Stefano Mancuso é especialista em botânica e professor do Departamento de Ciências das Produções Vegetais, do Solo e do Ambiente Agroflorestal da Universidade de Florença, onde fundou e dirige o Laboratório Internacional de Neurobiologia Vegetal (LINV). Membro fundador da International Society for Plant Signaling & Behavior, ele lecionou em universidades japonesas, suecas e francesas, e é acadêmico da Academia dos Georgófilos.
O comentário é do físico italiano Luigi Togliani, em artigo publicado em Settimana News, 26-09-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
As ideias norteadoras de seus estudos partem da constatação, nada óbvia, de que “as plantas não se limitam a viver, mas também são capazes de sentir”. No campo da divulgação científica, escreveu inúmeros livros. Os mais recentes são: “Botanica” (2017 e 2021), “L’incredibile viaggio delle piante” (2018), “La nazione delle piante” (2019), “La pianta del mondo” (2020).
No dia 10 de setembro de 2022, no Festivaletteratura, Mancuso animou o evento intitulado “Por um planeta verde”, no qual comparou os principais dados das mudanças climáticas com a vida das plantas.
O ano de 2020 será lembrado como o ano da Covid, mas ainda mais como o momento em que a massa dos produtos humanos (cimento, plástico etc.) superou a massa da vida, isto é, a dos seres vivos. A massa dos seres humanos vivos é igual a 0,01% da massa da vida, mas o ser humano determinou uma mudança epocal. Basta pensar que, há 100 anos, a massa dos produtos do ser humano era inferior a 1% da massa da vida: em um século, viramos o mundo de cabeça para baixo. Como isso pôde acontecer?
Acima de tudo, reduzimos fortemente a massa da vida. Sabemos que, há 12.000 anos, quando o ser humano, de coletor e caçador, se tornou agricultor, havia seis trilhões de árvores. Hoje, restam três trilhões, a metade; destas, nada menos do que dois trilhões foram eliminadas nos últimos dois séculos.
Uma prova disso é a destruição da floresta amazônica, resíduo de floresta primária ainda intocada pelo ser humano. Na Europa, as florestas primárias desapareceram nos últimos dois séculos; em 1820, uma pessoa viajando de Palermo a Oslo atravessaria florestas primárias quase ininterruptamente.
As florestas que temos hoje no continente europeu foram feitas pelo ser humano. A floresta primária é importante porque contém a maioria das espécies vivas; destruindo-a, colocamos em risco todos os seres vivos que a habitam. A cada ano, registramos um saldo negativo de 15 bilhões de árvores, apesar do reflorestamento.
O relatório de 2021 da Universidade de Cambridge sobre a biodiversidade nos informa sobre as consequências da destruição das florestas. A zoonose, a passagem de vírus dos animais aos humanos, triplicou nos últimos 50 anos e determina 75% das doenças humanas (Ebola, HIV e talvez a Covid). Hoje, assistimos a um desmatamento fragmentado: cortam-se pedaços de floresta primária para estabelecer atividades humanas (extrações, lavouras, pecuária), enquanto o ser humano é vítima dos vírus presentes na floresta primária.
Tudo isso também tem um peso econômico: a Covid já custou mais de dois trilhões de dólares. Mas, sobretudo, há um custo ambiental enorme pelas transformações realizadas: por exemplo, 96% dos mamíferos vivos são ou seres humanos ou animais criados pelo ser humano; 85% das aves são para consumo humano; para os peixes, calcula-se que daqui a 50 anos restarão apenas os de criação.
Estamos no meio da sexta extinção em massa da história. A quinta ocorreu no fim do Cretáceo, há cerca de 66 milhões de anos, provavelmente causada por um asteroide que caiu no Yucatán: o clima mudou, e, nos dois milhões de anos seguintes, pelo menos 75% das espécies desapareceram. Hoje, temos uma taxa de extinção semelhante à de então, estimada entre 1.000 e 10.000 vezes maior do que a normal, mas que está ocorrendo em poucas décadas.
Em segundo lugar, hoje construímos muito material sintético. Pensemos que a China produz em um amo tanto cimento quanto o produzido nos Estados Unidos nos últimos 100 anos. Na Terra, a massa total de cimento é 1,5 vezes a das plantas, a massa de plástico é o dobro da de todos os animais. O que mais chama a atenção é a rapidez com que essas transformações ocorrem.
A redução da biodiversidade se soma ao aquecimento global, causado pela emissão na atmosfera de gases do efeito estufa produzidos pelo ser humano (isso é conhecido pela ciência há 80 anos). De 1800 até hoje, a temperatura média terrestre aumentou 1,3°C. Nos nós climáticos territoriais, o aumento é maior: na área mediterrânea, já é de +2,0°C.
