15 Dezembro 2017
Um bobo com lápis faz bobagem, mas um bobo com mouse faz muito mais bobagem...
Por que o povo está nas ruas contra a reforma da previdência na Argentina e não está no Brasil?
Alguma relação com os anos de desmobilização dos movimentos sociais levada a cabo pelo lulismo? Ou com a atual expectativa de que São Lula resolverá tudo sozinho?
Curiosamente estávamos nas ruas antes (contra Sarney, contra Collor, contra FHC) e, depois de 13 anos em que a esquerda supostamente chegou ao poder, estamos mais desmobilizados do que antes.
Uma das coisas que mais têm me deixado angustiado nos últimos tempos é o recurso à violência na esfera pública. Mais do que isso: constatar que a violência é eficiente e funciona e deixou de ser o oposto da razão. Tornou-se um novo padrão de racionalidade.
A sociedade tecnológica em que vivemos é uma sociedade performativa. Performar não é descrever a substância da realidade. Performar é produzir realidades por meio do discurso e da ação.
Some-se a isso que tecnologia e racionalidade são duas entidades inconciliáveis. Apenas Habermas e meia-dúzia de almas penadas espalhadas pelo mundo acreditam em uma conciliação possível entre tecnologia e racionalidade.
Isso explica a vantagem esmagadora da propaganda e do marketing e o sucesso devastador do capitalismo em todo planeta. Isso também explica a expansão avassaladora dos discursos de extrema-direita e neofascistas.
Eles compreenderam como poucos que a eficiência é mais importante do que a moralidade ou os valores ou a verdade. Apenas moralistas e idiotas se guiam por valores. Afinal todos os valores são nada se todos os valores valem o mesmo.
Eles compreenderam como poucos também que o mais importante é produzir realidades, pouco importa se essas realidades produzidas são fake news, manipulações de dados, discursos de ódio.
O naufrágio mundial das esquerdas está ligado a uma absoluta incapacidade de usar a violência em seu favor. Uma absoluta incapacidade se valer das guerrilhas culturais como máquinas de guerras cujo intuito é conquistar territórios. A absoluta incapacidade de sair da reflexologia onanista, dos debates racionais e dos filosofemas civilizados. Uma absoluta incapacidade enfim de compreender o poder performativo, amoral e desinibidor das tecnologias.
Se seguirmos assim, as esquerdas continuarão fazendo política do século XX enquanto a extrema-direita lança as bases da política do século XXI. Como não poderia deixar de ser, se continuarmos assim essa é e sempre será uma guerra perdida.
Mexendo em meus alfarrábios dei de cara com este artigo.
Ele trata das primeiras denúncias de irregularidades envolvendo petistas.
Era um tempo em que havia pouquíssimos casos de corrupção envolvendo partidos ou militantes de esquerda, mas o texto já chamava a atenção para o problema e para a necessidade de ele ser enfrentado.
Eu ainda era filiado ao PT e o "Jornal do Brasil" impresso ainda existia. Eu trabalhava lá e publiquei este artigo em 22 de julho de 2002, antes portante do primeiro governo Lula;
Ele faz parte da coletânea de textos com o título "Reflexões rebeldes" que publiquei há dois anos.
Vale a pena lê-lo.
Como tratar o lixo da esquerda
É forçoso reconhecer que as experiências socialistas não tiveram a marca do fortalecimento da democracia. Mais do que uma suposta incompatibilidade de socialismo com democracia, a meu ver isso se deveu a circunstâncias históricas (agressões militares, asfixia econômica etc).
No entanto, é inegável que essas circunstâncias ajudaram a consolidar traços autoritários na doutrina socialista. O que não impede que, em tese – por oferecer patamares mínimos de educação, cultura e vida material a todos – o socialismo crie melhores condições para o exercício democrático da cidadania.
Para se convencer disso, é só olhar para o papel determinante do poder econômico nos países capitalistas (e não só nos do Terceiro Mundo) ou, ainda, para a exclusão social de parcelas expressivas em boa parte desses países, o que tem consequências diretas no exercício da cidadania.
Hoje, a maioria das correntes de esquerda faz profissão de fé democrática e defende uma imprensa crítica e independente. Praticamente nenhuma admite como modelo o regime stalinista ou seus descendentes diretos.
