24 Abril 2020
Nesse mesmo dia, dois discípulos iam para um povoado, chamado Emaús, distante onze quilômetros de Jerusalém. Conversavam a respeito de tudo o que tinha acontecido. Enquanto conversavam e discutiam, o próprio Jesus se aproximou, e começou a caminhar com eles. Os discípulos, porém, estavam como que cegos, e não o reconheceram.
Então Jesus perguntou: “O que é que vocês andam conversando pelo caminho?” Eles pararam, com o rosto triste. Um deles, chamado Cléofas, disse: “Tu és o único peregrino em Jerusalém que não sabe o que aí aconteceu nesses últimos dias?”.
Jesus perguntou: “O que foi?”
Os discípulos responderam: “O que aconteceu a Jesus, o Nazareno, que foi um profeta poderoso em ação e palavras, diante de Deus e de todo o povo. Nossos chefes dos sacerdotes e nossos chefes o entregaram para ser condenado à morte, e o crucificaram. Nós esperávamos que fosse ele o libertador de Israel, mas, apesar de tudo isso, já faz três dias que tudo isso aconteceu! É verdade que algumas mulheres do nosso grupo nos deram um susto. Elas foram de madrugada ao túmulo, e não encontraram o corpo de Jesus. Então voltaram, dizendo que tinham visto anjos, e estes afirmaram que Jesus está vivo. Alguns dos nossos foram ao túmulo, e encontraram tudo como as mulheres tinham dito. Mas ninguém viu Jesus”.
Então Jesus disse a eles: “Como vocês custam para entender, e como demoram para acreditar em tudo o que os profetas falaram! Será que o Messias não devia sofrer tudo isso, para entrar na sua glória?”. Então, começando por Moisés e continuando por todos os Profetas, Jesus explicava para os discípulos todas as passagens da Escritura que falavam a respeito dele.
Quando chegaram perto do povoado para onde iam, Jesus fez de conta que ia mais adiante. Eles, porém, insistiram com Jesus, dizendo: “Fica conosco, pois já é tarde e a noite vem chegando”. Então Jesus entrou para ficar com eles. Sentou-se à mesa com os dois, tomou o pão e abençoou, depois o partiu e deu a eles. Nisso os olhos dos discípulos se abriram, e eles reconheceram Jesus. Jesus, porém, desapareceu da frente deles.
Então um disse ao outro: “Não estava o nosso coração ardendo quando ele nos falava pelo caminho, e nos explicava as Escrituras?”. Na mesma hora, eles se levantaram e voltaram para Jerusalém, onde encontraram os Onze, reunidos com os outros. E estes confirmaram: “Realmente, o Senhor ressuscitou, e apareceu a Simão!”. Então os dois contaram o que tinha acontecido no caminho, e como tinham reconhecido Jesus quando ele partiu o pão.
Leitura do Evangelho de Lucas capítulo 24, 13-35 (Correspondente ao Terceiro Domingo de Páscoa, ciclo A do Ano Litúrgico).
O comentário é de Ana Maria Casarotti, Missionária de Cristo Ressuscitado.
Neste terceiro domingo de Páscoa continuamos aprofundando na experiência das comunidades evangélicas no seu encontro com Jesus Ressuscitado. Nos evangelhos as aparições do Ressuscitado narram as diversas experiências do encontro com Ele numa linguagem que utiliza diferentes gêneros literários e religiosos da época. Descrevem-se sentimentos de estupor junto com o medo e a alegria, a desconfiança, a dúvida e a certeza da sua presença, a insegurança, o desejo de tocá-lo.
Também se contam diversas atitudes como, por exemplo, a de dois discípulos que escutam as mulheres e correm ao sepulcro, ou outros que estão juntos com as portas fechadas por medo dos judeus, e neste texto apresenta-se que “dois discípulos iam para um povoado, chamado Emaús, distante onze quilômetros de Jerusalém”.
