia a Igreja e a sociedade, nós Vida Religiosa Consagrada a reconhecer e valorizar os marginalizados, as minorias, os pobres, os grupos sociais que são vulneráveis, nós, mulheres, povos indígenas, afro-descentes, quilombolas e tantos e tantos. O evangelho nos chama a criar comunidades inclusivas e justas, onde todos e todas tenham a oportunidade de contribuir e prosperar. A Igreja é convocada a estar ao lado dos pobres, defendendo seus direitos e trabalhando ativamente pela justiça social.

Marcos 6,1-6 é um chamado à solidariedade com os marginalizados e à luta por justiça. Ele nos lembra que a fé verdadeira implica ação e compromisso com a transformação social. Jesus, ao enfrentar a rejeição, nos mostra que a libertação dos oprimidos é central à missão de Deus. Somos desafiadas/os a seguir esse exemplo, promovendo a dignidade e os direitos de todos os seres humanos, para que assim, a ecologia integral e o bem viver seja uma realidade em toda a humanidade."

A reflexão é de Elis Alberta Ribeiro Dos Santos, sdp, é religiosa da congregação das Irmãs da Divina Providência. Ela é formada no Curso sequencial de Teologia pela Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana - ESTEF, Porto Alegre/RS. Mestra em Antropologia Social (UFRGS) e Graduada em Pedagogia (FT-Manaus/AM), com Especialização em Orientação Educacional (UCB), ela é pesquisadora Mura da região do Médio/Amazonas. Atualmente é assessora da CRB do Regional Amazonas/Roraima, integra o secretariado Nacional da Economia de Francisco e Clara e é coordenadora da Casa Amazônica de Francisco e Clara de Manaus, integra a Comissão da Ecologia Integral da Arquidiocese de Manaus, assim como o comitê local da Rede Pan-Amazônica/REPAM.

Leituras do dia

1ª leitura: Ez 2,2-5
Salmo: Sl 122(123),1-2a.2bcd.3-4 (R. 2cd)
2ª leitura: 2Cor 12,7-10
Evangelho: Mc 6,1-6

Eis a reflexão

Estamos no 14° domingo do tempo comum e a liturgia de hoje nos ajuda refletir e a rezar a partir de uma experiência de um Deus que não se manifesta de uma maneira espetacular, mas no pequeno, na fraqueza, nas fragilidades das vidas humanas e não humanas.

 

Contexto do Texto

No evangelho de Marcos 6, 1-6, Jesus retorna à sua terra natal, Nazaré, e enfrenta a incredulidade dos seus conterrâneos. Eles questionam sua autoridade, lembrando-se dele apenas como "o carpinteiro, filho de Maria". Diminuindo também a pessoa de Maria, que pode representar aqui as minorias marginalizadas. A falta de fé deles impede que Jesus realize muitos milagres naquela região, e Ele fica admirado com a incredulidade deles.

A rejeição de Jesus pelos seus conterrâneos pode ser vista como um símbolo da rejeição que os pobres e marginalizados enfrentam em nossas próprias comunidades. A partir do evangelho podemos enfatizar que Deus se identifica com os pobres e oprimidos. Jesus, sendo rejeitado, mostra que Ele compartilha da experiência de exclusão e marginalização que muitos enfrentam. Isso reforça a mensagem de que a presença de Deus é especialmente evidente na luta dos pobres por justiça.

A incredulidade dos nazarenos pode ser vista como uma metáfora para as estruturas sociais e econômicas que perpetuam a opressão e a injustiça. A pergunta "Não é este o carpinteiro?" revela um preconceito baseado na ocupação e na origem humilde de Jesus. A partir dessa pergunta é possível refletir sobre a existência das estruturas que oprimem as pessoas com base em sua classe social, raça ou origem. É preciso valorizar a dignidade e o valor de todos os indivíduos.

A incredulidade dos nazarenos não só surpreende Jesus, mas também limita o que Ele pode fazer ali. Este trecho nos desafia a pensar sobre o poder da fé e como nossas crenças (ou a falta delas) podem afetar não só nossas vidas, mas também a atuação de Deus em nosso meio. Na prática, isso nos convida a abrir nossos corações e mentes, a ter fé e a estar dispostas/os a ver e receber as maravilhas que podem surgir, mesmo das fontes mais inesperadas.

Apesar da rejeição, Jesus continua sua missão. Ele é um profeta que não se deixa deter pela falta de fé dos outros. Podemos ver nisso um chamado à perseverança na luta por um mundo mais justo e mais fraterno. Mesmo diante de resistências e incredulidades que vamos encontrar no caminho. Nós seguidoras/es de Jesus somos chamadas/os a continuar trabalhando pela transformação social, confiando no poder de Deus para mudar as circunstâncias.

