27 Junho 2022
Há várias semanas, o jesuíta Javier Ávila, diretor da Comissão de Solidariedade e Defesa dos Direitos Humanos (Cosydhac), dialoga com o governo do estado de Chihuahua, pedindo uma solução para o deslocamento de uma comunidade próxima a Creel, ocupada inteiramente por uma gangue criminosa. Hoje, ele diz ao La Jornada, "estou interrompendo esse diálogo, não adianta continuar conversando se os problemas não forem resolvidos".
A reportagem é de Blanche Petrich, publicada por La Jornada, 26-06-2022.
Nos últimos dias, em meio ao choque e à dor causados pelo assassinato de seus irmãos sacerdotes de Cerocahui Javier Campos e Joaquín Mora, ele recebeu um telefonema de uma mãe desesperada. Horas antes dos homens de José Noriel El Chueco chegarem à paróquia onde cometeram o triplo homicídio, passaram pela casa de outra família com quem tiveram problemas. Mataram Raúl Osvaldo Berrellesa (22 anos) na frente de sua esposa, sequestraram seu irmão e incendiaram a casa.
Mapa do estado de Chihuahua, com destaque ao município de Urique, onde foram assassinados os jesuítas Javier Campos Morales e Joaquín César Mora Salazar, em 20-06-2022 . Fonte: Inegi
“Hoje eu cortei qualquer diálogo com o governo do estado de Chihuahua, até que esses jovens não apareçam. A mãe deles clama por eles. Oito dias se passaram. Encontraram meus irmãos Javier Campos e Joaquín Mora em 72 horas e agradeço-lhes do fundo do coração. Mas para esses jovens, nada? Por que não saiu na imprensa? Por que não foi uma bomba internacional como o assassinato dos jesuítas? Querem mostrar a medalha do mérito de serem muito eficazes?
Nos sermões que proferiu nas missas de Chihuahua e Creel, no sábado e no domingo, Ávila apelou à responsabilidade dos governos federal e estadual. Mas depois de refletir, comenta a este jornal: “Percebi algo que não disse na missa em Chihuahua. Trata-se da responsabilidade, ou irresponsabilidade do governo estadual. É como uma batata quente, todo mundo joga, vira para o outro lado e ninguém acaba assumindo o que tem que fazer".
Ele especifica: “Este governo não pode continuar alegando que não estava procurando por eles antes. Onde está o processo de busca séria que lhes corresponde? Exigimos respostas. Quanta apatia e indiferença”.
Pouco antes desta conversa telefônica, em frente à paróquia de Creel, o padre Ávila, conhecido por Pato, despediu o cortejo fúnebre com incenso, água benta e as voltas cerimoniais habituais naquele universo. Foi assim que saíram os dois caixões dos dois padres – Javier Gallo Campos, 79 anos, Joaquín Mora, Morita, 81 – que empreenderam o caminho sinuoso entre vales, montanhas e ravinas até Cerocahui.
A nutea, um ritual de despedida, era celebrada no templo Creel. Um casal de idosos Rarámuri, Jesús Manuel Chu Nel Palma e sua esposa, fizeram as últimas recomendações às almas para que não fossem embora tristes, para confiá-las a Onoruame (deus), encorajaram-nas a ir com alegria, para que nada distraia, que não tenham medo no caminho e que não tropecem em nenhuma pedra. “É muito raro os Rarámuri chorarem. Mas lá todos nós choramos.
No caminho do alto da Serra, ao cruzar por San Rafael, município de Urique, o cortejo teve que parar. A população, os chabochis vestidos de branco, os rarámuri com sua vestimenta tradicional, foi ao encontro do cortejo fúnebre. Grupos de mulheres dançaram para benzer os defuntos. Na serra Tarahumara, rezar é dançar. Dança-se para sustentar o mundo.
Em Cerocahui haverá mais danças. A noite toda. E amanhã, informa Pato Ávila, seguirá a festa, porque é uma festa. Isto até o momento em que serão sepultados no átrio da igreja de Cerocahui, conforme as permissões concedidas pelo Provincial da Companhia de Jesus do México. “Queríamos a cremação, para que pudessem levar as cinzas para as comunidades. Mas não é possível. Porque há uma investigação penal em curso”.
Sobre sua decisão de romper as conversações com as autoridades estatais, Ávila explica: “Estive tratando de um conflito muito sério com as autoridades e não tive nenhuma resposta”.
Trata-se de uma comunidade próxima de Creel (não precisa o lugar por questões de segurança) onde a população foi deslocada. “No governo me dizem: mandaremos um operativo. Os operativos não bastam, não servem. É como soprar as moscas para espantá-los de um pastel. Dão meia volta e as moscas voltam. Quando o operativo se retira os delinquentes regressam e ocupam o espaço. As autoridades me informam dizendo que já está tudo tranquilo. E não é verdade”.
“Os da cidade falam comigo e me dizem: padre, preciso voltar para minha casa, está aberta, cheira mal, está cheia de cachorros. O governo do estado responde: vão fechar suas casas. Que absurdo. Se eles voltam, são mortos, que maneira estúpida de buscar a paz para o povo. Propus que as operações sejam acompanhadas pela sociedade civil, que uma comissão das organizações vá certificar como as operações são realizadas e dar confiança às pessoas. Eles não aceitam. Assim, nenhum diálogo faz sentido ou é útil. Isso é o que eu quero dizer. Não quero mais ficar calado."
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México. Jesuítas rompem o diálogo com governo de Chihuahua - Instituto Humanitas Unisinos - IHU