05 Junho 2019
Entre março e abril, cerca de 11 mil hectares foram desmatados sem autorização na porção mato-grossense da bacia do Xingu. Agropecuária, morosidade na regularização ambiental e sensação de impunidade são as principais causas.
A reportagem é de Isabel Harari, publicada por Instituto Socioambiental - ISA, 04-06-2019.
Quem analisa imagens de satélite do Mato Grosso enxerga grandes manchas geométricas de cor marrom que se multiplicam mês a mês. Apenas entre março e abril 13.865 hectares de novas manchas, que correspondem ao desmatamento, surgiram na área da bacia do Xingu que incide sobre o estado. O que não se pode ver via satélite é que 78% desse total, quase 11 mil hectares, foram florestas derrubadas ilegalmente.
O equivalente a 13 milhões de árvores foram desmatadas sem autorização na porção mato grossense da bacia, segundo monitoramento feito pela Rede Xingu +, o Sirad X. [Acesse o boletim nº12]
Mapa com os rios da região norte da América do Sul (Gráfico: Wikimedia Commons)
“O alto percentual de desmatamento ilícito expressa a ineficácia dos instrumentos existentes de combate ao crime ambiental. Esse quadro pode piorar com a chegada da estação da seca, quando os números de desmatamento tendem a crescer”, alerta Ricardo Abad, especialista em sensoriamento remoto do ISA.
Em alguns municípios do Mato Grosso, como Canarana, Cláudia, Gaúcha do Norte, Peixoto de Azevedo e Querência, a taxa de desmatamento ilegal atingiu 100% no período analisado. Feliz Natal, ao leste da bacia, atingiu a marca de 68% de ilegalidade, mas foi o que mais desmatou em área: 1.572 hectares.
Quase 11 mil hectares foram desmatados ilegalmente no Mato Grosso. Em alguns municípios taxa atingiu 100%.
“A percepção do risco que é muito baixa”, explica Ana Valdiones, analista do Instituto Centro de Vida (ICV), quando questionada sobre as razões do desmatamento ilegal. De acordo com a organização, em 2018, 85% do desmatamento na parte amazônica do estado ocorreu sem autorização. A morosidade no processo de regularização ambiental e a falta de políticas públicas estaduais, segundo Valdiones, também explicam as altas taxas. “No geral a ilegalidade continua presente. Sempre foi e continua presente”, afirmou.
A Secretaria de Meio Ambiente do Mato Grosso (SEMA-MT) disponibiliza dados ainda mais assustadores. Entre 2015 e 2016, 98% das áreas desmatadas no estado não tinham autorização, já entre 2016 e 2017 a taxa atingiu 94%. A assessoria da SEMA-MT não respondeu aos pedidos de entrevista até o fechamento desta reportagem.
O Ibama, responsável pelas ações de combate ao desmatamento, reduziu o número de autuações em 35% se comparado com o período de janeiro a maio do ano passado.
Em março houve uma expansão de 461% no desmatamento detectado em Unidades de Conservação na bacia do Xingu em relação ao mês anterior. Só na Floresta Nacional (Flona) de Altamira, de jurisdição federal, houve um aumento de 550% em abril, com 242 hectares desmatados associados a garimpo ilegal. “É preocupante que, em um momento em que o desmatamento ilegal avança, a atuação do instituto fiscalizador seja reduzida. A fiscalização e responsabilização são etapas essenciais no combate às atividades ilegais”, comenta Abad.
Para Valdiones, a fiscalização deve ser associada a mais transparência nos dados sobre desmatamento ilegal e iniciativas de adequação ambiental no Mato Grosso, região de atuação do ICV. “A transparência, aliada ao uso e produção de informações a partir desses dados públicos, deixa claro quem é quem. Fica claro quem tem passivo [ambiental]”, aponta.
Nos meses de março e abril houve um aumento nas taxas de desmatamento detectado na bacia do Xingu em relação aos dois primeiros meses do ano. Foram registrados 21.495 hectares desmatados, o que representa um aumento de 156% em relação ao período anterior. Desse total, 19% foi desmatado no interior de Áreas Protegidas: Terras Indígenas e Unidades de Conservação.
A bacia do Xingu é uma área de 51 milhões de hectares que inclui 31 Terras Indígenas e 21 Unidades de Conservação abrangendo mais de 60 municípios no Pará e Mato Grosso. A região comporta uma sociobiodiversidade única, que corre sério risco com o avanço do desmatamento, grilagem, garimpo, roubo de madeira e a contaminação da paisagem por agrotóxicos.
Para o cálculo das taxas de ilegalidade, a equipe do SIRAD X cruzou os polígonos de desmatamento detectados em março e abril com os dados oficiais de autorizações de desmate disponibilizados pela SEMA-MT, com vigência de validade entre os anos de 2001 e 2023.
A secretaria disponibiliza camadas geográficas através de seu portal de monitoramento, onde podem ser adquiridas informações sobre autorizações de desmate, autorizações para exploração florestal, queimadas, entre outras. Dessa forma, as áreas desmatadas detectadas pelo monitoramento que não coincidem com nenhuma autorização válida são consideradas ilegais.
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Ao menos 13 milhões de árvores foram derrubadas ilegalmente no Xingu em dois meses - Instituto Humanitas Unisinos - IHU