A falta de milagres em Nazaré devido à incredulidade dos seus habitantes sugere que a transformação requer a participação ativa e a fé da comunidade. Nesse sentido, é necessário enfatizar a importância da ação comunitária. A mudança social não é apenas obra divina, mas também um esforço coletivo. É necessário que a comunidade acredite na possibilidade de transformação e trabalhe junta para alcançar a justiça.

Mesmo sendo rejeitado Jesus continua ensinando e curando onde é possível. Esta atitude nos inspira a perseverar em nossa própria missão e vocação, mesmo quando enfrentamos resistência ou falta de reconhecimento. É um convite à resiliência e à persistência, confiando que nossos esforços têm valor, mesmo que os resultados não sejam imediatamente visíveis.

Hoje, essa passagem desafia a Igreja e a sociedade, nós Vida Religiosa Consagrada a reconhecer e valorizar os marginalizados, as minorias, os pobres, os grupos sociais que são vulneráveis, nós, mulheres, povos indígenas, afro-descentes, quilombolas e tantos e tantos. O evangelho nos chama a criar comunidades inclusivas e justas, onde todos e todas tenham a oportunidade de contribuir e prosperar. A Igreja é convocada a estar ao lado dos pobres, defendendo seus direitos e trabalhando ativamente pela justiça social.

Marcos 6,1-6 é um chamado à solidariedade com os marginalizados e à luta por justiça. Ele nos lembra que a fé verdadeira implica ação e compromisso com a transformação social. Jesus, ao enfrentar a rejeição, nos mostra que a libertação dos oprimidos é central à missão de Deus. Somos desafiadas/os a seguir esse exemplo, promovendo a dignidade e os direitos de todos os seres humanos, para que assim, a ecologia integral e o bem viver seja uma realidade em toda a humanidade.

Primeira leitura: Ezequiel 2,2-5

O texto que nos é proposto como primeira leitura faz parte do longo relato da vocação de Ezequiel (cf. Ez 1,1-3,27). O profeta descreve o seu chamado por Deus para a missão (cf. Ez 2,1-3,15). Ele é enviado a uma nação rebelde. Deus lhe dá força e coragem para falar aos israelitas, mesmo sabendo que muitos não ouvirão.

Ezequiel, como qualquer outro “profeta”, é um “filho de homem”, um “homem comum”, igual a todos os outros homens. Tem os limites e dificuldades que qualquer ser humano tem; mas isso não é impedimento para a missão. Deus, ao eleger o “profeta”, dá-lhe a autoridade e a capacidade para levar a cabo a missão de que o incumbe. Portanto, as fragilidades que fazem parte da nossa dimensão de “humanos” não podem, em nenhuma circunstância, servir de desculpa para não cumprirmos a nossa missão profética em meio a tantas realidades sofridas e injustas.

É importante enfatizar a partir da ação profética de Ezequiel a necessidade de uma voz profética que se levante contra as injustiças sociais. Ezequiel representa o papel do profeta que, apesar das adversidades e da resistência, é chamado a anunciar a palavra de Deus. Este chamado é essencial para a missão da Igreja na luta contra a opressão. A missão de Ezequiel ressoa com a luta contínua dos pobres e oprimidos que buscam justiça e dignidade.

Salmo 123(122)

"Para ti levanto os meus olhos, a ti que habitas nos céus. Como os olhos dos servos se fixam nas mãos de seus senhores, assim os nossos olhos estão voltados para o Senhor, nosso Deus, até que tenha compaixão de nós."

O Salmo reflete a confiança e a esperança em Deus, mesmo em meio à adversidade. Este salmo é um lembrete da importância da fé e da esperança no processo de libertação.

Segunda leitura: 2 Coríntios 12,7-10

Texto: Paulo fala sobre o "espinho na carne" que o atormenta, mas reconhece que o poder de Deus se manifesta na fraqueza humana. "Basta-te a minha graça, pois é na fraqueza que a força se manifesta plenamente."

Neste texto de Paulo (como, aliás, em quase todos os textos do apóstolo), transparece a atitude de vida de um cristão para quem Cristo é, verdadeiramente, o centro da própria existência e que só vive em função de Cristo… Nada mais lhe interessa senão anunciar as propostas de Cristo e dar testemunho da graça salvadora de Cristo.

Paulo nos lembra que a força de Deus se aperfeiçoa na fraqueza, e isso nos encoraja a reconhecer a dignidade e o valor intrínseco dos pequenos e frágeis. A vulnerabilidade não é um sinal de fracasso, mas uma oportunidade para a ação transformadora de Deus.

Em síntese

A liturgia do 14º domingo do Tempo Comum nos convida a refletir sobre a nossa vocação profética e a presença de Deus na fraqueza e na luta dos oprimidos. Esses textos nos inspiram a continuar a luta por justiça, a confiar na misericórdia de Deus e a reconhecer a dignidade dos pobres como portadores da graça divina. Eles nos lembram que a verdadeira transformação social e espiritual vem da coragem de falar a verdade e da resistência à opressão, mesmo quando enfrentamos rejeição e adversidade.

Leia mais