27 Outubro 2016
Nesta terça (25), no mesmo dia em que indígenas realizaram uma marcha em Brasília, cerca de 150 indígenas de diversas aldeias Munduruku da região do Médio Tapajós manifestaram-se no município de Itaituba, no oeste do Pará, exigindo a revogação imediata da Portaria 1907/16 do Ministério da Saúde, que retira a autonomia da gestão orçamentária e financeira da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), responsável pelo subsistema que garante a atenção diferenciada à saúde das populações indígenas.
A reportagem é de Tiago Miotto, publicada por Conselho Indigenista Missionário-Cimi, 26-10-2016.
Com a portaria 1907/16, publicada pelo Ministério da Saúde sem qualquer consulta aos povos indígenas, os 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) dependeriam da decisão de Brasília para realizar gastos simples e cotidianos, como transporte e equipamentos.
No Tapajós, assim como em diversas outras regiões da Amazônia, há muitas áreas indígenas de difícil acesso, que exigem que se alie o transporte via carro e barco – algo que a Portaria 1907 tornaria extremamente difícil e burocrático.
Pela manhã, os indígenas ocuparam o DSEI Tapajós, responsável pelo atendimento da região, a sede local da Funai, a Câmara de Vereadores de Itaituba e, por fim, trancaram o porto que faz a ligação da rodovia Transamazônica entre Itaituba e Miritituba, interrompendo um fluxo bastante utilizado para o transporte de cargas. A balsa permanece trancada na noite desta terça, e os Munduruku afirmam que só liberarão o trajeto após a revogação da portaria.
Servidores do DSEI também manifestaram-se junto aos indígenas, por entenderem que suas condições de trabalho serão precarizadas com a nova medida. Segundo uma enfermeira que trabalha há doze anos com os povos indígenas no Tapajós e que prefere não se identificar por medo de represálias, a portaria 1907/16 prejudica também os próprios servidores da Sesai.
“Antes da Sesai, nós vivíamos precariamente, não tínhamos condição nenhuma de trabalho, víamos os índios morrerem na nossa frente sem poder fazer nada. Hoje, com a secretaria especial, não está do jeito que deveria, mas melhorou muito. Essa portaria, na verdade, ela extingue a Sesai e coloca o DSEI novamente ligado ao Ministério [da Saúde] – pior do que na época da Funasa. Então, nós vamos voltar a ver índio morrer, porque não vamos poder tirar eles de área para levar para o SUS, vamos ver índio passar fome, porque até uma saca de farinha terá que ser autorizada pelo ministro, e nós, servidores, podemos voltar a ficar meses sem receber”, critica a enfermeira.
A exemplo da forma como os movimentos sociais vem tratando a PEC 241, que pretende congelar investimentos sociais da União por 20 anos, os Munduruku referiram-se à Portaria 1907/16 como “Portaria da morte”, considerando as consequências desastrosas que a portaria pode ter para estes povos. Cartazes em português e Munduruku também afirmavam a luta “pela autonomia da Sesai” e “Salve a saúde indígena”.
“Vamos ficar aqui até derrubar a portaria 1907, que está tirando totalmente a autonomia dos DSEI e da Sesai. Somos contra isso, sabemos que o Ministério da Saúde não tem condições de trabalhar com a saúde dos povos indígenas do Brasil. Então, nós queremos a revogação e a volta da autonomia dos Distritos e melhorar daqui para a frente, e não voltar para trás”, afirma Sandro Waro Munduruku, presidente do Condisi do DSEI Tapajós.
No Alto Tapajós, no município de Jacareacanga, os Munduruku também estão mobilizados, em luta contra a Portaria 1907 e contra a PEC 241.
O Ministério da Saúde havia informado ontem (24), via nota, que a portaria 1907/16 seria revogada. Nesta terça, outra portaria foi publicada, estabelecendo a autonomia e a descentralização da Sesai, mas sem revogar a portaria anterior, ou seja, sem efeito prático. Os povos indígenas seguem mobilizados em todo o país até que a autonomia da Sesai e dos DSEIs seja efetivamente restabelecida.
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No Pará, Munduruku mobilizam-se e exigem revogação da Portaria que desmonta saúde indígena - Instituto Humanitas Unisinos - IHU