Por: André | 04 Março 2016
O cardeal George Pell,“ministro” da Economia do Vaticano, qualificou nesta quinta-feira de “desastrosa coincidência” o fato de que cinco padres abusassem de menores na mesma época na cidade australiana onde trabalhava, e as vítimas o acusaram de mentir. Pell prestou declaração pela quarta e última vez à Comissão Real para uma Resposta Institucional aos Abusos Sexuais de Menores.
A reportagem é de Jesús Bastante e publicada por Religión Digital, 03-03-2016. A tradução é de André Langer.
Devido aos seus problemas cardíacos, o ex-bispo de Melbourne e depois de Sidney, de 74 anos, declarou pelo quarto dia consecutivo por videoconferência de um hotel de Roma. Submetido às perguntas dos advogados que representam as vítimas de abusos cometidos por membros do clero, desmentiu ter cometido nenhuma falta.
A comissão centra-se, atualmente, na situação nas cidades de Ballarat e Melbourne, no estado de Vitória, onde o cardeal Pell cresceu e trabalhou, nas décadas de 1970 e 1980, quando padres pederastas abusavam de dezenas de vítimas.
O eclesiástico, que revelou que o Papa Francisco recebe diariamente um resumo das audições, afirmou que ao menos dois arcebispos e outros membros da hierarquia católica o haviam enganado ao omitir informações sobre a situação. Falou de um “mundo de crimes e ocultações”.
À pergunta de se tinha a impressão de ser vítima de uma caça às bruxas, o cardeal Pell respondeu nesta quinta-feira: “Nunca falei nada semelhante, mas devo confessar que a ideia me passou pela cabeça”.
O fato de que ao menos cinco padres pederastas agiram na mesma época em Ballarat nos anos 1970 é uma “desastrosa coincidência”, acrescentou.
No entanto, reconheceu que um rapaz se queixou a ele em 1974 do irmão Edward Dowlan. O menor “mencionou em uma conversa” que o irmão Dowlan “se comportava mal” com os menores, disse. Então evocou o tema com o capelão do colégio e nada mais.
“Distante 40 anos dos fatos, diria certamente que deveria ter feito mais”, admitiu quando lhe fizeram ver que Dowlan, agora preso, abusou de dezenas de meninos.
O eclesiástico também foi interrogado sobre o caso de Gerald Ridsdale, padre pederasta reincidente múltiplo, com o qual o cardeal conviveu durante algum tempo e também trabalhava em Ballarat.
George Pell voltou a desmentir mais uma vez que teria tentado comprar o silêncio do sobrinho de Ridsdale, David, como este diz. David Ridsdale foi vítima de abusos por parte do seu tio.
O cardeal Pell estimou que era um “dever cristão” acompanhar Gerald Ridsdale no processo que culminou com a sua condenação por mais de cem acusações de abusos sexuais de menores.
Também negou ter estado a par das atividades pederastas de Ridsdale, e voltou a desmentir que um dia teria dito a um padre: “Já, já, creio que Gerry volta a atrair rapazes”. Esta acusação é “falsa”, espetou.
No começo das audiências, o cardeal explicou que os crimes de Ridsdale não tinham “maior interesse para ele”, mas nesta quinta-feira voltou atrás. “Recordo ter falhado completamente esta sequência. Lamento as palavras empregadas. Estava muito perturbado e respondi mal”.
Um grupo de vítimas que viajou para Roma para assistir à declaração garantiu que não acreditam nele. “Pensamos que mentiu para nós e nos enganou”, declararam em um comunicado.
O interessado negou estar mentindo. “Diria que é totalmente falso e não se baseia em nenhuma prova”. Reconheceu que os relatos das vítimas eram horríveis.
“Uma das coisas que lamento como padre católico são os danos que estes crimes infligem à fé dos sobreviventes, das vítimas, de seus amigos e famílias, e de maneira mais geral à sociedade. Deploro isso”.
Stephen Woods, outra vítima de Ridsdale e do religioso pederasta Robert Charles Best enquanto estudava na Escola St. Alipius, disse em uma coletiva de imprensa em Roma que ele e outros sobreviventes “tinham a esperança de que se fosse mais longe em relação aos constantes acobertamentos”.
Woods arremeteu contra Pell por considerar que a presença de tantos pederastas em Ballarat foi uma “coincidência” e reforçou a ideia de que os padres pederastas “claramente conspiraram”. “Queremos a intervenção do Papa. O Papa deseja reunir-se conosco e ouvir as nossas preocupações, ouvir sobre a dor de milhares de vítimas na Austrália”, apontou Woods, membro do coletivo de familiares e vítimas que finalmente enviará uma comitiva para reunir-se com Pell nesta sexta-feira.
A comissão foi constituída em 2013 para investigar acusações de pederastia em igrejas, escolas, orfanatos ou associações de jovens, após mais de 10 anos de pressões. A comissão já ouviu quase 5 mil vítimas.
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Pell acredita que foi uma “desastrosa coincidência” o fato de que cinco padres abusassem de crianças em sua diocese - Instituto Humanitas Unisinos - IHU