12 Novembro 2014
Há alguns dias, durante a audiência, o bestiário do Papa Bergoglio se enriqueceu com uma nova espécie de “bispo-pavão”. Aquele que “faz de tudo” para obter o episcopado “e quando o alcança não o assume, brinca de pavão, vivendo somente para a sua vaidade”. Também pra Dom Severino Dianich, sacerdote e teólogo,80 anos e apaixonado, a questão dos bispos se transformou num banco de provas decisivo para o tempo em que estamos vivendo. Um tempo onde, de acordo com seu pensamento, também a reflexão sobre a natureza e a função da Igreja deve abandonar as plataformas mortas nas quais parou ao longo do tempo. A começar pelos slogan’s já exauridos da chamada “Nova Evangelização”.
A entrevista é de Gianni Valente, publicada pelo “Vatican Insider”, 10-11-2014. A tradução é de Ivan Pedro Lazzarotto.
Hoje no mundo, os bispos já são mais de 5.000. Convocar um concílio seria impossível até mesmo por uma questão logística.
“Porém os bispos responsáveis por uma circunscrição eclesiástica são menos de 2.700. E os bispos sem diocese são figuras que em todo o primeiro milênio da Igreja ninguém teria imaginado que fosse possível. Até que não sejam corrigidas tais distorções, prevalece a ideia de que a nomeação episcopal seja como uma homenagem profissional.
Eis a entrevista.
O que se pode fazer para desmentir tal impressão?
“Como primeira coisa devem ser impostos limites para transferências de bispos. Especialmente na prática que parece inconcebível de ser transferido de uma grande sede para outra menor. Isso é a negação do serviço episcopal. No primeiro milênio o bispo carregava o anel porque casava com a sua Igreja”.
E o mecanismo de seleção? Também este deve ser revisado?
“Também na Igreja ocidental seria recuperada a prática pelas quais um bispo é como um filho gerado e nascido das Igrejas locais, como ocorre nas Igrejas do Oriente, incluindo as igrejas católicas. Não digo que seria a cura de todos os males. Mas é certo que teríamos bispos mais sensíveis ao clima espiritual e cultural do seu povo. Seriam evitadas as figuras dos bispos que caem de paraquedas nas comunidades, que buscam adquirir influência ostentando os próprios contatos com a Cúria romana, como se fossem funcionários periféricos de um império”.
A questão da reforma da Igreja assume papel fundamental. Mas de fato não são claros quais os critérios que deveriam movimentá-la.
“Qualquer perspectiva nova é válida para ser proposta, devemos nos perguntar antes de mais nada, se estamos de acordo com os objetivos pelos quais a Igreja existe: comunicar a todos a experiência da fé em Cristo. Precisa partir deste ponto”.
Explique-nos.
Por 1.500 anos, nas mais diversas áreas do mundo, a transmissão da fé passa de pai para filho, em família. Existiam os missionários pelas terras onde o Evangelho ainda não tinha chegado. Mas pensava-se na vida “normal” da Igreja sem os missionários. Este quadro mental imprimiu a toda a estrutura eclesiástica, e também a legislação canônica, até os dias de hoje. Mas agora a velha sociedade cristã, aquele onde a evangelização era obviamente a transmissão de pai para filho, não existe mais. Simplesmente não existe mais. Também na Itália, que é considerada uma “rocha forte”, os batismos das crianças já se reduziram em 70%. Somente três ou quatro famílias, a cada dez, nascem sob o sacramento cristão do matrimônio. É fácil prever que cada vez menos crianças receberão o batismo.
Mas exatamente por isso, há décadas, se fala da “Nova Evangelização”. Foi criado especialmente um novo dicastério Vaticano.
A Nova Evangelização, não somente um adjetivo, coincidiu muito com a ideia de poder voltar atrás. Uma réplica, embora atualizada, daquilo que foi a grande cultura da Restauração, depois da Revolução francesa. Essa se expressou como uma ideia de recristianizar as sociedades. As ideias e os projetos da Nova Evangelização se declinaram mais no âmbito do relacionamento da Igreja com a sociedade, a cultura, as nações, do que com as pessoas. A prioridade era de novamente dar vigor a influência que a Igreja ainda pode exercitar sobre os contextos sociais e culturais que a cerca, como era antigamente. Mas eu acredito que não exista possibilidade de voltarmos atrás. Então o problema da evangelização é colocado como um novo problema. E implica com as estruturas da Igreja renovada. Porque todas as instituições eclesiásticas são funcionais ao velho sistema, e correm o risco de se transformarem em um obstáculo e não num auxílio para a evangelização.
O que o senhor sugere?
Precisamos observar a dinâmica própria e originaria da comunicação da fé. Aquela que se verificou no início, quando os fiéis comunicavam a própria experiência de fé aos seus vizinhos e parentes que não acreditavam na convivência concreta de cada dia. Ora, uma determinada forma prevalente no corpo eclesiástico e acaba despreparada para reconhecer essa simples dinâmica, e a se colocar ao seu serviço. E ainda, a própria comunicação da fé de pessoa a pessoa, própria da Igreja nos seus anos iniciais, parece mais consoante com a condição em que vivemos.
Por que razões?
Nos profundos processos de secularização, a cultura prevalente também tirou fora de modo prepotente o indivíduo com sua liberdade, conduzindo-o ao isolamento e ao solipsismo. O sentido do “coletivo” é bem menos percebido. Assim, seria fácil redescobrir que a estrada mais consoante para transmitir a fé em Jesus é o contato direto, de pessoa a pessoa. Que não pode ser contornado. E ainda ressalta que a própria dinâmica da transmissão da fé é sacramental, e não pedagógica ou propagandística. A vida de graça é transmitida através dos sacramentos. E os sacramentos não são celebrados a distância, nem por delegação, mas somente nos encontros, ainda mais, no contato entre as pessoas.
No seu artigo “A Igreja contra a sua reforma”, o senhor mostra que seguidamente a forma de exercitar o sacerdócio não sugere a fonte sacramental da vida da Igreja.
A relevância do sacerdócio ainda vem misturada mais com as declarações solenes dos princípios que não falam sobre a dinâmica sacramental da Igreja. Sempre me perguntei como nunca uma Encíclica papal, seguidamente elaborada por colaboradores e assinada pelo Papa numa mesa, foi considerada um ato papal mais importante que não uma homilia pronunciada no interior da liturgia eucarística, ali onde a fonte sacramental da vida da Igreja se mostra na sua forma mais elevada. Papa Francisco, com as suas homilias diárias em Santa Marta e a sua divulgação, parece ter entendido este ponto crucial. O seu estilo de governo exercita a autoridade no leito da caridade pastoral. E dessa forma, através de uma escolha simples, se evidencia também a natureza essencialmente sacramental do ministério ordenado.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Dianich: eis para que serve a reforma da Igreja - Instituto Humanitas Unisinos - IHU