06 Janeiro 2021
“Não sei o que teria sido se não tivesse recebido”, diz Tatiana Maria Canha, 46 anos, que de forma autônoma trabalhava com vendas antes da pandemia. Ela está no grupo de cerca de 67 milhões de brasileiros que não receberão o auxílio emergencial a partir deste mês de janeiro. O benefício que foi criado para minimizar os impactos econômicos da pandemia de covid-19 não foi prorrogado para 2021 pelo Governo de Jair Bolsonaro. “Tive que parar com meu trabalho, pois dependia de vender para sobreviver. Com este dinheiro ainda ajudei minha filha que não recebeu até agora”, afirma.
A reportagem é de Andressa Marques, publicada por Sul21, 04-01-2021.
O benefício começou a ser pago em abril de 2020. Foram cinco parcelas de R$ 600 e quatro de R$ 300, um total de aproximadamente R$ 300 bilhões que alcançaram mais de 67 milhões de brasileiros. O auxílio fomentou o consumo das famílias e teve um papel importante na recuperação econômica do país no terceiro trimestre, quando o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 7,7% em comparação com os três meses anteriores.
“A política de renda garante dignidade para as pessoas terem o mínimo social para subsistência. Isso é fundamental, ainda mais num país de tamanha desigualdade como é o Brasil”, analisa a diretora de Relações Institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica e Assistente Social, Paola Loureiro Carvalho. “A pandemia revelou aquilo que não queriam enxergar, a tamanha instabilidade do povo brasileiro. Nós alcançamos mais de 100 milhões de pessoas inscritas para receber o auxílio, isso mostra que quase metade da população brasileira tem renda inferior a meio salário mínimo e uma condição de trabalho precarizada e vulnerável”, destaca.
Mesmo que provisoriamente, o auxílio emergencial contribui para a diminuição da pobreza. Entre agosto de 2019 e agosto de 2020, a taxa de pobreza no conjunto das regiões metropolitanas caiu de 19,1% para 15,9%. Sem o benefício emergencial, ela teria subido para 28%, de acordo com uma pesquisa do Observatório das Metrópoles e do Observatório da Dívida Social na América Latina , da PUC-RS. “O auxílio não foi bom só para as famílias beneficiárias, foi bom para o comércio também, ele sustentou aberto muito do comércio que também seria fechado se não tivéssemos a renda emergencial. As famílias movimentaram a economia seja em forma de alimentação, pagamento das contas, da subsistência da moradia”, diz Paola. “Esse dinheiro volta para economia imediatamente. Em um pequeno comércio do interior, por exemplo, entrou o auxílio emergencial e o mercadinho está cheio, garantindo os 10 empregos que consegue manter. Então esse padeiro conseguiu manter via auxílio emergencial a movimentação da economia”, acrescenta.
Segundo dados do IBGE, o desemprego bateu recordes no ano de 2020 e já atinge mais de 14 milhões de brasileiros. De maio a novembro ocorreu um aumento no número de desempregados na ordem de 4 milhões. E o cenário de informalidade do mercado de trabalho brasileiro se agravou após a reforma trabalhista de 2017. “Nós não temos uma retomada dos empregos e nós não teremos porque não há investimento nenhum do ponto de vista do mundo do trabalho”, observa ainda Paola. “Poucos são os brasileiros e brasileiras que conseguem se manter com dignidade em uma situação de não conseguir trabalhar de dia para comer de noite”, completa.
Além da forte inflação, o fim da renda emergencial agrava o endividamento das famílias, pequenos comércios, dos municípios e do Estado. Além disso, deve ter como resultado a retomada do Brasil no Mapa da Fome. “Nós já tínhamos um quadro no Brasil de retomada do mapa da fome e da miséria e infelizmente quando se vê o fim do auxílio acontecer, a gente retoma essa mesma realidade”, assinala a diretora de Relações Institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica.
“Nós defendemos uma política de renda mais permanente. Propusemos para o Congresso Nacional, para o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia e para o governo tentar e pensar em uma política de renda que fosse factível e permanente” diz Paola. “Nós tivemos um auxílio emergencial que não teve periodicidade e nem segurança das famílias de mês em mês poder contar com esse recurso”.
Após o anúncio de não prorrogação do auxílio emergencial e a recusa em criar um novo um novo programa de distribuição de renda, o Renda Brasil, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que a ideia é “aumentar um pouquinho” o Bolsa Família. “A possibilidade de ampliação do Bolsa Família não chega nem perto da necessidade brasileira. Antes da pandemia nós já tínhamos uma fila de espera de 2 milhões de famílias para o Bolsa Família, se o governo agora colocar os dois milhões de famílias está desconsiderando pessoas que perderam o emprego em 2020”, afirma Paola.
Mesmo com a fala do presidente de que estamos hoje “no finalzinho da pandemia”, embora com o país voltando a registrar mais de 1.000 óbitos diários pela covid-19, estão tramitando no Congresso propostas para a prorrogação do auxílio emergencial. O projeto de lei 5.495, que tramita no Senado, prevê o pagamento das parcelas de R$ 300 até março de 2021 e projeto de lei 5.494 propõe a concessão do benefício, em parcelas de R$ 600, ao longo do primeiro semestre de 2021.
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Fim do Auxílio Emergencial trará pobreza, desemprego e retorno do Brasil ao Mapa da Fome - Instituto Humanitas Unisinos - IHU