Estes discípulos caminham para um lugar que possivelmente seja o povoado onde conheceram Jesus. Eles tinham partilhado com Jesus muitos momentos da sua vida nos caminhos da Galileia. Escutaram suas palavras, experimentaram sua presença misericordiosa no meio deles, mas agora Ele havia morrido. E junto com sua morte, morreram suas expectativas, tudo aquilo que esperavam de Jesus, que era o Salvador, o Messias, o Libertador, tudo isso morreu na sua morte! Eles aguardavam um profeta poderoso em palavras e obras e isso não aconteceu.
Tristes e desanimados porque seus projetos e esperanças ficaram frustrados, sem possibilidade de serem realizados, saem de Jerusalém a caminho de um povoado, abandonando possivelmente o grupo de discípulos e discípulas porque já não teria sentido viver em comunidade. A presença de Jesus os reunia, mas sem Ele tudo perdeu seu sentido.
Vão a caminho afastando-se de Jerusalém, possivelmente regressam ao habitual e àquilo que tinham renunciado para seguir Jesus. Sair de Jerusalém sem acreditar na ressurreição é caminhar sem orientação, sem uma meta clara e sem rumo.
“Conversavam a respeito de tudo o que tinha acontecido. Enquanto conversavam e discutiam, o próprio Jesus se aproximou, e começou a caminhar com eles.”
Aquilo que tinham vivido com Jesus não desaparece dos discípulos, não foi uma experiência passada, mas ainda permanece entre eles. Não desaparece da sua vida nem do seu coração, o vivido permanecia neles porque não vão esquecer tudo o que aconteceu e que tinham experimentado junto com Jesus.
Enquanto os dois discípulos discutem porque possivelmente não há unanimidade entre eles, “Jesus se aproximou e começou a caminhar com eles”. Jesus se aproxima da sua realidade, da sua situação e pergunta-lhes: “O que é que vocês andam conversando pelo caminho?”.
Jesus está ao nosso lado, apesar de que muitas vezes podemos desconhecer sua presença ou não ter olhos para vê-lo. Ele se faz vizinho e achega-se à situação seja qual for, sem distinção. Interessa-se pelas nossas conversas, “entra” nos nossos diálogos e discussões e está presente naquilo que nos preocupa.
Como diz o Papa Francisco: “Jesus caminha conosco. Frente às interrogações que brotam do coração do homem e frente aos desafios que a realidade apresenta, podemos sentir uma sensação de extravio e perceber que nos faltam energias e esperança [...] Mas se contemplamos a Jesus Ressuscitado, que caminha junto aos discípulos de Emaús (cf. Lc 24, 13-15), nossa confiança pode se reavivar. Nesta cena evangélica temos uma autêntica e própria ‘liturgia do caminho’, que precede a da Palavra e a do Pão partido e que nos comunica, em cada um de nossos passos: Jesus está ao nosso lado!”.
Francisco recordou e observou que os dois discípulos, feridos pelo escândalo da cruz, retornaram para casa “percorrendo o caminho da derrota: levam no coração uma esperança rompida e um sonho que não se realizou”. Contudo, Cristo “não os julga, caminha com eles e, ao invés de levantar um muro, abre uma nova trilha”. (Disponível aqui)
Jesus caminha com eles, escuta o relato do “que aconteceu a Jesus, o Nazareno”, mas recebe sua tristeza e desânimo porque, apesar de terem escutado a proclamação das mulheres, o desencanto e desalento apodera-se deles porque “ninguém viu Jesus”.
Jesus torna-se assim confidente da frustração deles, escuta a narrativa do olhar dirigido simplesmente aos fatos, ao histórico e acontecido cronologicamente. Mas sua pergunta “faz que com que os discípulos levantem os olhos do chão e olhem para o rosto do peregrino desconhecido. Sem perceber, começam a sair de seu fechamento e a alegrar-se porque alguém está interessado em saber quais são as causas de sua tristeza e quer escutá-los. (Disponível aqui)
Como consequência desta conversação, os discípulos não querem que Jesus os abandone, insistem para que Jesus permaneça com eles. No momento da ceia eles reconhecem o que havia acontecido no caminho e entendem a origem da alegria que experimentaram no caminho: “Não estava o nosso coração ardendo quando ele nos falava pelo caminho, e nos explicava as Escrituras?”