Mas, na realidade, nem sempre é assim. Não poucos reagem mal quando têm os calos pisados. Por paradoxal que pareça, frases como “a publicação disso favorece a direita” ou “é melhor só tratar dessa questão num outro momento” são muito ouvidas.
Nos últimos meses, por suas vezes me vi envolvido em situações assim.
A primeira, em janeiro, uma semana depois da morte do prefeito Celso Daniel. Fiz uma reportagem que tratava de um esquema de corrupção na prefeitura. E informava que, pouco antes de ser assassinado, Celso Daniel vinha se chocando com figuras centrais do esquema. Concluía afirmando que esses fatos deveriam ser levados em conta nas investigações sobre sua morte. O mundo quase veio abaixo. Ouvi coisas como: “Esse tipo de matéria não ajuda a campanha do Lula e deveria ficar para outro momento”. Como se, no tal “outro momento”, não fossem aparecer também “razões de Estado” para engavetar assuntos incômodos.
Domingo passado, outra matéria que fiz despertou reações semelhantes, embora mais localizadas, por envolver personagem menor. Ela contava que o Tribunal de Contas da União (TCU) considerara irregular o pagamento de diárias pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura do Rio de Janeiro (Crea-RJ) a seu presidente, hoje licenciado. A justificativa para o pagamento é que o beneficiado mora em Niterói e a sede do órgão é no Rio – portanto em outra cidade. Note-se que o percurso – de não mais de 20 quilômetros – era feito em carro com ar-condicionado, motorista e combustível pagos pelo Crea.
O pagamento de tais diárias, claramente imorais, já era comentado por engenheiros e arquitetos e no PT – partido pelo qual o beneficiário é candidato a deputado. Não encontrei ninguém que o defendesse. Mas houve quem, sabendo da preparação da matéria, viesse a mim ponderar a sua “inconveniência” (alguns o faziam claramente a pedido de assessores do beneficiário). O argumento não era novo: poderia “prejudicar o PT e a campanha de Lula”.
Mas, afinal, quem prejudica a esquerda? Quem se envolve em irregularidades, imoralidades e crimes ou quem não aceita empurrá-los para baixo do tapete?
Como jornalista pretendo continuar defendendo a publicação do que seja relevante para a sociedade. É a melhor forma de dignificar a profissão. Mais importante até do que isso: é a melhor forma de exercer a cidadania e defender a democracia.
22 de julho de 2002
24 horas atrás, o Chanceler dos EUA declarou que o país está disposto a se sentar para conversar com a Coreia do Norte sem pré-condições. Agora, a Casa Branca desmente o seu próprio Chanceler e diz que não é nada disso (http://nyti.ms/2ACzFDp).
É oficial: o governo do país mais poderoso do mundo é um meio-campo treinado por Dunga.
Em geral não concordo com o Élio Gaspari, mas há anos ele escreveu um texto excelente, sobre a crise das sucessivas reivindicações que acomete o Brasil.
Não se podia libertar os escravos porque eles não tinham escolaridade e outras necessidades para viver como homens livres. Mas para dar escolaridade era necessário antes fazer x. E para fazer x era preciso antes fazer y. E por isso tudo ficava como estava.
Hoje, num outro debate, vi mais de uma pessoa dizer que não se deve fazer caridade para uma pessoa porque não se faz para todas que precisam. Então, como não se faz para todas, não se faz para uma.
É impressionante como podemos listar uns 200 exemplos dessas sucessivas reivindicações que terminam em imobilismo.
Quem já tentou explicar a um gringo por que "lua" é uma palavra feminina e "sol", uma palavra masculina sabe o trabalho que dá."Lua" não produz óvulos nem tem cromossomos XX.
"Sol" não tem testículos, não produz esperma ou tem cromossomos XY.
É só uma convenção.
Mais complicado se tiver que convencer um alemão, para quem "lua" é masculino ("der Mond") e “sol”, feminina ("die Sonne").
É que na gramática - conforme ensina a lingüista mexicana Concepción Company - gênero não corresponde necessariamente a sexo.
O latim, o alemão e o russo têm os gêneros masculino, feminino e neutro (e este não se refere a seres e coisas transexuais).
No sueco e no holandês, há o gênero comum (que abrange tanto masculino quanto feminino - e nem por isso torna tudo hermafrodita) e o neutro.
E no finlandês, no basco e no húngaro não há gênero nenhum (o que não quer dizer que tudo e todos na Finlândia, na Hungria e no País Basco sejam assexuados - já estive nos três e posso garantir isso).
As línguas que evoluíram do latim apenas suprimiram o gênero neutro, usando o masculino em seu lugar.
Daí dizermos "as alunas" quando nos referimos apenas a pessoas do sexo feminino e "os alunos" no caso de pessoas do sexo masculino ou de ambos os sexos (nesse "ambos" podendo ser incluídos todos os sexos atualmente disponíveis).
Não é machismo.
Assim como não é feminismo dizer "as cobras", “as onças”, "as vítimas" ou "as crianças", mesmo havendo seres do sexo masculino envolvidos..
Porém, desde que Sarney inventou essa coisa de “brasileiros e brasileiras”, tenta-se submeter o idioma à ideologia – como se confundir sexo biológico (ou psicológico) e gênero gramatical fosse equiparar salários, coibir estupros ou eliminar a violência doméstica.
Em turco não há distinção entre masculino e feminino, e nem por isso a Turquia é um exemplo de igualdade entre os sexos.
A língua se ajustará naturalmente às necessidades dos seus falantes.
Não havia por que existirem as palavras “médica”, “juíza” ou “ministra” quando a medicina, a magistratura ou os ministérios não eram acessíveis às mulheres. Essas palavras só foram criadas porque sua formação é natural ao idioma.
Já há mulheres chanceleres mundo afora, e não se inventou a palavra “chancelera” (ainda que tenhamos penado alguns anos com uma “presidenta” – que era, ainda por cima, “inocenta”).
Voltando à Concepción Company (citada lá no comecinho), “primeiro eduquemos e criemos igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, e deixemos de lado besteiras como ‘o cachorro e a cadela são o melhor amigo e a melhor amiga do homem e da mulher”.
Até porque, para fazer a coisa direito, teríamos que dizer também que
“º cachorrº é º melhor amigº dº homem trans"
"@ cadel@ é @ melhor amig@ d@ mulher trans"
"e cachorre&cadele é e melhor amigue de bissexual"
"# cachorrdel# é # melhor amig# d# intersexual"
"cachorr (ou cadel) é melhor amig d assexuad”".
Aceitam-se sugestões para a grafia do gênero fluido.
A pronúncia disso fica para uma próxima encarnação.
Fotografei do numero 167 ano XLIV setembro-dezembro 2017 do Boletm da fraternidade leiga Charles de Foucauld. Muito lindo. — com Benedito Prezia.
DEMISSÃO DE CLAUDIO DE OLIVEIRA RIBEIRO E MAGALI CUNHA.
NOTA DE INDIGNAÇÃO E REPÚDIO DO GRUPO EMAÚS
Belo Horizonte, 14 de dezembro de 2017
Nós, abaixo assinados, teólogos/as, biblistas, cientistas sociais e ambientalistas integrantes do Grupo Emaús manifestamos publicamente nossa profunda indignação diante da demissão do professor Cláudio de Oliveira Ribeiro e da professora Magali Cunha da Escola de Comunicação, Educação e Humanidades da Universidade Metodista de São Paulo (UMESP).
Indignação, em primeiro lugar, pela forma imoral de demissão simultânea de um casal da mesma instituição. Isso revela total insensibilidade para com a dignidade da família, o que deveria ser inaceitável para qualquer empresa, ainda mais para uma renomada instituição de educação cristã.
Em segundo lugar, porque conhecemos de perto a qualidade do árduo, produtivo e criativo trabalho que vêm desenvolvendo e consolidando nos últimos anos no campo das Ciências da Religião, da Teologia e da Comunicação Social, com inteiro reconhecimento dos estudantes, dos seus pares no magistério e com notável contribuição para o prestígio e reconhecimento acadêmico da própria UMESP.
Em terceiro, porque o fato revela que nossas instituições de Educação Superior claudicaram diante da avassaladora mentalidade neoliberal, que transforma a educação em mercadoria e reduz as pessoas a meros instrumentos facilmente descartáveis.
As Igrejas cristãs da América Latina, em particular a Igreja Metodista, juntamente com os movimentos populares e organizações da sociedade civil, têm uma história de luta e resistência contra as diversas formas de violência e de arbitrariedades das ditaduras e das classes dominantes. Que essa memória viva inspire uma urgente revisão desse perverso processo.
Esperamos que fatos como este sejam reconsiderados, não voltem a acontecer e sejam reprovados, com firmeza, pela sociedade e pelas Igrejas cristãs.
Assinam essa manifestação:
1. Leonardo Boff – Teólogo, escritor, assessor dos movimentos populares e das CEBs, membro do Comitê da Carta da Terra, Petrópolis, RJ.
2. Frei Betto – Frade Dominicano, escritor, assessor dos movimentos populares e das CEBs, São Paulo, SP.
3. José Oscar Beozzo – Padre, historiador e coordenador geral do Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular/CESEEP, São Paulo, SP.
4. Marcelo Barros – Monge Beneditino, teólogo, biblista, assessor dos movimentos populares e das CEBs, coordenador latino-americano da Associação Ecumênica de teólogos/as do terceiro mundo – ASETT, Recife, PE.
5. Luiz Carlos Susin – Padre, teólogo, escritor, secretário geral do Fórum Mundial de Teologia e Libertação, Porto Alegre, RS.
6. Maria Clara Bingemer – Teóloga, escritora, pesquisadora, professora da PUC Rio, Rio de Janeiro, RJ.
7. Benedito Ferraro – Padre, assessor das CEBs, presidente do Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular/CESEEP - Teólogo PUC Campinas, SP.
8. Maria Helena Arrochellas Correa – Teóloga, diretora do Centro Alceu Amoroso Lima para Liberdade/CAALL, Petrópolis, RJ.
9. Rosemary Fernandes da Costa – Teóloga e Educadora, professora da PUC Rio, Rio de Janeiro, RJ.
10. Celso Pinto Carias – Teólogo, assessor do setor CEBs da Comissão do Laicato da CNBB, professor da PUC Rio, Rio de Janeiro, RJ
11. Aurelina de Jesus Cruz Carias – Educadora e professora da Rede Municipal de Duque de Caxias, RJ.
12. Edson Fernando de Almeida – Pastor da Igreja Cristã de Ipanema, teólogo, professor da UFJF, Rio de Janeiro, RJ.
13. Márcia M. Miranda – Centro de Defesa dos Direitos Humanos – CDDH, Petrópolis, RJ.
14. Afonso Murad – Teólogo, ambientalista, professor da FAJE, Belo Horizonte, MG.
15. Sinivaldo Tavares – Padre, teólogo, professor da FAJE, Belo Horizonte, MG.
16. Ivo Lesbaupin – Sociólogo, professor da UFRJ, ISER Assessoria, Rio de Janeiro, RJ.
17. Maria Teresa Bustamante Teixeira – Médica, professora do programa de pós-graduação em Saúde coletiva da UFJF, Juiz de Fora, MG.
18. Luiz Alberto Gómez de Sousa – Sociólogo, professor da Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro, RJ;
19. Lúcia Ribeiro de Souza – Socióloga, ISER Assessoria, Rio de Janeiro, RJ.
20. Tereza Cavalcanti – Teóloga, biblista e assessora da CEBs, Rio de Janeiro, RJ.
21. Rosileny Schwantes – Psicóloga, professora da Universidade Nove de Julho, São Paulo, SP.
22. Francisco de Aquino Júnior – Padre, teólogo, assessor das CEBs, Limoeiro do Norte, CE.
23. Alessandro Molon – Professor de Direito, Deputado Federal (Rede), Rio de Janeiro, RJ.
24. Edward Neves Monteiro de Barros Guimarães – Teólogo, assessor das CEBs, professor e secretário executivo do Observatório da Evangelização PUC Minas, Belo Horizonte, MG.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Breves do Facebook - Instituto Humanitas Unisinos - IHU