21 Setembro 2019
"A secularização levou certos cristãos a reações defensivas buscando refúgio "no crescente calor da proximidade e do literalismo devocional" ou na "fascinação por ‘pais espirituais' exagerados", escreve o filósofo francês Bernard Ginisty em comentário a respeito da obra Croire, mais en quoi? Quand Dieu ne dit plus rien de Dom Albert Rouet, em artigo publicado por Guarrigues et Sentiers, 16-09-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Depois de ter servido como Bispo Auxiliar de Paris e Arcebispo de Poitiers de 1993 a 2011, Albert Rouet oferece um testemunho particularmente lúcido da situação da Igreja Católica na época da secularização. Em sua última obra intitulada Croire, mais en quoi? Quand Dieu ne dit plus rien (Acreditar, mas em quê? Quando Deus não diz mais nada), mostra-nos como a "bela construção tradicional" das relações entre o sagrado e o profano tenha sido completamente revirada pela secularização: "O sagrado voa para longe. Abandona templos e padres, para pousar-se na fachada da Bolsa de Valores e nos estádios. Coloca a auréola nos campeões e a coroa nas stars" (1).
Essa situação obriga os cristãos a "se converterem em outro modo de pensar" para reencontrar o coração da mensagem do Evangelho: "O sagrado não abre mais a porta para o anúncio da fé. Não fornece mais uma pré-compreensão crente - ou contrária. Portanto, é em torno da encarnação que tudo é jogado". Isso nos leva à que se chama de "questão fundamental": "Como alcançar aqueles que, para além da oposição entre crer e não crer, portanto secularizados, buscam confusamente algo que os toque?" (2).
Segundo Albert Rouet, "Jesus envia seus apóstolos não ao Templo, mas às pessoas" (3). O que significa "que antes de falar, os discípulos devem se fazer acolher" (4).
É por isso que Albert Rouet denuncia com vigor uma escolástica e uma tradição catequética "que ousava fazer às crianças de dez anos essa pergunta à qual nenhum verdadeiro místico ou filósofo sensato quis dar resposta: “Qu'est-ce que Dieu?” (...) A pergunta era formulada apenas porque o "mestre" queria que eles soubessem esta definição (que não responde a nada: "Deus é puro espírito infinitamente bom, mestre soberano e criador de tudo" (NdR. Para as crianças italianas era: “Deus é o ser mais perfeito, criador e senhor do céu e da terra”) (...) Essa escolástica abstrusa preparava um deísmo inconsistente, muito pouco cristão, Rapidamente levou ao ateísmo: quem confiaria sua própria vida a uma abstração tão etérea?" (5).
A secularização levou certos cristãos a reações defensivas buscando refúgio "no crescente calor da proximidade e do literalismo devocional" (6) ou na "fascinação por ‘pais espirituais' exagerados" (7). Para Albert Rouet, os Evangelhos lembram que Jesus é o Enviado do Pai: ele é doado, entregue aos homens. A secularização atual está esperando que a Igreja siga o mesmo caminho. É o que Rouet especifica em uma entrevista publicada no semanal Réforme: “Acredito que a secularização possa ajudar a Igreja Católica a crescer. As pessoas falam conosco, se expressam. Devemos ouvi-las e parar de "falar de religião" com linguagem clássica. No evangelho de Lucas, tal linguagem está totalmente ausente. Quando Cristo envia os apóstolos em missão, eles partem sem nada nas mãos ou nos bolsos. Se não souberem se fazer acolher, dormirão na rua. Sem um mínimo de relação humana antes de qualquer outra coisa, se não nos tornamos irmãos, como cristãos não poderemos dizer nada" (8).
Notas:
(1) Albert ROUET, Croire, mais en quoi? Quand Dieu ne dit plus rien, éd. de l’Atelier, Ivry, 2019, p.140.
(2) Id. p. 282.
(3) Id., p. 157.
(4) Id., p. 285.
(5) Id., p. 163-164.
(6) Id., p. 47.
(7) Id., P. 287.
(8) Afirmações recolhidas por Philippe Clanché no semanal Réforme de 13 de junho de 2019, p. 13.
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“Todo crente é uma fonte, não uma água parada”, diz Albert Rouet - Instituto Humanitas Unisinos - IHU