03 Outubro 2022
"Sem perceber, Koch cai no erro que quer denunciar contra o Sínodo alemão: usa representações que nada têm a ver com revelação para julgar a legitimidade da ação sinodal", escreve o teólogo italiano Andrea Grillo, professor do Pontifício Ateneu Santo Anselmo, em artigo publicado no blog Come Se Non, 01-10-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Numa sequência vertiginosa, o Cardeal Koch dá uma entrevista ao Tagespost em que equipara os textos do Sínodo alemão aos excessos do nazismo. O presidente da Conferência Episcopal Alemã pede desculpas públicas e o cardeal tenta retificar, mas complica ainda mais a questão.
No texto de retificação, o cardeal admite que não avaliou suficientemente a suscetibilidade dos alemães quando se fala de nazismo. Na realidade, a questão não diz respeito aos alemães, mas sim aos dois suíços em jogo: por um lado Karl Barth, autor daquelas teses de Parmen (1934) a que pretende referir-se Koch, e do outro lado, o próprio Koch, que mostra um grave problema na compreensão do sentido e contexto daquelas declarações.
Como dizia Barth em 1933-34, também nesse caso não nos interessa a questão de atualidade, mas a questão básica: ou seja, em que sentido seria legítimo ou não admitir outras fontes de revelação além da Escritura (Barth) e da Tradição (Koch).
Mas devemos nos perguntar em que contexto Barth colocava essa pergunta, aliás legítima. O contexto era o de um estado totalitário, que pretendia impor à Igreja Protestante um sistema de Führer em nível regional e central. Barth reagia duramente à ideia de que fosse a política a estruturar a Igreja.
A maneira como Koch lê as afirmações de Barth é colocada em um contexto completamente diferente, a menos que se queira validar aquela leitura simplista que lê o mundo atual, inclusive alemão, como a "ditadura do pensamento único" que também imporia à Igreja novas prioridades e evidências.
Na realidade, o que o Sínodo alemão está fazendo é precisamente um trabalho de interpretação da Palavra de Deus e da Tradição. Este é o erro contido no juízo de Koch que inevitavelmente o leva, ao contrário do Barth de quase cem anos antes, a conclusões integralistas e fundamentalistas.
Se julgássemos as mulheres apenas com base em algumas afirmações de Paulo e não também com base no desenvolvimento cultural dos últimos duzentos anos, seríamos teólogos desesperados. Se fôssemos julgar pessoas homossexuais com base em alguns versículos do Antigo Testamento e poucas referências do Novo Testamento, seríamos teólogos presunçosos. Se tentássemos depois usar apenas dois exemplos que o próprio Koch nos fornece em que o pensamento alemão é julgado com base na velha tríade de ver-julgar-agir, pensaríamos em julgar um fenômeno de 2022 com algumas categorias obsoletas dos anos 1950. Sem perceber, Koch cai no erro que quer denunciar contra o Sínodo alemão: usa representações que nada têm a ver com revelação para julgar a legitimidade da ação sinodal.
Uma pérola final está na denúncia de uma geração teológica que pretende fazer teologia partindo da liberdade. São pelo menos duzentos anos que a melhor teologia europeia leva a sério esse ponto de partida e não o descarta, como Koch pretenderia, a simples ponto de chegada.
Ler Barth simplesmente como um antimodernista, uma tentação muito presente na teologia católica, é uma maneira de interpretá-lo definitivamente mal. Como escreveu o melhor intérprete de Barth, E. Juengel, justamente o teólogo que parece excluir a experiência de sua teologia, é quem nos faz ter a experiência teológica mais intensa. O problema, portanto, não é a suscetibilidade alemã, mas a fidelidade dos suíços a seus pensadores do passado. Afinal, aqui o Sínodo é apenas o pretexto para mostrar o que é uma teologia ruim diante da "existência teológica de grandes predecessores".
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Barth versus Koch: sinais dos tempos como nazismo e modernismo? Artigo de Andrea Grillo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU