Por: Ricardo Machado | 21 Dezembro 2017
Um a um, os convidados entraram na sala e foram ajeitando suas cadeiras até formar um grande círculo com quase 50 pessoas. Acomodaram-se e o zum zum zum da agitação da chegada foi dando lugar ao silêncio até que Luiz Felipe Lacerda, secretário executivo do Observatório Nacional de Justiça Social Luciano Mendes de Almeida – OLMA, começasse formalmente o encontro Diálogo inter-religioso e intercultural como resistência cultural dando boas vindas a todos. O evento ocorreu na tarde da quinta-feira, 14-12-2017, na sala Ignacio Ellacuría e Companheiros – IHU, na Unisinos em São Leopoldo, no RS.
Luis Felipe abriu o encontro e passou a palavra aos demais participantes (Fotos: Ricardo Machado/IHU)
José Bandeira
No lugar de discursos longos e acadêmicos, o som suave de uma flauta indígena. Akai Lu, indígena da etnia Kariri Xocó, tirou de sua grande bolsa fabricada com fibra de árvore, onde transporta vários instrumentos musicais, uma grande flauta de bambu e começou sua canção que, além de um boas vindas, servia para conectar-se aos espíritos da floresta. Depois de um breve silêncio, ao fim da execução, Ir. José Carlos Bandeira, representante espírita, tomou a palavra. “O espiritismo é uma doutrina cristã, em que Jesus é o modelo de espiritualidade”, ponderou Bandeira.
Monja Kokai
Fazendo uma conexão com os desafios conjunturais que enfrentamos, Monja Kokai, zen budista, relatou que “as dificuldades conjunturais dos últimos três anos nos levam a pensar o papel do religioso”. A monja frisa que quando percebeu estava, também, atuando como uma “líder política”.
Inacio Spohr
Inácio José Spohr, representante católico, falou da importância de se estabelecer conversas em tom de igualdade, sem hierarquizações. “O diálogo sempre pressupõe uma conversa entre iguais. A Igreja tem muito o que pedir desculpas e hoje oferece a oportunidade do diálogo. É justamente o diálogo que permite superarmos os desafios sociais presentes”, pontuou.
Yashodan
Yashodhan, líder espiritual do Kilombo Morada da Paz, em Triunfo, no RS, fez um resgate do matriarcado que explica a fundação e a história de sua comunidade. “O mundo se transforma com atitudes, não com palavras. Falo do território de mãe preta, de uma comunidade prioritariamente de mulheres. Ainda há tempo para que a esperança do século XXI não nos traia. Precisamos repactuar nossa humanidade”, sinalizou.
Akai Lu
Akai Lu foi convocado à fala, preferiu antes de qualquer coisa pegar uma maraca em sua bolsa e entoar uma canção indígena. Quando passou sua mensagem o fez primeiramente em seu idioma tradicional, todos na sala o observavam com olhos de curiosidade sem entender nada, como se na próxima palavra ele fosse, então, voltar ao português. Disse, por fim: “Eu falava que estamos todos sem saber o que é Deus. A gente aprende as coisas em uma forma, mas depois se diz a mesma coisa com outra forma. Há uma juventude que não olha nem para o novo, nem para o velho, apenas para si próprio. Precisamos tomar cuidado com o conforto porque estamos cheios de vaidade”, provocou.
Denizia Kawany
Denizia Kawany, indígena Kariri Xocó, que também participou do encontro, chamou atenção para as formas de preservação da memória de sua comunidade. “O nosso povo tem uma oralidade e um canto. Quando a gente evoca nossas ancestralidades vemos toda a diversidade das divindades espirituais”, explicou. “O que se discute na espiritualidade é a força energética. É o que podemos contribuir com o outro. Nós falamos palavras como forma de praticar diálogo com toda a natureza”, complementou Akai Lu.
Israel e Everson
Duas performances artísticas encerraram o encontro. O músico Israel Oliveira, do Centro Medianeira de Trabalho Sócio Assistencial, de São Leopoldo, no RS, tocou no acordeom e cantou a música Leilão de Escravos, que conta uma história comum a muitos negros escravizados no Brasil. “A música é uma coisa muito forte na cultura negra”, lembrou Oliveira. Por fim, Everson Vargas, integrante do Neabi Unisinos, ajoelhou-se em frente a cada um dos participantes do evento, sentados em círculos, e recitou uma breve poesia, criada na hora. Como último ato, Akai Lu, voltou a cantar com as pessoas da morada da paz, todos se abraçaram. O encontro acabava como havia começado, com o compartilhamento não somente de diálogos, mas de afetos.
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O bom encontro do Diálogo Inter-religioso e intercultural como resistência cultural - Instituto Humanitas Unisinos - IHU