Jesus aceita o convite e entra para ficar com eles. “Sentou-se à mesa com os dois, tomou o pão e abençoou, depois o partiu e deu a eles”. “Foi durante a “fração do pão” que os olhos dos discípulos se abriram e reconheceram Jesus”. Mas depois de reconhecê-lo “é necessário realizar imediatamente o ‘caminho de volta’ para a comunidade, para partilhar com os outros a experiência do encontro com o Senhor, professar juntos a fé comum e realizar as obras do Reino”.
Nos discípulos de Emaús também podemos reconhecer-nos. Quantos/as de nós, tantas vezes, caminhamos assim pela vida desorientados, abatidos, carregando o peso da injustiça, da incompreensão. E aqui vem uma primeira boa notícia deste evangelho: neste caminhar não estamos sozinhos, Jesus, o Emanuel (Deus conosco) caminha conosco.
Neste tempo de Páscoa, somos convidados a acompanhar tantas pessoas que ao nosso lado caminham tristes e desanimadas para gerar nelas a esperança da vida que é Jesus, que, apesar de tanto sofrimento, está ao seu lado. Ao ressuscitar seu Filho crucificado, Deus manifesta a justiça de seu amor. Não deixa que a morte triunfe. A ressurreição é uma força de esperança que se grava no coração da humanidade e grita aos crucificados deste mundo para não desistirem, pois o Deus da vida caminha conosco e nos ressuscitará.
Como disse o Papa Francisco, “Neste tempo convidar à alegria pode parecer uma provocação, e inclusive, uma atitude de mau gosto diante das graves consequências que estamos sofrendo pela Covid-19. Não são poucos os que poderiam pensá-lo, assim como os discípulos de Emaús, como um gesto de ignorância ou de irresponsabilidade (cf. Lc 24, 17-19).
Porque “este é o tempo - continua Francisco - é o tempo propício do Senhor, que nos pede para não nos conformarmos nem ficarmos satisfeitos e menos ainda justificarmo-nos com lógicas substituíveis ou paliativas que nos impeçam de assumir o impacto e as graves consequências que estamos vivendo. Este é o tempo propício para nos animarmos a uma nova imaginação do possível com o realismo que apenas o Evangelho pode nos proporcionar”.
Neste domingo e neste momento especial que estamos vivendo, nos unimos ao pedido do Papa Francisco para descobrir o sopro do Espírito que abre horizontes, desperta a criatividade e nos renova na fraternidade para dizer presente (ou seja, estou aqui) diante da enorme e imperativa tarefa que nos espera.
Em teu silêncio acolhedor
nos ofereces ser tua palavra
traduzida em milhares de línguas
adaptada a toda situação.
Queres expressar-te em nossos lábios
no sussurro ao doente terminal,
no grito que sacode a injustiça,
na sílaba que alfabetiza uma criança.
Em teu respeito a nossa história,
nos ofereces ser tuas mãos,
para produzir o arroz,
lavar a roupa familiar,
salvar a vida com uma cirurgia,
chegar na carícia dos dedos
que alivia a febre sobre a testa
ou acende o amor na face.
Em tua aparente paralisia,
nos envias a percorrer caminhos.
Somos teus pés e te aproximamos
das vidas mais marginalizadas,
pisadas suaves para não despertar
as crianças que dormem sua inocência,
passos fortes para descer até a mina
ou entregar com pressa uma carta perfumada.
Nos pedes ser teus ouvidos,
para que tua escuta tenha rosto,
atenção e sentimento,
para que não se diluam no ar,
as queixas contra tua ausência,
as confissões do passado que remói
a dúvida que paralisa a vida
e o amor que partilha sua alegria.
Obrigado, Senhor, porque nos necessitas.
Como anunciarias tua proposta
sem alguém que te escute no silencio?
Como olharias com ternura,
sem um coração que sinta teu olhar?
Como combaterias a corrupção
sem um profeta que se arrisque ?
Benjamin González Buelta
Para sentir e saborear as coisas internamente
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Jesus caminha conosco - Instituto Humanitas Unisinos - IHU