11 Mai 2021
"Nas últimas décadas, tornou-se prática obrigatória no Brasil combater a criminalidade utilizando-se o enfrentamento policial em detrimento de muitas outras medidas racionais", escreve José Ricardo Bandeira, perito em Criminalística e Psicanálise Forense, comentarista e especialista em Segurança Pública, em artigo publicado por EcoDebate, 10-05-2021.
Não existe caminho para o combate à violência e a criminalidade que não passe pelo investimento maciço em treinamento dos policiais e em ferramentas/métodos de inteligência e investigação, com o objetivo de impedir que drogas, armas e munições cheguem às comunidades dominadas pelo crime organizado!
A cada dia que passa, os cidadãos das grandes cidades e capitais brasileiras são obrigados a conviver com a explosão de violência e criminalidade que assola o Brasil. Balas perdidas, arrastões, roubos e homicídios já não são surpresas em um país que é recordista em mortes violentas decorrentes de operações policiais.
E nesta esteira de violência muitos políticos são eleitos, a exemplo das últimas eleições, explorando a bandeira de combate a violência, com um discurso muitas vezes demagógico e sem profundidade, mas falando coisas que o cidadão cansado e acuado espera ouvir. Esses políticos, assim como os anteriores, repetem as mesmas práticas de combate a criminalidade que por evidentes razões não surtiram efeito.
Nas últimas décadas, tornou-se prática obrigatória no Brasil combater a criminalidade utilizando-se o enfrentamento policial em detrimento de muitas outras medidas racionais e científicas que poderiam trazer resultados sólidos, pois a polícia é somente uma das ferramentas no combate a criminalidade em uma caixa chamada “segurança pública”, onde existem diversas outras ferramentas que podem ser utilizadas.
Somente para ilustrar como os nossos governantes priorizam o enfrentamento policial, a primeira grande operação policial no Brasil ocorreu no dia 21 de março de 1963 na comunidade da favela hoje conhecida como morro da Providência. Neste dia, cerca de 500 policiais, com o apoio de um helicóptero, cercaram a comunidade e fizeram cerca de 200 presos. A partir desta operação, essa foi a política de segurança que continuou sendo implementada por todos os governadores do Brasil, chegando-se ao caos que hoje, culminando com o Massacre do Jacarezinho, comunidade do Rio de Janeiro dominada pelo crime organizado, onde em uma única operação policial 29 pessoas foram mortas, entre elas um policial civil.
Ao priorizar o enfrentamento policial, torna-se inevitável os efeitos colaterais que são, entre outros, a morte de policiais e vítimas inocentes, caos e transtornos nas grandes cidades, prejuízos para o comércio e turismo, além de graves sequelas psicológicas causadas naqueles que vivenciam a violência diariamente.
A segurança pública é uma ciência e como tal, deve ser tratada e conduzida de forma correta e, dentro desta ciência, a forma mais eficiente de se combater o crime nas grandes cidades é através do investimento em inteligência e investigação, impedindo que drogas, armas e munições cheguem as comunidades dominadas pelo tráfico de drogas e pelas organizações criminosas, asfixiando suas ações e cortando os seus recursos. Assim, o crime sem drogas, sem armas e sem munições naturalmente sucumbe. E neste critério o Governo Federal sempre foi o grande vilão da segurança pública, pois nunca impediu que as drogas, armas e munições atravessassem as nossas fronteiras, percorressem as estradas federais, portos e aeroportos e chegassem as comunidades.
Em paralelo a aplicação das medidas de inteligência, se faz necessário também um grande projeto de geração de emprego e renda em substituição ao dinheiro gerado pela narcoeconomia que circula nas comunidades.
Infelizmente, enquanto tais medidas não forem implementadas, continuaremos a velha política de enfrentamento, com a triste classificação de sermos um dos países mais violentos do mundo.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
O massacre do Jacarezinho e seus reflexos na sociedade. Artigo de José Ricardo Bandeira - Instituto Humanitas Unisinos - IHU