29 Mai 2023
A confiança na Igreja na América Latina caiu nos últimos 25 anos, por exemplo, "em 1996 era difícil encontrar na rua uma pessoa que dissesse não ser católica, enquanto hoje não somos a maioria: os católicos professos caíram de 80% para 56% desde então”. Assim o explica Marta Lagos, diretora do Latinobarómetro, empresa encarregada de realizar estudos de opinião de todo tipo em toda a América Latina, fundada em 1995 e que a cada ano aplica cerca de 20.000 entrevistas em 18 países, representando mais de 600 milhões de habitantes.
Marta, que é chilena, aponta que esse declínio “simboliza um forte processo de secularização. A América Latina cresceu, as pessoas tiveram acesso a bens materiais, há um processo de materialismo forte e que afasta as pessoas da religião e as empodera, e as pessoas se sentem tremendamente incluídas na sociedade através do comércio". Soma-se a esse declínio a ascensão do agnosticismo, com maior preponderância em países como Uruguai, Argentina e Chile.
A verdade é que “mais de metade da população da América Latina ainda é católica” e em cerca de 10 países continua a ser a dominante, mas “já não é a América Latina dos anos 90: deixou de ser aquela região unanimemente católica". Em mais 25 anos, esse número pode dobrar, ameaçando a existência do catolicismo no "continente da esperança" a uma taxa de 1% a menos de fiéis por ano.
A entrevista com Marta Lagos, diretora do Latinobarómetro, é de Ángel Alberto Morillo, publicada por Vida Nueva Digital, 28-05-2023.
Como explica este fenômeno de diminuição?
Hoje os países da América Latina vivem momentos muito difíceis, porque a comunicação entre as pessoas e as instituições se deteriorou a um ponto crítico. E me parece que, nesse sentido, a Igreja está tentando reparar essa deficiência, pelo menos em sua área.
O Papa Francisco, lendo os sinais dos tempos, nos incentiva a viver a sinodalidade. Qual é a sua opinião sobre isso?
Ouvir Francisco quebrou muitos mitos sobre a trajetória da Igreja. O Papa tem saído para fora, abandonando um pouco da pompa do Vaticano, que servia para afastar. Olha, tão simples como quando a Igreja decidiu virar o altar e olhar para o povo, este também é um exercício dessa natureza: sair ao encontro do povo.
Parece-me que neste sentido o Papa deu passos muito importantes. Agora, isso é uma questão cultural, não basta o Pontífice dar a ordem e dizer o que quer que aconteça. Aqui está uma questão tanto dentro da Igreja quanto dentro das sociedades, que são difíceis de mudar e levam muito tempo. Parece-me que esta sinodalidade está justamente penetrando o máximo possível nas comunidades, escutando as pessoas para tentar iniciar este caminho de mudança cultural.
Que outros aspectos você considera que afetam a crise do catolicismo?
Junto com a secularização, é preciso dizer que neste processo de degradação das instituições (democracia, parlamento, partidos políticos, sistema judicial, governo), a Igreja Católica também caiu nesta crise de credibilidade. Não tanto quanto os políticos, porém, isso não serve de consolo. Mas, para colocar a dimensão, e embora não seja apenas um problema da Igreja, sem dúvida, os escândalos da Igreja contribuíram enormemente para o declínio.
A pergunta é: como teria sido o declínio da Igreja sem os escândalos? É uma pergunta hipotética que não tem resposta, mas a resiliência do catolicismo na América Latina é tremendamente forte. Qualquer outra instituição que cometesse os erros que a Igreja cometeu teria deixado de existir.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
“A resiliência do catolicismo na América Latina é muito forte”. Entrevista com Marta Lagos, diretora do Latinobarómetro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU