11 Junho 2020
“Estamos no início de uma recessão econômica, que afetará a confiança na política, mas também nas relações internacionais, nos direitos civis e gerará um aumento nos níveis de violência”. Serge Stroobants, diretor das áreas europeia e do Oriente Médio e norte da África do Instituto para a Economia e a Paz (IEP), alerta que o mundo está entrando em uma fase volátil e perigosa.
A reportagem é publicada por El Salto, 10-06-2020. A tradução é do Cepat.
A apresentação, hoje, da edição 2020 do Índice da Paz Global (GPI, em sua sigla em inglês) está determinada pelo vírus covid-19, um acelerador das tendências que, ao longo da última década, pioraram os medidores da chamada “paz positiva”, analisada pelo IEP. Pela nona vez desde que o relatório foi publicado, há 14 anos, houve um agravamento geral das condições de paz. Tudo isso apesar da notável diminuição das ações englobadas sob o mote do terrorismo.
O parêntese que ocorreu entre 11 de março e 11 de abril, quando os protestos caíram 90% em todo o mundo, não é mais que isso, um parêntese dentro de uma tendência generalizada e global. De 2011 a 2019, o número combinado de protestos antigovernamentais, distúrbios e greves gerais aumentou 244% em todo o mundo. As consequências da pandemia no nível econômico e social, juntamente com as situações de carestia e escassez às quais a humanidade se expõe, devido à crise climática, significarão um aumento de conflitos: “As pessoas estão em grande incerteza e vão demandar mudanças a seus governos”, resume Stroobants.
Os 163 países que aparecem no relatório (e que representam 99% da população mundial) enfrentam os riscos econômicos, sociais e políticos da pandemia, embora existam apenas duas categorias nos países mais afetados, aponta Stroobants: os Estados que possuem uma economia resiliente, capazes de obter maior arrecadação e, com ela, investir para mitigar as consequências da covid, e os países com economias frágeis, com excesso de dívida em relação ao PIB e perigosamente dependentes das exportações de baixo valor agregado e o turismo.
Serge Stroobants acredita que para manter baixos níveis de violência, a resposta dos Estados deve priorizar o crescimento econômico na base, por meio de aluguéis e subsídios, mas também com medidas que mitiguem o impacto da atividade humana no meio ambiente.
O aumento na última década da polarização social - aumentada pelo uso da brutalidade policial como resposta imediata de uma maioria de Governos em todo o mundo – se soma, junto com a covid-19, a questões materiais, como o aumento dos preços, o que afeta a população mais pobre. A covid-19 apenas “exacerba as diferenças em nossas sociedades”, explica Stroobants, que lembra que dois em cada três conflitos na Europa têm uma manifestação não violenta.
No entanto, para o diretor europeu do IEP, os problemas de fome e privação severa, que já afetavam antes da pandemia 113 milhões de pessoas em todo o mundo, vão aumentar como consequência da depressão econômica. Países com conflitos abertos e dependentes de ajuda humanitária (Sudão do Sul, Afeganistão, Libéria e Burundi), com crises em seu sistema financeiro (Argentina, Paquistão e Brasil) e em meio a uma crise política e econômica como a Venezuela, se verão seriamente afetados por muitos dos indicadores de paz positiva do relatório. “A pandemia irá desfazer muitos anos de desenvolvimento socioeconômico em vários países, exacerbando as crises humanitárias, distúrbios e conflitos, corrobora o relatório.
O relatório associado ao índice sobre os efeitos da covid-19 alerta para sérios riscos de aumento da violência como consequência do aumento do desemprego, da instabilidade política e do aumento do autoritarismo. Somente será possível produzir determinadas melhoras na redução dos gastos militares, como consequência do maior investimento em políticas sociais, ao que os Governos se verão obrigados.
Enquanto se reproduz uma crise sem precedentes no mundo globalizado do século XXI, o relatório do IEP mostra pouca mudança em relação aos países com o mais alto índice de paz global. Islândia, Nova Zelândia, Portugal, Áustria e Dinamarca são os cinco países com melhores resultados, em uma classificação que pondera 23 estatísticas de três categorias principais: nível de segurança das sociedades, a existência de conflitos civis e com outros países e o grau de militarização do país.
Especialmente a partir de 2017, ano marcado pelo referendo de 1º de outubro na Catalunha e a repressão subsequente, a Espanha caiu 15 lugares. Em junho de 2017, estava na posição 23, em 2020, está na posição 38, embora tenha melhorado uma colocação em relação ao ano passado. A Espanha tem um nível médio-alto de militarização da vida pública (incluindo forças de segurança), um nível médio-baixo em conflitos internos e falta de segurança cidadã. O custo econômico da violência em nosso país é baixo, comparado com o resto dos países, representa 4% do seu PIB, ou seja, 3.254 euros per capita.
Exatamente 17 dos 25 principais países do Índice pertencem à União Europeia, sem dúvida, a região mundial mais estável. Atrás da Espanha estão países como Reino Unido, Grécia, França e Turquia, que está na posição 150 das 163 do índice.
Afeganistão, Síria, Iraque, Sudão do Sul e Iêmen continuam ocupando as últimas posições no ranking. No ano passado, o indicador que mais cresceu foi o de deslocamentos internos, uma porcentagem que aumentou em 204%, desde 2008. Quase 43 milhões de pessoas em todo o mundo foram forçadas a sair de suas casas como consequência de conflitos armados e de condições inseguras de vida em seus países. Somam-se aos 22 milhões de refugiados e solicitantes de asilo, um número que aumentou 116%, desde 2008.
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Os conflitos no mundo aumentaram 244%, na última década, e continuarão crescendo após a covid-19 - Instituto Humanitas Unisinos - IHU