06 Agosto 2021
Um conjunto de tecnologias promete revolucionar, em futuro próximo, as possibilidades de diagnóstico e tratamento do câncer, a segunda doença que mais mata no Brasil. Vacinas terapêuticas personalizadas para ativar a resposta imunológica do paciente contra as células cancerígenas, ou biópsia líquida, capaz de detectar precocemente tumores por simples coleta de sangue , ou ainda terapias com anticorpos, para bloquear o crescimento e disseminação de células malignas, constituem possibilidades promissoras. Edição genômica, terapia celular, vírus oncolíticos, imagem molecular, terapias com RNA e tumor delivery são outras possibilidades de abordagem que emergem e sugerem uma transformação no panorama do cuidado à doença no futuro.
A reportagem é publicada por CEE-Fiocruz, 03-08-2021.
Contudo, a incorporação das tecnologias emergentes é ainda incerta, pelo seu alto custo e tempo de desenvolvimento e produção, com risco de se concentrar em grupos específicos de pacientes, pelas desigualdades regionais do país (dois terços das unidades de saúde mais qualificadas encontram-se nas regiões Sul e Sudeste) e pelas dificuldades dos sistemas de saúde em absorver essas tecnologias, tendo em vista nem sempre estarem, ainda, estruturados para oferecer os recursos já disponíveis.
O cenário, ao mesmo tempo promissor e cheio de desafios, torna-se ainda mais complexo com a pandemia de Covid-19, que veio retardando a procura dos pacientes pelos serviços de saúde, o que dificulta a prevenção e posterga necessários tratamentos, com risco de sobrecarregar o sistema.
Essas e outras questões estarão em pauta no webinário Atenção à Saúde, Inovação Tecnológica e Câncer: Impactos e Desafios da Era Covid-19, que será realizado pelo Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz (CEE-Fiocruz), no dia 20 de agosto de 2021, das 14h às 16h. O evento contará na mesa de abertura com a presença da presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, do diretor do CEE-Fiocruz, Carlos Gadelha, e do ex-ministro da Saúde e pesquisador do Centro, José Gomes Temporão.
Na programação, os palestrantes Luiz Antonio Santini, ex-diretor do Instituto Nacional do Câncer (Inca) e também pesquisador do CEE, e Nina Melo, coordenadora de pesquisa da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale) e do Observatório de Oncologia do Movimento Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC), apresentarão, respectivamente, os temas: Futuro das tecnologias de diagnóstico e tratamento do câncer – acesso em um cenário de desigualdades e Câncer e Covid-19 – panorama atual do diagnóstico e tratamento do câncer no Brasil sob o impacto da pandemia.
Participam ainda do evento, como debatedores, Carlos Gil Ferreira, presidente do Instituto Oncoclínicas; Jorge Alberto B. Iriart, pesquisador e professor associado do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Martín Bonamino, pesquisador Inca e da rede Fio-Câncer/Fiocruz.
“O webinário busca, a partir da abordagem do câncer como problema de saúde pública, sustentar uma proposta ampla do CEE, voltada à investigação do futuro do sistema de saúde no país, de modo a orientar a construção de políticas de saúde justas e sustentáveis, conforme a missão do Centro”, destaca Temporão, que coordenou com Santini no CEE a pesquisa Futuro das Tecnologias de Diagnóstico e Tratamento do Câncer (FTDTC) (2019- 2049), a ser abordada no evento. “O câncer é, hoje, a principal causa de morte em mais de 600 cidades brasileiras, e a Organização Mundial da Saúde (OMS) projeta o mesmo cenário para as próximas décadas, em termos globais”, observa o ex-ministro.
Santini abre as exposições, trazendo questões levantadas a partir dos resultados de quatro pesquisas realizadas no CEE, que buscaram identificar as percepções de pesquisadores internacionais, de médicos (do SUS e da saúde suplementar) no Brasil e da sociedade (pacientes, cuidadores, entre outros), a respeito da aplicação, no futuro, das tecnologias emergentes, no diagnóstico e tratamento do câncer.
“Definimos uma patologia, o câncer, para estudar a questão do acesso, seja a recursos de atenção atuais, seja a inovações”, explica Santini, reforçando que, se as tecnologias emergentes se mostram capazes de gerar benefícios aos pacientes com câncer, não há, ainda, garantias de que serão compartilhadas de forma equânime e sustentável e se atenderão ao conjunto da sociedade. “A quem as inovações beneficiarão?”, indaga. “A partir das quatro pesquisas, estamos identificando um campo de investigação, no que se refere ao acesso”.
Santini ressalta que, além da discussão sobre a possibilidade ou não de incorporação de novas tecnologias, há necessidade de reflexão sobre fatores sociais, bioéticos e clínicos para a definição de estratégias que garantam o cuidado sustentável do câncer.
Em seguida, com base em uma pesquisa realizada com o apoio do TJCC ao longo do ano de 2020, Nina Melo traçará um panorama do diagnóstico e tratamento do câncer no Brasil sob o impacto da pandemia de Covid-19. A pesquisa, realizada com oncologistas das cinco regiões do Brasil, teve como objetivo avaliar as diferenças na assistência ao câncer em cada uma dessas regiões, a partir da visão de quem se ocupa em sua rotina do cuidado ao paciente.
