02 Abril 2019
A Igreja deve "entrar em diálogo" não por "modismo", muito menos por "estratégia" para "aumentar o número de membros". O problema dos cristãos é a "insignificância, não os números baixos". O Papa Francisco afirmou isso em seu encontro com os padres, religiosos e o Concílio Ecumênico em seu segundo e último dia de visita ao Marrocos. O Pontífice citou Bento XVI, lembrando que o crescimento eclesiástico acontece "não por proselitismo, mas por atração".
A reportagem é de Domenico Agasso Jr., publicada por Vatican Insider, 31-03-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.
Na catedral de Rabat, ele enfatizou que "os cristãos são um número pequeno neste país. Mas essa realidade não é, aos meus olhos, um problema, embora eu reconheça que às vezes pode se tornar difícil de ser vivida para algumas pessoas”. Francisco disse: "Sua situação me faz lembrar a pergunta de Jesus: ‘Com o que se assemelha o reino de Deus, com o que posso compará-lo? É semelhante ao fermento, que uma mulher pegou e misturou a três medidas de farinha, até tudo ficar levedado’".
Parafraseando as palavras "do Senhor, poderíamos nos perguntar: com o que se assemelha um cristão nessas terras? Com o que o posso comparar? É semelhante a um pouco de fermento que a mãe Igreja quer misturar com uma grande quantidade de farinha, até que toda a massa seja fermentada". De fato, Jesus "não nos escolheu e nos enviou para nos tornarmos os mais numerosos! Ele nos chamou para uma missão. Ele nos colocou na sociedade como aquela pequena quantidade de fermento: o fermento das bem-aventuranças e do amor fraterno em que, como cristãos, todos podemos nos encontrar para tornar presente o seu Reino”.
Isto significa que "nossa missão como batizados, como sacerdotes, como pessoas consagradas, não é determinada particularmente pelo número ou quantidade de espaço que ocupamos, mas pela capacidade de gerar e despertar mudança, assombro e compaixão"; e também pelo modo como "vivemos como discípulos de Jesus, no meio daqueles com quem compartilhamos a vida cotidiana, as alegrias, as tristezas, os sofrimentos e as esperanças".
Em outras palavras, os caminhos da missão não passam "pelo proselitismo". Aqui ele citou o papa emérito: "A Igreja cresce não por proselitismo, mas por atração, por testemunho". Para Francisco o proselitismo "sempre leva a um beco sem saída".
Portanto, o problema não é "ser em número reduzido, mas ser insignificantes, tornar-se um sal que não tem mais o sabor do Evangelho, ou uma luz que não ilumina mais nada".
Bergoglio pensa “que a preocupação surge quando nós, cristãos, somos atormentados pelo pensamento de sermos significativos apenas se formos a massa e ocuparmos todos os espaços. Vocês sabem muito bem que a vida é jogada com a capacidade que temos de "levedar" ali onde estamos e com quem nos encontramos. Embora isso possa não levar aparentemente a benefícios tangíveis ou imediatos". Porque ser cristão não é "aderir a uma doutrina, nem a um templo, nem a um grupo étnico. Ser cristão é um encontro. Somos cristãos porque fomos amados e encontrados e não fruto do proselitismo”.
Francisco relembrou então "aquela palavra do Papa São Paulo VI na Encíclica Ecclesiam suam: ‘A Igreja deve entrar em diálogo com o mundo em que vive. A Igreja faz-se palavra, faz-se mensagem, faz-se colóquio’". Dizer que "a Igreja deve entrar em diálogo não depende de uma moda, muito menos de uma estratégia para aumentar o número de seus membros". Se a Igreja deve entrar em diálogo é por fidelidade ao seu Senhor e Mestre que, desde o início, movido pelo amor, quis entrar em diálogo como amigo e convidar-nos a participar na sua amizade”.
Nesse espírito, "encontramos irmãos mais velhos que nos mostram o caminho, porque com suas vidas eles testemunharam que isso é possível, uma ‘medida alta’ que nos desafia e estimula. Como não lembrar a figura de São Francisco de Assis que, no auge da cruzada, foi ao encontro do sultão al-Malik al-Kamil? E como não mencionar o Beato Charles de Foucault que, profundamente marcado pela vida humilde e escondida de Jesus em Nazaré, que adorava em silêncio, queria ser um ‘irmão universal’? Ou ainda aqueles irmãos e irmãs cristãos que escolheram se solidarizar com um povo a ponto de dar suas próprias vidas?".
Francisco falou de "um diálogo que se torna oração e que podemos realizar concretamente todos os dias em nome da ‘fraternidade humana’ que abraça todos os homens, os une e os torna iguais. Em nome dessa irmandade dilacerada pelas políticas de integralismo e divisão e por sistemas de ganhos desmedidos e tendências ideológicas odiosas, que manipulam as ações e destinos dos homens", disse, retomando o "Documento sobre a fraternidade humana" assinado em Abu Dhabi com o grande Imam de Al-Azhar em 4 de fevereiro. Uma oração "que não distingue, não separa e não marginaliza, mas que se torna eco da vida do próximo; oração de intercessão que é capaz de dizer ao Pai: ‘venha o teu reino’. Não com a violência, não com ódio, nem com a supremacia étnica, religiosa e econômica, mas com a força da compaixão derramada na Cruz por todos os homens".
O Papa agradeceu a Deus "pelo que vocês fizeram, como discípulos de Jesus Cristo, aqui no Marrocos, encontrando todos os dias no diálogo, na colaboração e na amizade as ferramentas para semear o futuro e a esperança. Assim vocês desmascaram e conseguem colocar em evidência todas as tentativas de usar as diferenças e a ignorância para semear o medo, o ódio e o conflito. Porque sabemos que o medo e o ódio, alimentados e manipulados, desestabilizam e deixam nossas comunidades espiritualmente indefesas”.
Para testemunhar "a presença permanente e duradoura de pessoas consagradas no Marrocos" estava presente na Catedral de Rabat, para se encontrar com o Papa, também a Irmã Ersilia Mantovani, franciscana italiana de 97 anos que recentemente celebrou 80 anos de vida religiosa.
Antes do encontro religioso, no início de seu segundo dia no Marrocos, despedindo-se da Nunciatura Apostólica, o papa Francisco chegou em visita particular ao Centro Rural dos Serviços Sociais de Temara, uma cidade na costa do Atlântico a 15 km ao sul de Rabat. O Centro é dirigido pelas freiras vicentinas e atua no setor social graças às religiosas e numerosos voluntários, oferecendo diversos serviços à população local: alfabetização para adultos; serviço escolar para os mais jovens; serviço de refeitório; jardim de infância para crianças de 2 a 7 anos; ajuda psicológica para os mais necessitados e cuidados médicos para os doentes, em particular para as vítimas de queimaduras, que recebem o acompanhamento sanitário necessário.
Após a sua chegada, o Papa foi recebido na entrada pelas quatro irmãs que trabalham no Centro e por duas crianças que lhe oferecem flores como presente. Enquanto o Pontífice foi cumprimentar os pequenos doentes, um coral de 150 crianças entoou um canto. Antes de deixar o Centro, o Papa despediu-se das irmãs e dos voluntários e finalmente cumprimentou os pais das crianças assistidas enquanto estas cantavam.
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Cristãos: o problema é a insignificância, não os números baixos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU