22 Dezembro 2016
"O projeto de emenda da Constituição Federal, sob nº 55, aprovado pelo Senado Federal no dia 15 deste dezembro, introduz modificações diretas e indiretas nos direitos das pessoas, criando dúvidas e gerando confusão e insegurança, especialmente entre quem não está habilitado a entender a linguagem técnica própria das nossas leis, e os efeitos que isso poderá trazer na vida de cada uma", escreve Jacques Távora Alfonsin, procurador aposentado do estado do Rio Grande do Sul e membro da ONG Acesso, Cidadania e Direitos Humanos.
Eis o artigo.
Aqui vamos salientar apenas o que coloca em risco ou até infringe parte da Constituição Federal que proíbe ser alterada ou suprimida, matéria chamada, por isso mesmo, de “cláusulas pétreas”, mas quem quiser ler, na íntegra, o que foi decidido pelo Congresso Nacional, pode acessar o site da presidência da República, clicando emendas constitucionais. O que eram projetos de emenda constitucional 241, na Câmara dos deputados, e 55 no Senado Federal agora é emenda Constitucional 95. Ela modifica parte dos artigos do Ato das disposições constitucionais transitórias, acrescentando outros, sob a denominação genérica de instituir um novo regime fiscal (NFR) ao Brasil.
O que mais chama a atenção é o fato de ela prever uma rigorosa contenção de despesas necessárias à manutenção e ampliação de serviços públicos, indispensáveis para garantir direitos humanos fundamentais sociais, como educação e saúde, por exemplo, durante um período de 20 anos. Mesmo com algumas ressalvas, trata-se de uma aposta aleatória lançada sobre o futuro do país, na qual a “segurança jurídica”, tão valorizada pelo capital e o mercado, vai funcionar a custa de uma “austeridade” (palavra solene, em voga, para justificar o pacote com eco moral sedutor), a custa da insegurança daqueles direitos humanos individuais e sociais, sabidamente dependentes de recursos públicos.
Advertências muito importantes têm sido publicadas em vários sites, sobre as consequências antisociais dessa modificação constitucional. Uma delas veio de dentro do próprio Senado Federal, ainda quando a emenda aprovada pela Câmara tinha chegado àquela Casa, em novembro passado. Ela é assinada por Ronaldo Jorge Araujo Vieira Junior, Consultor Legislativo do Senado Federal na área do Direito Constitucional, Administrativo, Eleitoral e Partidário. Mestre em Direito e Estado pela Universidade de Brasília (UnB). Ex-Consultor-Geral da União da Advocacia-Geral da União (2007-2010).
Ele lembra o artigo 60, parágrafo 4º da Constituição Federal, cuja redação é justamente a de não poder ser “objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir” a “forma federativa do Estado”, o “voto direto, secreto”, “universal e periódico”, a “separação dos poderes” e os “direitos e garantias individuais”.
O apontamento deste consultor legislativo do Senado, sustenta existir violação flagrante dessas quatro “cláusulas pétreas” inserida na PEC 55, agora já vigendo como Emenda Constitucional 95. Lembra outras leis, opiniões de vários juristas e decisões precedentes dos tribunais superiores do país, em apoio ao que afirma. Para duas dessas “claúsulas”, a do voto e a dos direitos e garantias, vale a pena transcrever-se, mesmo na ausência de todo o contexto argumentativo sustentado pelo autor, o que ele sustenta.
Sobre o direito ao voto direto, secreto, universal e periódico, lê-se: “Eliminar, como pretende a PEC nº 55, de 2016, a possibilidade de o Chefe do Poder Executivo – legitimamente eleito pelo povo, por intermédio do voto direto, secreto, universal e periódico – definir o limite de despesas de seu Governo significa retirar-lhe uma de suas principais prerrogativas de orientação, direção e gestão”. Significa atar-lhe as mãos e impedi-lo de fixar suas diretrizes e definir suas estratégias. Em última análise, significa impedi-lo de exercer, em sua plenitude, o mandato que lhe foi conferido pela soberania popular, prevista no parágrafo único do art. 1º da CF. Reiteramos que, aprovada a PEC, essa circunstância limitadora da atuação do Chefe do Poder Executivo federal vigorará por 20 (vinte) exercícios financeiros, que correspondem a 20 (vinte) anos, que por sua vez correspondem a 5 (cinco) mandatos presidenciais e a 5 (cinco) legislaturas do Congresso Nacional.
Ou seja, vamos votar para cinco presidentes e cinco deputados federais de nossa escolha, nos próximos vinte anos, com poderes limitados a insignificância, pois, em matéria de recursos para custear serviços públicos essenciais ao exercício de direitos, pouco ou nada poderão decidir.
Bem sobre os direitos e garantais individuais, afirma o consultor legislativo do Senado, com base em pronunciamento anterior (ainda do mês de abril deste ano) da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), disponível aqui, quando a atual emenda 95 ainda tramitava na Câmara dos deputados como projeto de emenda constitucional PEC 241:
“O governo faz manobras para aprovar rapidamente a emenda, sem qualquer debate prévio e amplo com participação da população, que vai sofrer diretamente seus efeitos. Investimentos em áreas essenciais – saúde, educação e assistência social – estarão limitados caso referida emenda constitucional seja aprovada, e nenhum debate é proposto para que a sociedade civil possa ter conhecimento do alcance dessa reforma e das suas consequências.
O mero reajuste pela inflação não é suficiente para suprir a despesa gerada pelo simples aumento da população que, em situações de crise econômica, depende ainda mais dos serviços públicos.
É pouco provável, diante de uma situação como essa, que todo o tumulto político provocado por essa emenda, não vá buscar saída no Supremo Tribunal Federal, o que já ameaçavam fazer, no mesmo dia de promulgação da emenda a Associação dos Juízes Federais, Associação dos Magistrados Brasileiros e a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, como noticiou o site Valor Econômico.
Manifestações de protesto, promovidas por movimentos populares de defesa dos direitos humanos fundamentais violados pela, agora, emenda 95 da Constituição Federal, estão se confrontando com a força policial em todo o país, impedindo o trânsito, ocupando escolas e outros prédios públicos, às vezes chegando a algum excesso de violência, não desejado pelas/os organizadores/as.
Nada disso, porém, se compara com a violência imposta pela dita emenda 95 da Constituição Federal, procurando ampliar os efeitos do golpe de Estado sofrido pela democracia e a nação, por mais vinte anos. Não se pode perder a esperança de que não alcançará sucesso”.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
A PEC 241/55 e seus efeitos para quem não entende o juridiquês - Instituto Humanitas Unisinos - IHU