"A cegueira é um dos motivos fortes na cristologia de Marcos. Em Mc 3,6 os fariseus e herodianos, em sua cegueira, pensam em eliminar Jesus. Esta cegueira também se faz sentir em seus conterrâneos que, estupefatos, se mostram atônitos diante de seu antigo colega (Mc 6,1-6). A mesma cegueira também se verifica nos discípulos que ainda não abriram os olhos (Mc 8,14-21) e recebem esta repreensão: "Vós tendes olhos: não vedes? Tendes ouvidos: não ouvis?" (Mc 8,18)."
O subsídio é elaborado pelo grupo de biblistas da Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana – ESTEF:
- Dr. Bruno Glaab
- Me. Carlos Rodrigo Dutra
- Dr. Humberto Maiztegui
- Me. Rita de Cácia Ló
Edição: Prof. Dr. Vanildo Luiz Zugno
Primeira Leitura: Jr 31,7-9
Salmo: 125, 1-2ab.2cd-3.4-5.6
Segunda Leitura: Hb 5,1-6
Evangelho: Mc 10,46-52
Marcos tem dois relatos de cura de cego: Betsaida (8,22-26) e Jericó (10,46-52). Esses relatos estão dispostos de tal maneira que, por si só, já transmitem uma cristologia própria. Quanto ao relato do cego de Betsaida (8,22-26), é importante situá-lo como conclusão da unidade anterior (6,6b-8,26) e início da subida para Jerusalém, onde Jesus enfrentará a prisão e a cruz. Esta caminhada exige abrir os olhos. Assim, Marcos dispôs seus dois relatos de cura de cegos para emoldurar a cegueira dos discípulos que não compreendem o messianismo de Jesus.
A cegueira é um dos motivos fortes na cristologia de Marcos. Em Mc 3,6 os fariseus e herodianos, em sua cegueira, pensam em eliminar Jesus. Esta cegueira também se faz sentir em seus conterrâneos que, estupefatos, se mostram atônitos diante de seu antigo colega (Mc 6,1-6). A mesma cegueira também se verifica nos discípulos que ainda não abriram os olhos (Mc 8,14-21) e recebem esta repreensão: "Vós tendes olhos: não vedes? Tendes ouvidos: não ouvis?" (Mc 8,18).
Agora que o caminho ruma para Jerusalém, onde se dá o desfecho, é preciso abrir os olhos dos seguidores para a dura realidade. Marcos coloca os dois relatos de cura de cego como moldura para ilustrar a cegueira daqueles que terão de aprender da cruz o verdadeiro messianismo de Jesus.
A primeira moldura é o cego de Betsaida (Mc 8,22-26). Tudo o que vem a seguir tem a ver com cegueira e iluminação. Jesus pergunta: quem dizem que eu sou (Mc 8,27-30). Pedro professa: “Tu és o Cristo”. Doutrina correta, mas compreensão errada (cegueira). Jesus vai corrigir esta cegueira por três vezes anunciando sua paixão (Mc 8,31; 9,30s; 10,32ss). Três vezes os discípulos se mostram cegos. A primeira vez Pedro quer impedir a cruz (Mc 8,32). A segunda vez são os discípulos que discutem quem será o maior (Mc 9,33s). A terceira manifestação de cegueira se dá no pedido dos filhos de Zebedeu, que ambicionam os primeiros lugares (Mc 10,35ss). Três vezes Jesus terá de corrigir a cegueira de seus seguidores. A primeira iluminação se dá contra a cegueira de Pedro (Mc 8,32ss). A segunda iluminação se aplica à ambição dos discípulos (Mc 9,35ss) e a terceira iluminação se faz sobre o pedido de Tiago e João (Mc 10,42-45).
Pedro, os discípulos, bem como os Zebedeus, olhando para Jesus, imaginavam algo muito diferente daquilo que ele realizaria. Como poderiam eles aceitar o aparente fracasso na cruz? Marcos, com habilidade, corrige essa cristologia triunfalista, mostrando que ambicionar um messianismo nacionalista é uma cegueira.
Por isso mesmo, coloca uma segunda e última moldura: o relato do cego de Jericó (Mc 10,46-52). Esse cego, ao chamar Jesus de “Filho de Davi”, demonstra cegueira, pois nesse conceito estava embutido um messianismo nacionalista não compatível com o Reino. Porém, sua fé o tirou de sua compreensão errada e o tornou apto a seguir Jesus no caminho, que, a partir de Mc 11, chega a Jerusalém, onde se dá o desfecho da paixão, morte e ressurreição. Este cego é o protótipo dos discípulos que, ao aderirem a Cristo, tinham uma perspectiva nacionalista, mas foram corrigindo esta cegueira aos poucos. Fenômeno comum nos tempos de Marcos.
Aproximando-se, com fé da pessoa de Jesus, os homens e mulheres de todos os tempos precisam aprender o verdadeiro sentido do messianismo de Jesus, que vai além de ambições nacionalistas, pessoais, milagreiras, para abraçar com ele o projeto da cruz que compromete os discípulos a instaurar o Reino no mundo.
A liturgia propõe um caminho de iluminação. Os israelitas, retornando do cativeiro (1ª leitura), serão iluminados rumo à liberdade: cegos, aleijados, parturientes, todos terão seu lugar. Os cristãos verão Jesus como Sumo Sacerdote superior ao antigo (2ª leitura). Ele é quem faz a caminhada com o povo.