08 Abril 2015
Por mais dolorosa que seja na Alemanha a problemática dos divorciados em segunda união ou da homossexualidade, da transexualidade ou da intersexualidade, o fato de se limitar a "problemas candentes" esconde outros âmbitos temáticos que são angustiantes. O papa alertou, a esse respeito, contra uma "colonização ideológica".
A opinião é do teólogo jesuíta Andreas R. Batlogg, editor-chefe da revista Stimmen der Zeit e diretor científico dos Karl-Rahner-Archivs. O artigo foi publicado no sítio da revista Stimmen der Zeit, 02-04-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
O tempo passa rápido: metade do ano já passou. Há seis meses, no dia 19 de outubro de 2014, terminava a Assembleia Geral do Sínodo extraordinário dos bispos ("Os desafios pastorais da família no contexto da evangelização"): em seis meses, no dia 4 de outubro de 2015, começará o Sínodo ordinário dos bispos ("A vocação e a missão da família na Igreja e no mundo contemporâneo").
Já foi um progresso enorme que os bispos – encorajados pelo papa – discutissem livremente ("sem hesitação, sem pavidez") e não dissessem apenas aquilo que os outros (presumivelmente) queriam ouvir: a Igreja em busca de uma nova cultura de debate, um caminho fatigante de construção coletiva do consenso e do modo de se chegar a uma decisão, com todas as diversas socializações, tanto culturais quanto teológicas.
Foi atentamente notado que a Relatio Synodi piorou com respeito ao relatório intermediário, não só no tom, mas também no conteúdo. Para o Papa Francisco, as tensões eram normais: "Essa é a Igreja [...]. Não olha para a humanidade de um castelo de vidro para julgar ou classificar as pessoas".
Em uma coletiva de imprensa, o cardeal Reinhard Marx, presidente da Conferência Episcopal Alemã, declarou: "O papa quer que as Igrejas locais se ocupem dessas questões". O pontífice havia dito: "Agora temos ainda um ano para amadurecer, com verdadeiro discernimento espiritual, as ideias propostas e encontrar soluções concretas para tantas dificuldades e inúmeros desafios que as famílias devem enfrentar; para dar resposta aos numerosos motivos de desânimo que envolvem e sufocam as famílias".
O Sínodo do ano passado, portanto, é uma tarefa a ser desdobrada em um "caminho sinodal" – uma obra na qual desvios e derivas não devem surpreender. A pura injunção de tomadas de posição doutrinal-disciplinares como a Humanae vitae (1968) ou a Familiaris consortio (1981) não é mais suficiente.
Isso não faz justiça à realidade dos mundos relacionais e familiares plurais hoje e simplesmente aumenta o fosso dramático entre doutrina e vida. Princípios como a paternidade e a maternidade responsáveis são tão bons quanto é deplorável o fato de que a questão do método se torna um tema tabu.
Trata-se de uma mudança fundamental de perspectiva para a Igreja, já profeticamente indicada na exortação apostólica Evangelii gaudium (novembro de 2013), como também expressou a consultora matrimonial Ute Eberl, segunda participante alemã no Sínodo: "Uma Igreja que quer ser para os homens se inclina. Inclina-se para se dar conta das realidades da vida – e não olha em primeiro lugar com as lentes do direito canônico. Não se trata de se adequar ao mundo, mas de estar junto com as pessoas".
Como são aproveitados os meses que restam para um "discernimento espiritual"? É realista pensar que não deve haver "perdedores" e "vencedores", quando temos diante dos nossos olhos várias ações e batalhas?
As dioceses alemãs disponibilizaram nos seus sites o novo questionário romano apenas no início de fevereiro: uma participação tardia, bastante formal? Pedia-se para responder até o início, a metade ou o fim de março, e as respostas, depois, seriam enviadas juntas para Roma, onde será elaborado o Instrumentum laboris.
Quem perde de vista as pessoas concreta se concentra apenas sobre si mesmo (a "autorreferencialidade") e se esconde atrás de uma doutrina que não serve para a vida ou atrás das palavras de Jesus, que, como se sabe, não se encontram protocoladas nos arquivos vaticanos.
Aqui, há e houve insinuações que mostram como dominam, até agora, entre os bispos, medo e submissão, como foi pouco praticada a colegialidade, como pesa negativamente o centralismo romano. O Sínodo revelou que também há um problema episcopal.
Em uma entrevista à revista jesuíta America, o cardeal Marx salientou que se trata de uma questão de atualização, de expressar as demandas da Igreja em uma linguagem que possa ser compreendida.
A Igreja tem sido muitas vezes sentida como julgadora. Considerar o homem na sua completude exclui depreciações e exclusões, mas também uma atenção exclusivamente pastoral.
As pessoas não querem ser tratadas como objetos, mas querem ser levadas a sério na sua complexa realidade de vida – também na multiplicidade das possibilidades sexuais que não devem ser apostrofadas como "variantes da criação", que simplesmente devem ser toleradas, mas, no fim das contas, deficitárias.
A sexualidade não pode ser reduzida a reprodução. Sentimentos, afeto, decisões de vida são igualmente importantes – caso contrário, por que haveria tantas separações? O fato de se ater à definição de família como pai-mãe-filho(s) como único modelo corresponde à realidade da família hoje?
A obstinada defesa da "doutrina imutável" não vê que há também uma história do desenvolvimento dos dogmas. Não se trata de "esconderijos pastorais" ou de peculiares construções teológicas, mas de ajudar as pessoas a serem habilitadas a conduzir uma "boa vida" como cristãos.
Um Sínodo não deve levar em consideração apenas o modelo de uma "família ideal". Caso contrário, não leva em conta ou remove outros problemas, próprios dos filhos: órfãos de divórcio, crianças trabalhadoras, crianças prostituídas ou crianças escravas.
Por mais dolorosa que seja na Alemanha a problemática dos divorciados em segunda união ou da homossexualidade, da transexualidade ou da intersexualidade, o fato de se limitar a "problemas candentes" esconde tais âmbitos temáticos que são angustiantes, não só fora da Europa. O papa alertou, a esse respeito, contra uma "colonização ideológica".
Em geral, o objetivo deve ser, como apontado, abrir portas, para ajudar as pessoas que, por causa do direito canônico, certamente não formalmente mas de facto, estão excluídas. Caso contrário, a Igreja desperdiça o resto da credibilidade em problemas de família – mesmo tendo muito a dizer, como na defesa da vida.
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Entre os dois Sínodos. Artigo de Andreas R. Batlogg - Instituto Humanitas Unisinos - IHU