18 Janeiro 2022
É impossível detê-los. É irresistível a atração exercida pela teologia da prosperidade que eles pregam em todas as partes do mundo e que defende que a graça de Deus se reflete na riqueza material. Tanto que, em breve, na América Latina, o continente no qual o catolicismo não teve concorrentes durante séculos, eles se tornarão os primeiros em número de seguidores. São os pentecostais: nascidos nos Estados Unidos, eles têm hoje 600 milhões de adeptos em todo o mundo, mas as projeções apontam que chegarão a um bilhão em 2050.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada por La Repubblica, 16-01-2022. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
São números que impressionam, assim como impressiona o fato de se deparar no centro de São Paulo, no Brasil, com homens de terno e gravata que fazem fila na frente de um altar para receber ofertas com bolsas de veludo vermelho e maquininhas para cartão de crédito, enquanto o pastor promete que todos ficarão ricos se doarem generosamente. São cenas cotidianas em um local de culto que custou 300 milhões de dólares, uma réplica extraluxuosa do antigo Templo de Salomão.
“São lugares onde você não é uma má pessoa se quiser sonhar alto, se quiser ganhar mais”, explicou ao Wall Street Journal Josué Valandro Jr., pastor da Igreja Atitude do Rio de Janeiro, congregação evangélica batista cujos membros incluem a primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
De acordo com as estimativas citadas pelo jornal estadunidense, por culpa do avanço dos pentecostais, e também devido ao aumento dos não crentes, em breve a América Latina não será mais católica. Mas o mesmo fenômeno também está ocorrendo em outros continentes.
Na África, por exemplo, onde entre os anos 1970 e o início dos anos 2000 o número dos fiéis protestantes dobrou: hoje, eles representam 30% da população total e superaram os católicos, parados em 21%. Ou, na Ásia, onde em 1970 havia 17 milhões de pentecostais, enquanto hoje são cerca de 200 milhões. Em Singapura, na Coreia do Sul e nas Filipinas já existem megaigrejas com dezenas de milhares de membros.
A ascensão dos últimos anos se deve a vários motivos. Nos meses da pandemia, um papel foi desempenhado pela capacidade dos pentecostais de utilizarem as mídias sociais de forma eficaz, junto com uma certa incapacidade da Igreja Católica de satisfazer as demandas religiosas e sociais das camadas mais pobres da população.
Depois dos anos 1960 e 1970, nos quais, com a teologia da libertação, “a Igreja Católica optou pelos pobres – diz uma piada já famosa –, os pobres optaram pelos pentecostais”. Na América Latina, o país no qual os pentecostais crescem mais rapidamente é o Brasil. Tanto que, dentro de um ano, eles poderão ultrapassar os católicos.
As conversões deram impulsos a opiniões socialmente conservadoras, das favelas aos salões do Congresso, ajudando a impulsionar Jair Bolsonaro ao poder. Embora ele se identifique como católico, o presidente foi batizado em 2016 por um pastor pentecostal no rio Jordão em vista da sua campanha eleitoral.
Rodrigo Coppe Caldeira, teólogo especialista em fenômenos religiosos e professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, diz: “A chave desse sucesso é constituída pelas periferias. Aqui, a chamada ‘teologia da prosperidade’, dirigida sobretudo ao indivíduo, seduz quem vive nas margens das metrópoles”.
O Papa Francisco conhece de perto a realidade pentecostal. Ele nunca se preocupou com a necessidade de se defender deles. Pelo contrário, sempre buscou a amizade e o diálogo. Não por acaso, um de seus primeiros gestos, uma vez eleito ao sólio de Pedro, foi o encontro privado de oração com um pastor pentecostal, convidado a Santa Marta no dia 26 de junho de 2013. Isso nunca havia acontecido.
Pouco mais de um ano depois, no dia 27 de julho, Bergoglio cruzou o limiar da Igreja Cristã Evangélica da Reconciliação de Caserta para se encontrar com a comunidade pentecostal liderada pelo pastor Giovanni Traettino. A visita de um papa a uma igreja pentecostal também nunca havia ocorrido.
A hipótese de o catolicismo se tornar uma minoria não assusta o bispo de Roma. “A Igreja - disse ao Wall Street Journal Pedro Morandé Court, sociólogo chileno que está na Pontifícia Academia de Ciências Sociais do Vaticano – certamente não pode esperar voltar na história, muito menos impor uma espécie de hegemonia centralizada”.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Boom pentecostal: assim a Igreja Católica perde a América Latina - Instituto Humanitas Unisinos - IHU