31 Agosto 2020
A responsabilidade da mídia carioca
É preciso admitir que um dos problemas do Rio que mais o prejudicam reside, paradoxalmente, na própria mídia do Rio e nos seus intelectuais. Com medo de ser chamada de provinciana, a maioria esmagadora nunca deu um "ai" contra o desmantelamento da cidade promovido pelo governo federal e continuaram a tratar do Brasil como se o Rio continuasse a ser capital. A coluna de ontem do Merval é um exemplo dessa postura, bastante expressiva desse tipo de comportamento de muitos dos nossos formadores de opinião. Por isso a iniciativa do Pedro Doria hoje foi tão importante, porque ousou mexer nesse tabu.
O único lugar do Brasil em que a mídia local não se pode articular o interesse nacional do ponto de vista do interesse local é o Rio! Virou um interdito que não existe em lugar nenhum do Brasil, nem em São Paulo, nem mesmo em Brasília. Todo o resto do Brasil pode se defender, menos o Rio, que é logo chamado de "bairrista". É uma lógica cruel, porque bate exatamente onde dói o calo: no trauma da mudança da capital, tendo, porém, continuado a ser capital em tantos aspectos.
Exige-se da mídia e dos intelectuais do Rio que seja sempre "nacional", ao mesmo tempo em que não pode ser "bairrista", nem defender os próprios interesses. Com uma mão exigem que o Rio continue fazendo as vezes de "capital" nacional; por outro, querem que a cidade se vire sozinha, como se fosse um município como outro qualquer, negando-lhes os meios de que ele precisa para continuar a exercer o papel que dele esperam de representação do país!
Exige-se que tudo do Rio - desde a história, o Cristo e até o petróleo - seja nacional, desde que calado e conformado como capital formal de um Estado Frankenstein. Que outros caiam nessa armadilha, eu entendo; mas que a própria mídia e a intelectualidade carioca caia, é coisa que não posso compreender. O Rio foi feito para ser capital do Brasil, continua sendo capital em larga medida e não vai aprender a fazer outra coisa.
É justamente pela falta de coragem de defender o interesse local, pelo medo de posar de provinciano, que a mídia tem medo de abrir a velha ferida. Mas já se viu que essa postura só pode levar aonde tem levado, que é a insistência cega em apostar num experimento falido, que é este Estado do Rio criado em 1975 pelo regime militar. Insistem também numa reação inócua de apelar apenas à "sociedade civil", fazendo encontros de empresários e jornalistas para repetirem um mantra de união, que esquece que o Rio continua sendo politicamente uma cidade federal, presa numa camisa de força de capital de Estado.
O Rio é o rosto do Brasil; não é problema só dos cariocas. Já passou da hora de quebrar esse tabu e abrir com toda franqueza e lealdade uma grande discussão sobre o status nacional do Rio, sem a qual nunca sairemos desse vórtice infernal em que nos afundamos há décadas. A intelectualidade e a mídia carioca precisam se dar conta de que não podem pretender continuar a falar para o conjunto da nação, do ponto de vista da "capital", desconsiderando as bases materiais locais, digamos assim, que tornam possível o seu próprio discurso.
"Roberto Bertholdo, preso no esquema Witzel, foi um dos operadores da eleição de Rodrigo Maia.
De acordo com o jornalista Luis Nassif, Roberto Bertholdo, advogado recentemente detido pela Lava Jato do Rio, “foi um dos braços direitos do atual líder do Centrão, deputado Ricardo Barros, ex-Ministro da Saúde”. O advogado, afirma o jornalista, “se tornou o ‘facilitador’ de apoios ainda indecisos” à eleição de Rodrigo Maia para a presidência da casa”.
Era na sauna de sua mansão, no Lago Sul, que os deputados se encontravam com Maia e negociavam o apoio político no ambiente da sauna – sem chance para escutas ou grampos.
Um dos trunfos da família Bolsonaro contra Rodrigo Maia é Roberto Bertholdo, advogado curitibano recentemente detido pela Lava Jato do Rio de Janeiro, acusado de falcatruas na área de saúde. Ele se tornou um dos principais operadores do Centrão.
Bertholdo foi um dos braços direitos do atual líder do Centrão, deputado Ricardo Barros, ex-Ministro da Saúde no governo Bolsonaro. Foi nesse período que passou a ser mais conhecido em Brasilia, quando se tornou o “facilitador” de apoios ainda indecisos à eleição de Rodrigo Maia para a presidência da casa.