“Foi constatado que, nesse período, a demanda por diagnósticos diminuiu muito. Isso significa que, em curto espaço de tempo, teremos diagnósticos de estágios muito mais avançados de câncer no Brasil e as pessoas vão encontrar uma rede de atendimento sobrecarregada”, explica Nina. Segundo a pesquisadora, dados da Sociedade Brasileira de Patologia mostram que no ano de 2020, pelo menos 50 mil novos casos de câncer deixaram de ser diagnosticados, quando o número de novos casos é comparado com o de 2019.
Entre 2019 e 2020, o CEE desenvolveu, sob a coordenação de Temporão e Santini, a pesquisa Futuro das Tecnologias de Diagnóstico e Tratamento do Câncer (FTDTC) (2019- 2049), que buscou levantar a percepção dos médicos brasileiros que atuam nas áreas de clínica, cirurgia, radioterapia e diagnósticos, tanto no SUS como no setor privado, sobre as tecnologias do futuro voltadas ao câncer, em sua perspectiva de aplicação ou não na atenção à doença nos próximos trinta ano. O trabalho contou com a parceria de dez entidades relacionadas à Oncologia.
“As possibilidades terapêuticas são consideradas promissoras, porém ainda num cenário de incertezas quanto a confiabilidade, efeitos colaterais, melhoria de prognóstico e qualidade de vida e, sobretudo, de custo-efetividade”, analisa Santini.
A identificação das tecnologias emergentes que seriam analisadas na pesquisa deu-se em estudo anterior, também do CEE-Fiocruz – Futuro Esperado da Atenção ao Câncer (2017-2047). Com base em uma websurvey de abrangência mundial, essa primeira pesquisa buscou gerar informação qualificada sobre tecnologias que poderiam ser relevantes para a atenção ao câncer no intervalo de trinta anos (compreendido entre 2017 e 2047).
A terceira pesquisa, intitulada Percepção dos usuários sobre o futuro das tecnologias de diagnóstico e tratamento do câncer (PUFTDTC 2020/2049), foi desenvolvida como resultado da parceria firmada entre o CEE-Fiocruz e a Abrale, líder do Movimento TJCC. O estudo foi realizado com participantes do VII Congresso Digital – TJCC 2020, organizado pela equipe do movimento e que reúne pacientes, cuidadores e profissionais de saúde, sobre aspectos relacionados ao acesso da população às tecnologias existentes, assim como sobre as possibilidades de incorporação das tecnologias emergentes.
Como essa pesquisa foi realizada no ano que eclodiu a pandemia de Covid-19, foram incluídas no questionário questões relativas aos impactos no acesso dos usuários aos serviços de saúde em geral, e especificamente, ao diagnóstico e tratamento do câncer nesse período.
Uma quarta pesquisa do CEE, em parceria com a Unidade de Estudos Setoriais da Faculdade de Economia da Universidade Federal da Bahia, realizada em 2020, também de abrangência mundial, buscou atualizar a expectativa dos especialistas em câncer sobre o futuro do diagnóstico e tratamento do câncer e as expectativas para os próximos vinte anos (2020-2040).
Os resultados encontrados entre os estudos com pesquisadores e médicos foram similares. Foi possível perceber, por exemplo, tanto entre os médicos brasileiros quanto entre os especialistas internacionais, grande expectativa de que a atenção oncológica passe por uma revolução tecnológica, mesmo antes de transcorridos os próximos trinta anos, bem como o entendimento de que não se contará com um tratamento monoterapêutico na atenção ao câncer, esta última percepção ainda mais acentuada entre os especialistas (60%).
Em relação aos resultados encontrados no estudo com a sociedade em geral (participantes do TJCC), cabe destacar a relevância atribuída pelos respondentes ao que se chama de tecnologias leves, isto é, humanização do cuidado pré e pós-tratamento, atenção paliativa, melhoria das políticas sociais e previdenciárias e práticas integrativas complementares. “Observa-se claramente nas respostas, a importância que as tecnologias leves têm para a sociedade. Os pacientes querem ser ouvidos”, diz Santini.
Os estudos de prospecção (foresight) são reconhecidos como ferramentas importantes para o planejamento das políticas de incorporação de tecnologias em saúde e também para orientar políticas de fomento à inovação e desenvolvimento tecnológico. Os estudos realizados foram orientados de modo a fornecer informações para instruir formuladores e gestores de políticas públicas na promoção, desenvolvimento e incorporação de tecnologias para a atenção ao câncer no futuro.
Atenção à Saúde, Inovação Tecnológica e Câncer: Impactos e Desafios da Era Covid-19
Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz
Dia: 20 de agosto de 2021
Hora: 14h às 16h
Transmissão: Youtube - Video Saúde Distribuidora
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Fiocruz promove webinário sobre o futuro da atenção ao câncer e o impacto da Covid-19 no rastreamento de novos casos e tratamento - Instituto Humanitas Unisinos - IHU