A Pontifícia Academia das Ciências organiza congresso sobre o aquecimento global e sobre as possíveis soluções capazes de conter seus efeitos negativos para o ser humano e o ambiente. Clara Latini, da UN Sustainable Development Solutions Network – Youth, afirma que “é preciso focar em como enfrentar a crise climática agora”.
A reportagem é de Amedeo Lomonaco, publicada em Vatican News, 13-07-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Compreender os desafios científicos e sociais das mudanças climáticas e desenvolver soluções para tornar as pessoas e os ecossistemas resilientes. A adaptação aos atuais eventos meteorológicos extremos deve ser considerada um aspecto central nas ações da política em âmbito climático, particularmente para garantir o bem-estar das populações vulneráveis, quase três bilhões de pessoas no mundo.
Essas são algumas das diretrizes em torno das quais se articula o congresso organizado pela Pontifícia Academia das Ciências, realizado no Vaticano nos dias 13 e 14 de julho e centrado no tema “Resiliência de pessoas e ecossistemas em condições de estresse climático”.
As mudanças climáticas são uma das ameaças mais graves para a humanidade, com efeitos potencialmente devastadores sobre as pessoas, o ambiente e a economia. A resiliência é uma das alavancas fundamentais para enfrentar os desafios relacionados ao clima.
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) define a resiliência como a capacidade de um sistema social ou ecológico de absorver as alterações, mantendo a mesma estrutura de base e os mesmos modos de funcionamento. A resiliência é também a capacidade de adaptação ao estresse e à mudança.
Resiliência, crise climática, biodiversidade e equidade são as frentes sobre as quais professores, pesquisadores, formadores de políticas e lideranças religiosas debatem durante o evento organizado no Vaticano. O programa do congresso se desdobra em dois dias.
O evento abriu no dia 13 de julho com as intervenções do presidente da Pontifícia Academia das Ciências, Joachim von Braun, e do cardeal Peter Turkson, chanceler da mesma academia.
O triplo desafio da biodiversidade, do clima e da desigualdade se liga, depois, à reflexão da professora Jane Lubchenco, do Departamento de Biologia Integrativa da Oregon State University, nos Estados Unidos.
Susan Solomon, professora de Química da Atmosfera, concentra-se no tema da mitigação, nas escolhas práticas para evitar ou limitar os impactos negativos sobre o ambiente e as pessoas.
Outro foco, aos cuidados do professor de Física Teórica na Alemanha Hans Joachim Schellnhuber, diz respeito aos limites da resiliência regional e global.
As opções econômicas para a transformação e a resiliência são o foco da palestra do professor Stefano Zamagni, docente de Economia na Universidade de Bolonha.
A reflexão do professor Mohan Munasinghe, fundador do Munasinghe Institute for Development, no Sri Lanka, está dedicada à harmonia entre economia, ambiente e sociedade.
Ainda no dia 13 de julho, Dom Marcelo Sánchez Sorondo, ex-chanceler da Pontifícia Academia, aborda a questão da resiliência como desenvolvimento do potencial da natureza e da descoberta científica.
Joshtrom Kureethadam, professor da Pontifícia Universidade Salesiana, centra sua palestra nas dimensões éticas e morais da resiliência.
Gabriela May Lagunes, da UC Berkeley School of Information, enfoca o conceito de resiliência e as perspectivas para os jovens.
A ciência da adaptação para os países menos desenvolvidos é o pivô da reflexão de Joyce Kimutai (African Climate Development Initiative da Universidade da Cidade do Cabo).
Weijian Zhou (Academia Chinesa de Ciências) aborda a questão da gestão ecológica do ambiente na China.
A palestra de Robert Stoner, do Massachusetts Institute of Technology, nos Estados Unidos, se concentra em uma prioridade: acabar com a pobreza energética.
Virgilio Viana (Fundação Amazonas Sustentável, Brasil) convida a refletir sobre possíveis soluções para a resiliência às mudanças climáticas na Amazônia.
A última palestra do dia 13 de julho, de Robin Fears (Inter Academy Partnership), entrelaça questões climáticas e prioridades ligadas à promoção da saúde.
“Desde meados do século passado e superando muitas dificuldades, foi-se consolidando a tendência de conceber o planeta como pátria e a humanidade como povo que habita uma casa comum. Um mundo interdependente não significa unicamente compreender que as consequências danosas dos estilos de vida, produção e consumo afetam a todos, mas principalmente procurar que as soluções sejam propostas a partir de uma perspectiva global e não apenas para defesa dos interesses de alguns países. A interdependência obriga-nos a pensar num único mundo, num projeto comum” (da carta encíclica Laudato si’, do Papa Francisco, n. 164).
No dia 14 de julho, o congresso na Casina Pio IV continua com a palestra, focada em soluções baseadas na natureza, de Barbara Widera, da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Ciência e Tecnologia de Wrocław, na Polônia.