Era na sauna de sua mansão – sem chance para escutas ou grampos -, no Lago Sul, que os deputados se encontravam com Maia e negociavam o apoio político. Vinhos finos, lagostas e camarões, preparados pelo próprio anfitrião, completavam os encontros que, aliás, não ficavam restritos a parlamentares.
Com isso, Bertholdo tornou-se um dos principais operadores do Centrão.
As fotos mostram Bertholdo celebrando a eleição de Rodrigo Maia, entre deputados, no espaço restrito reservado aos parlamentares.
Esta semana, Bertholdo foi detido pela Lava Jato Rio por acusações de falcatruas na saúde do Rio de Janeiro."
Witzel não foi afastado do governo porque é um corrupto, embora muito provavelmente ele o seja. Witzel foi afastado do governo porque, depois de se eleger na onda bolsonarista, rompeu com o clã dos Bolsonaro, que é implacável com quem lhe atravessa o caminho.
Bolsonaro pode ser tosco, burro e limitado, mas ele entendeu que o gozo do brasileiro com a prisão poderia ser mobilizado para um projeto de extrema-direita, do qual, aliás, o próprio Witzel fazia parte. Fazia, porque pelo jeito ele não vai ter bala na agulha para se manter de pé atirando.
Todo o dossiê contra Witzel foi feito pela ABIN paralela de Bolsonaro. Os arapongas de Bolsonaro prepararam-no, foi tudo entregue ao PGR Aras e, em menos de duas semanas, aconteceu a primeira batida no gabinete de Witzel. Carla Zambelli falou em cinco outros dossiês. Há fontes que afirmam que haveria outros oito governadores na mira de Aras.
Enquanto isso, foi aprovado na Câmara (ainda falta o Senado) o TRF-6, o grande desejo de João Otávio de Noronha, que até ontem presidia o STJ. Sim, isso mesmo, o país que mais gasta com o Judiciário no planeta criou mais um tribunal regional federal para satisfazer um bajulador que, assim, libera a vaga no STF para outro puxa-saco.
Como as vaguinhas futuras no STF são poucas, Bolsonaro vai regendo o jogo dos louvaminheiros. Para completar, ele pode surfar em cima do gozo brasileiro com a prisão dizendo que agora, que Sergio Moro saiu, a PF funciona de verdade, pois está prendendo políticos.
Os processos que estavam em mãos de Jorge Mussi? Agora estão em mãos de Noronha, o lambe-esporas mor. Esses processos aí incluem o caso Queiroz, lembrem-se.
Por isso é uma tolice dizer que Bolsonaro “está acabando” com a Lava Jato, como às vezes dizem aqueles que até hoje acreditam que a Lava Jato foi uma espécie de grande mobilização dos bons contra a corrupção. Não, Bolsonaro não está “acabando” com a Lava Jato, ele está redirecionando-a para seus próprios objetivos, mobilizando os mesmos mecanismos que já eram parte dela em anos anteriores. Ele a redireciona contra aqueles que o ameaçam da mesma forma como o Partido dos Procuradores redirecionou-a contra Temer logo depois que Dilma caiu.
Agora é mais grave, claro, porque estamos sob um governo de extrema-direita e a democracia está em risco. Pelo menos na PGR e no STJ, já está tudo dominado.
Em 2012, o prefeito Márcio Lacerda furou buracos no centro de BH às vésperas da eleição, anunciando que seriam sondagens do metrô.
Mais de oito anos se passaram e nunca mais se ouviu falar do metrô de BH, nem por Lacerda nem por seu sucessor, Alexandre Kalil.
Em 2020, um senador aliado do prefeito vem anunciar recursos (que não estão confirmados) para o metrô também no período eleitoral.
Um item essencial para a vida de milhares de pessoas segue negligenciado e tratado com oportunismo por políticos que nunca pegaram transporte público.
Não custa atualizar os números e dar uma mãozinha para evitar que eles se naturalizem.
O mundo ultrapassou hoje 25 milhões de casos de Covid-19. Já são praticamente 850.000 mortos. Nos Estados Unidos, são mais de 6 milhões de casos e mais de 180.000 mortos. No Brasil, são mais de 3 milhões e 800 mil casos, com mais de 120.00 mortos, sem contar a provavelmente grande subnotificação.
Brasil e EUA têm 6,7% da população mundial, mas totalizam 36% dos mortos (crédito pela conta: jornalista Adriana Carranca).
Essas mortes não eram inevitáveis e não se explicam pela densidade demográfica. São o produto de políticas negacionistas dos chefes de Estado dos dois países, da irresponsabilidade criminosa com que conduziram a resposta à pandemia.
O fracasso de uma geração
O que estamos acompanhando é o fracasso de uma geração de evangélicos que foi durante anos alimentada pela "cultura gospel".
Sim, essa geração de "evangélicos" lotou os estádios em nome de "Jesus", mas não se comprometeu com os valores pregados pelo Nazareno; bebeu muita água da lagoa da Lagoinha com suas músicas melódicas e letras individualistas, mas desprovidas de espírito profético; levantou as mãos, fechou os olhos, considerou os arrepios como "presença do Espírito Santo de Deus", mas desconsiderou o ensino claro do NT de que o Espírito Santo aponta para Jesus, sendo o responsável por fazer com que os discípulos caminhem na pegadas do Cristo.
Sim, essa geração que criou a "moda gospel" e lançou "fragrância de Jesus" para vender como perfume, é a mesma geração que aprendeu a odiar os marginais com o seu slogan maldito "bandido bom é bandido morto" e achar que os desfavoráveis da sociedade estão onde estão por falta de competência mesmo.
Sim, foi essa geração que criou a tal "machonaria" julgando que a igreja não estava dando o devido valor aos machos, produzindo um discurso fundamentalista e machista para colocar a mulher, dizem, no seu devido lugar, são os mesmos que desconsideraram as inúmeras passagens em que Jesus de Nazaré rompeu barreiras culturais para valorizar as mulheres.
Sim, foi essa geração que, pela primeira vez, fez arminha com as mãos dentro de seus templos para apoiar um candidato e passou a idolatrar a violência como único caminho possível para resolver os problemas do país, é a mesma que não leu a Bíblia e principalmente os profetas e por isso a ausência de uma postura crítica política e socialmente.
O fracasso de uma geração de evangélicos está vendo a conta chegar. Ainda não fechou essa conta e quando fechar saberemos o real preço que foi pago.
Completando a série dos grandes homens de igreja que nos deixaram no mês de agosto (Pedro Casaldáliga; Hélder Câmara; Luciano Mendes; José Maria Pires), recordamos Carlo Maria Martini, cuja páscoa definitiva completa 8 anos neste 31 de agosto.
Nascido em Turim/Itália (15/02/1927), faleceu em Gallarate/Itália (31/08/2012). Jesuíta, foi arcebispo de Milão durante 23 anos. Como dizem muitos italianos, Martini foi o papa que não tivemos. Reconhecia publicamente o quanto a Igreja tinha parado no tempo, “atrasada 200 anos, pelo menos”, como ele mesmo disse em sua última entrevista, poucos dias antes da páscoa definitiva. Ele sonhava com uma Igreja próxima dos pobres, dos jovens, livre do poder, atenta às mulheres e, sobretudo, fiel à Palavra.
De jesuíta para jesuíta, não é difícil encontrar pontos de encontro entre o ministério de Francisco e o que Martini sonhou; por isso, alguns o consideram o “precursor de Francisco”.
Martini foi um dos maiores homens da Igreja dos séculos XX e XXI. Como bom jesuíta, soube conciliar a vida pastoral com a intelectual. Foi o maior exegeta católico do século XX. Autor de numerosos livros, nos quais apresenta uma visão de igreja aberta, dialogal e confiante na força da Palavra.
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"Carlo Maria Martini marcou uma época na história da Igreja. Foi um profeta do nosso tempo. A vontade de alcançar a todos foi o fio condutor da sua missão, o diálogo a palavra-chave do seu ministério: com os terroristas; com as outras confissões cristãs; com todas as religiões; com o pensamento laico; com o ser humano contemporâneo e as suas inquietações; com uma ciência em grau até de redesenhar os confins da vida e da morte."
(Marco Garzonio, no livro O PROFETA, uma das melhores biografias de Martini)
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Viva Martini! Obrigado Deus, porque nunca ter deixado a Igreja sem profecia.
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