O objetivo é permanecer abaixo de +1,5°C até 2100, mas agora já é uma meta difícil de alcançar. Mesmo que parássemos com todas as emissões hoje, a concentração de CO2 na atmosfera aumentaria por mais 40 anos. Os cenários mais confiáveis preveem um aumento térmico médio variável de +2°C a +4°C até o fim do século.
Parece pouco um aumento de apenas +1,5°C, mas não é assim. Por exemplo, pensemos que uma diminuição de apenas -0,5°C levou à criação de uma pequena era glacial na Europa entre 1450 e 1750. E, por outro lado, um aumento de +2,0°C poderia aumentar a temperatura corporal, dificultando a vida para nós.
Um estudo do Politécnico de Zurique mostra que, em 50 anos, Roma terá o clima atual de Túnis, e Trieste, o da Catânia; Londres, o de Barcelona; e as cidades do sul da Itália terão um clima semelhante ao do sul do Sahel. Os lugares inabitáveis hoje são cerca de 1% das terras emersas, mas em 2070 serão 18%, e nesses 18% vivem dois bilhões de pessoas.
Devemos esperar fortes migrações climáticas em massa e não poderemos mais dizer “ajudemo-los na casa deles”.
O que está acontecendo é ainda pior do que os modelos preditivos. Por isso, devemos procurar zerar as emissões o mais rápido possível. Nos últimos quatro milhões de anos, a concentração de CO2 na atmosfera era estável na casa dos 220 ppm; hoje, é de 421 ppm, com um aumento anual, respectivamente, de 1 ppm no período de 1980 a 2000, de 1,5 ppm de 2000 a 2010, e de 2 ppm de 2010 a 2020.
O aquecimento global é o problema mais sério que a humanidade já enfrentou: temos que inverter a rota e diminuir a concentração de CO2 o mais rápido possível. Mas essa intenção encontra a resistência dos governos, na convicção de que reduzir CO2 traz menos riqueza.
Se a situação é essa, o que podemos fazer? Certamente, é necessário nos esforçar ao máximo para reduzir as emissões de gases do efeito de estufa (em particular o CO2). Mas essa mudança exige tempos longos, talvez 100 anos, tempos que não podemos nos permitir, dada a gravidade da situação.
Podemos ganhar cerca de 60 anos plantando árvores, porque as plantas absorvem CO2 para construir sua biomassa. Cada euro que investimos no plantio de árvores rende 1.000 vezes mais do que poderíamos obter com qualquer tecnologia. As árvores devem ser plantadas sobretudo nas cidades, que ocupam 1,6% das terras habitáveis, produzem 85% dos resíduos e 80% do CO2, consumindo 80% dos recursos.
Perguntemo-nos: por que não plantamos árvores? Quantas devemos plantar? Há espaço suficiente?
É difícil responder à primeira pergunta (talvez porque somos idiotas?). Quanto ao restante, foi calculado que é preciso plantar um trilhão de árvores, restaurando assim a metade daquelas que destruímos nos últimos 200 anos. O espaço existe, se quisermos agir da maneira certa.
Sabemos que 50% das terras habitáveis hoje são usadas para agricultura e pecuária, uma superfície tão grande quanto cinco vezes o tamanho dos Estados Unidos. Cerca de 80% dessa superfície é dedicada à produção de alimentos de origem animal, que fornecem ao ser humano 20% das calorias e 23% das proteínas. Com os restantes 20% de terreno agrícola, produzimos alimentos de origem vegetal, que fornecem 80% das nossas necessidades calóricas e 77% das nossas necessidades proteicas.
Bastaria reduzir o consumo de carne em 25% para liberar uma área igual à dos Estados Unidos, suficiente para abrigar um trilhão de árvores necessárias. Portanto, alcançar o objetivo não é fácil, mas também não é impossível. Mas, para fazer isso, é necessária uma conversão ecológica radical, que exige longos percursos educativos, dirigidos sobretudo aos jovens.
Nós, humanos, acreditamos que somos a melhor espécie pelo uso que fazemos do nosso cérebro. Mas, para sermos melhores, devemos demonstrar que sabemos alcançar antes das outras espécies o objetivo fundamental, a sobrevivência da própria espécie.
Mas estamos indo nessa direção? Calcula-se que o tempo médio de vida de uma espécie é de cerca de cinco milhões de anos. O Homo sapiens existe há apenas 300.000 anos; portanto, para alcançar o objetivo, ele deve durar mais 4,7 milhões de anos (se desaparecer antes, terá provado que é uma espécie estúpida) e, para fazer isso, deve usar seu cérebro da melhor forma possível, ao contrário do que fez e está fazendo.