O tema dos sistemas alimentares resilientes acompanha, depois, a reflexão de Joachim von Braun e de Alisher Mirzabaev, da Universidade de Bonn, na Alemanha.
O acesso à água e a resiliência são o tema da palestra de Aditi Mukherji, do International Water Management Institute.
O âmbito agroflorestal é o pano de fundo da reflexão de Aster Gebrekirstos Afwork (World Agroforestry Center, no Quênia).
Cheikh Mbow (da Universidade de Pretória, África do Sul) se concentra nos centros de pesquisa e formação para a adaptação às mudanças climáticas.
Victor Galaz (da Universidade de Estocolmo, Suécia) dedica sua palestra ao tema das instituições econômicas e financeiras para um futuro em que prevaleça o valor da equidade.
A reflexão de Clara Latini (UN Sustainable Development Solutions Network – Youth) examina os desafios atuais e o tempo da pandemia.
Kira Vinke (German Council on Foreign Relations, Alemanha) aborda o tema da migração climática.
O último ato do congresso é a conferência de encerramento de Joachim von Braun, presidente da Pontifícia Academia das Ciências.
“Para enfrentar os problemas de fundo, que não se podem resolver com ações de países isolados, torna-se indispensável um consenso mundial que leve, por exemplo, a programar uma agricultura sustentável e diversificada, desenvolver formas de energia renováveis e pouco poluidoras, fomentar uma maior eficiência energética, promover uma gestão mais adequada dos recursos florestais e marinhos, garantir a todos o acesso à água potável” (da carta encíclica Laudato si’, do Papa Francisco, n. 164).
A Covid expôs criticidades e vulnerabilidades não apenas do tecido social, mas também dos ecossistemas, cada vez mais perturbados pelas mudanças climáticas. Clara Latini faz parte da UN Sustainable Development Solutions Network – Youth, uma rede global que mobiliza os jovens para dar origem a um mundo sustentável para as futuras gerações.
Ao Vatican News, ela destaca que o mundo da política, tanto em nível local quanto global, é chamado a dar respostas concretas capazes de prevenir e conter crises potencialmente devastadoras para o ser humano e para a nossa casa comum. “As alternativas existem, mas é uma corrida contra o tempo.”
Que novas lições econômicas sobre a resiliência podem ser aprendidas com uma experiência tão difícil quanto a da Covid e da pandemia?
Vimos, em primeiro lugar, como a Covid não se revelou uma crise apenas em nível sanitário. Também notamos efeitos no âmbito socioeconômico e vimos crescerem as taxas de desigualdade, principalmente nos países em desenvolvimento. Esses são outros problemas que, mesmo após a recente guerra na Ucrânia, vão determinar uma situação ainda mais frágil. O que se aconselha aos governos, neste caso, é se prepararem para eventuais crises de diversos tipos. E é preciso se focar em como enfrentar a crise climática agora.
O que a pandemia nos ensinou sobre a adaptação de pessoas e de ecossistemas aos efeitos produzidos pelas mudanças climáticas?
O que temos percebido com a pandemia é o chamado efeito cascata. Vimos como é importante avaliar a natureza e os nossos ecossistemas, principalmente no que diz respeito aos eventos de “efeito de transbordamento”, que afetam a biodiversidade. Esses eventos serão cada vez mais frequentes no futuro. Teremos problemas ligados a outros “efeitos de transbordamento”, a outras epidemias e, provavelmente, teremos que enfrentar crises relacionadas à agricultura e à seca. Portanto, é importante ver como é possível enfrentar esses problemas. E é importante ter alternativas sustentáveis no âmbito da energia. Acredito que focar em como é possível obter energia sustentável nas próximas décadas é uma das questões mais importantes a serem abordadas.
Voltemos o olhar para as próximas décadas: apesar das sombras, existem luzes e margens para conter essas consequências tão nefastas?
Existem possibilidades e alternativas. Mas é uma corrida contra o tempo. A temperatura já subiu um grau. Devemos evitar absolutamente que haja um novo aumento. Se houver um aumento de um grau e meio ou mesmo de dois graus, será demais para os nossos sistemas. Acredito que, acima de tudo, é um problema de força de vontade em nível político. Neste ano foi realizada a Conferência de Estocolmo. Depois de várias discussões em Bonn em junho, será decisivo aquilo que será discutido na próxima cúpula do G20 e, sobretudo, por ocasião da COP27 a ser realizada no Egito. Vimos as diretrizes da presidência da COP. Esperamos poder ver mais esforço e objetivos mais ambiciosos a serem alcançados. É importante que a sociedade civil se certifique de que aqueles que podem tomar decisões, em nível local e internacional, estejam cientes de como a questão climática é crucial.