11 Mai 2021
"Racismo religioso contra negros e indígenas deve ser pauta cristã", adverte Luís Corrêa Lima, padre jesuíta, historiador e professor da PUC-Rio, em artigo publicado por DomTotal, 05-05-2021.
Uma triste realidade do Brasil foi mencionada na Campanha da Fraternidade Ecumênica deste ano: a perseguição a religiões de matriz africana, frequentemente denunciada como racismo religioso, bem como a perseguição a religiões indígenas. Conforme o Texto-Base da Campanha (aqui), a fé em Jesus Cristo nos ensina a trilhar caminhos de coexistência em sociedades divididas por muros de intolerância. Afirmar que Cristo é a nossa paz é repudiar o ódio, a discriminação, a violência e o racismo. Lamentavelmente, grupos missionários invadem territórios indígenas condenando a sua fé, considerando-a demoníaca. Tanto para negros quanto para indígenas, sua religiosidade tradicional significa resistência e é fonte de vida. Sempre que alguém, em nome da fé cristã, incentiva o ataque a estas tradições, está rompendo com o projeto de paz que representa a fé em Cristo.
Grupos neopentecostais realizam em seus templos formas aberrantes de exorcismo e cura. Uma delas é o "descarrego do encosto". Baseia-se em uma crença oriunda da mitologia indígena, em que se atribui à entidade encosto uma infinidade de males físicos e psíquicos, aos quais se oferece libertação em sessões de descarrego. Ou seja, fomentam crenças enraizadas na religiosidade popular, alheias ao cristianismo, e ardilosamente tiram vantagem através de um sincretismo perverso. Isto se dá também em certas sessões de exorcismo, onde supostos demônios que possuem as pessoas são chamados a se manifestar. E se identificam como Exus e Pomba Giras. Em seguida são publicamente humilhados e expulsos. Ou seja, utilizam-se entidades de religiões de matriz africanas para demonizá-las. Assim se dá o racismo religioso unido a um fanatismo que gera ódio e perseguição.
No Brasil, centenas de terreiros de umbanda e de candomblé já foram destruídos ou sofreram atentados. Milhares de fiéis foram ameaçados de morte ou tiveram que mudar de endereço, sobretudo em extensas áreas urbanas controladas por traficantes de droga autodenominados evangélicos. Ao tomarem posse de uma área, eles picham em diversos lugares a frase: "Jesus é o dono do lugar". A fé não os impede de serem bandidos, e o ódio destrói os limites da civilidade.
O alerta da Campanha da Fraternidade contra a intolerância religiosa vem da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs (Conic), entidade formada por católicos e evangélicos de várias Igrejas. Esta posição segue a linha do Concílio Vaticano II, que exorta a Igreja a nada rejeitar do que há de justo e de santo nas religiões não cristãs, pois refletem o raio da verdade que ilumina todos os seres humanos. Por isso os cristãos são incentivados a dar testemunho de sua fé, ao mesmo tempo que reconheçam e promovam os bens espirituais e morais, bem como os valores socioculturais que se encontram em outras religiões.
Lamentavelmente há grupos religiosos cristãos que fazem lembrar o ódio, a repressão e a guerra religiosa de séculos passados. A modernidade, a liberdade religiosa e a convivência com a diversidade lhes causam aversão. As vítimas da intolerância religiosa em nosso país são populações vulneráveis, atingidas por um tipo de racismo contra negros e indígenas, agravado pela ineficiência ou ausência do Estado de direito. Cristãos esclarecidos, aliados da civilização e da solidariedade, não devem se calar nem se omitir neste conflito.
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Intolerância religiosa - Instituto Humanitas Unisinos - IHU