05 Abril 2019
Fundada pelo Papa Pio X em 1909 para ser o centro de estudos da Sagrada Escritura em Roma, o Pontifício Instituto Bíblico esteve a serviço dos papas por 110 anos e estará novamente em maio, com uma conferência destinada a desmascarar os preconceitos em torno dos fariseus, os antigos precursores dos rabinos que aparecem no Novo Testamento.
O artigo é de John L. Allen Jr., publicado por Crux, 04-04-2019. A tradução é de Natália Froner dos Santos.
Ironicamente, uma figura que pode achar o programa interessante é o atual papa, já que os fariseus são um frequente tropo retórico para Francisco, e raramente de maneira positiva.
O evento de 7 a 9 de maio, nomeado “Jesus e os Fariseus: Uma Reavaliação Interdisciplinar” foi apresentado em uma conferência na quarta-feira (03), no Pontifício Instituto Bíblico patrocinado por jesuítas, localizado ao lado do Gregoriano. O encontro erudito culminará no dia 9 de maio, com uma audiência privada para participantes junto com o Papa Francisco.
Historicamente falando, os dois principais sobreviventes - de dentro do judaísmo palestino - da destruição do Templo de Jerusalém em 70 D.C. pelos romanos, foram os primeiros seguidores de Jesus, que vieram a se tornar os cristãos, e os fariseus, que hoje são vistos como tendo estabelecido as bases intelectuais, legais e rituais do judaísmo moderno. Outros grupos, como a elite do Templo, os saduceus e os esotéricos Essênios desapareceram logo após a queda do Templo.
Apresentando a lógica da conferência de maio, o Pe. Etienne Vetö, diretor do Centro Cardeal Bea para os Estudos Judaicos, da Pontifícia Universidade Romana Gregoriana, enfatiza uma conexão entre estereótipos negativos dos antigos fariseus e o antissemitismo contemporâneo.
Popularmente, ele disse, o termo “fariseu” é frequentemente usado com o significado de “hipócritas, moralmente rigorosos, atentos às aparências na religião, ritualísticos, até mesmo inimigos de Jesus,” Vetö disse, “mas pesquisas históricas e bíblicas mostram que essa visão comum é realmente incorreta”.
“Há muito em jogo para nossa compreensão do cristianismo e do judaísmo atual, que têm suas raízes no movimento farisaico,” ele disse. “O antissemitismo está relacionado a uma visão historicamente incorreta dos fariseus”.
A professora Amy-Jill Levine, especialista no Novo Testamento judaico que leciona na Universidade Vanderbilt e que está no comitê de organização da conferência, enfatizou a necessidade de traduzir as descobertas acadêmicas em como líderes cristãos pregam e ensinam sobre os fariseus.
“Muitos seminaristas parecem insuficientemente treinados sobre como pregar a respeito dos fariseus,” ela disse. “Poucos padres e pregadores têm relações com os judeus”.
“Quando você ouve comentários negativos sobre fariseus na igreja, nós normalmente dizemos ‘amém’. Nossos ouvidos não estão sensibilizados para o preconceito”.
Rindo, Levine sugeriu que poderia ser uma boa ideia ter pelo menos um judeu em cada missa católica do mundo para que pudesse verificar tais tendências, “mas não há o suficiente de nós”.
A má reputação ao redor dos fariseus, ela disse, é especialmente irônica dado o fato de que talvez o antigo fariseu mais famoso é ninguém menos do que Saulo de Tarso, ou São Paulo para os cristãos, que gabava-se de sua participação no grupo.
Se tudo que soubéssemos sobre fosse Paulo, “nós pensaríamos que os fariseus são fabulosos”.
“Mas você também tem os evangelhos,” disse ela, onde os fariseus são frequentemente descritos como rivais e inimigos de Jesus.
No fim, Levine disse, existem duas razões convincentes para os cristãos repensaram seus preconceitos sobre este antigo grupo judeu.
“Primeiro, Jesus é perfeitamente bom sozinho, Ele não precisa de um papel negativo”.
Segundo, ela disse, “eu não deveria dar falso testemunho contra meu vizinho”.
Ironicamente, o próprio Francisco é indiscutivelmente um dos maiores amplificadores de algumas das imagens negativas que a conferência pretende atacar, muitas vezes usando o termo “fariseu” como sinônimo de “rígido” e “legalista”, contrastando com a abordagem de Jesus.
Durante uma homilia de Outubro de 2018, por exemplo, ao comentar sobre um texto do Novo Testamento o Papa descreveu os fariseus da seguinte maneira: “Eles foram um real exemplo de formalidade. Mas eles não tinham vida. Eles eram, por assim dizer, ‘engomados’. Eles eram rígidos... As pessoas não importavam para eles. A Lei importava para eles, as prescrições, as rubricas”.
Perguntada se os organizadores esperavam que a conferência também fizesse o pontífice repensar sua retórica, Levine disse “o problema está em todo o mundo. Se mudanças pudessem ser feitas em toda cristandade, isso seria ótimo”.
O Pe. Joseph Sievers, que leciona no Pontifício Instituto Bíblico, enfatizou que todas as evidências sugerem que o Papa Francisco tem um “amor inquestionável” pelos judeus e pelo judaísmo.
“Desde suas amizades na Argentina a como ele falou [como papa] e assim por diante, o lado positivo é obviamente mais forte,” ele disse. A linguagem do Papa sobre os fariseus, disse Sievers, é um “detalhe” enquanto sua afeição é uma “atitude básica”.
No entanto, Sievers disse “muitas vezes acontece de termos pontos cegos”.
Enquanto enfatizava “nós não queremos ser polêmicos contra algo”, Sievers disse “queremos oferecer uma visão que tenha mais nuances, que seja uma influência para a mudança das pessoas... Talvez para nosso grande amigo Francisco”.
Levine ofereceu uma regra básica para qualquer cristão encarregado de pregar ou ensinar qualquer assunto que envolva o judaísmo, incluindo os fariseus. Quando ela lecionava em uma escola de divindade, ela dizia que levaria duas crianças judias para a aula.
“Eu dizia a eles ‘Imaginem que estas lindas e preciosas crianças estão sentadas aí ouvindo vocês... Não digam nada que vá machucar estas crianças'”.
Se isso não funcionasse, ela acrescentou, ela também convidava os seminaristas a imaginarem ela sentada na parte de trás da igreja, pronta pra dobrar seus ouvidos se algo estivesse errado.
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Papa que repreende fariseus está prestes a encontrar especialistas querendo reabilitá-los - Instituto Humanitas Unisinos - IHU