25 Junho 2014
Por que navegar pelos mares tirando lixo com embarcações poluentes se uma simples barreira pode fazer o trabalho, aproveitando o próprio movimento dos oceanos? Foi com uma pergunta assim que Boyan Slat, um holandês de apenas 19 anos, criou um projeto que tem a ambição de limpar os mares do planeta. O plano começa na região conhecida como Grande Depósito de Lixo do Pacífico, onde se concentram milhares de toneladas de plásticos.
A reportagem é de Guilherme Justino, publicada pelo jornal Zero Hora, 24/06/2014.
Sem apoio financeiro de governos ou aporte de instituições para tentar cumprir o objetivo, Boyan criou a fundação The Ocean Cleanup, que agora tenta arrecadar US$ 2 milhões por meio de financiamento coletivo – e já atingiu 37% da meta.
Concentrando-se no problema dos plásticos, causadores de transtornos à vida de aves, mamíferos e peixes – que podem chegar à cadeia alimentar humana, já que os animais acabam ingerindo substâncias tóxicas –, o jovem imaginou que uma série de barreiras flutuantes seria capaz de aproveitar as correntes oceânicas para bloquear o lixo encontrado nas águas. Todos esses detritos, de difícil acesso para qualquer veículo aquático, seriam reunidos de forma natural, permitindo uma extração posterior eficiente.
A principal vantagem do método, segundo o jovem, está em permitir que os mares sigam seu fluxo normal, sem trazer prejuízos à vida marinha e, ainda assim, juntando o material indesejável em um único local para permitir sua retirada. Em vez de ir até o plástico, as barreiras deixam que o plástico vá até elas e, a partir dali, passe a receber um destino adequado. Com esse método, porém, só é possível reunir o material que fica mais próximo da superfície, nos primeiros 3 metros de profundidade.
– Infelizmente, o plástico não vai embora sozinho. Eu me perguntei: “por que não podemos limpar isso tudo?”. Então pensei que, ao distribuir um sistema de longos “braços flutuantes” pelo mar, os oceanos poderiam basicamente fazer a própria limpeza – explica Boyan.
As primeiras doações, feitas a partir de abril de 2013, viabilizaram a criação The Ocean Cleanup e os estudos iniciais sobre o projeto, que contam com contribuições voluntárias de pesquisadores. Com as etapas fundamentais concluídas, chegou a hora de colocar em prática. O próximo passo é pôr em funcionamento uma plataforma-piloto para a realização de testes em até quatro anos, antes da implementação total do projeto. A arrecadação para essa nova etapa começou em 3 de junho, com o objetivo de obter US$ 2 milhões em cem dias.
Em um evento no início do mês em Nova York para apresentar a ideia, Boyan mostrou os resultados de um estudo de viabilidade. Em 530 páginas, o relatório procura mostrar que o conceito, divulgado pelo jovem desde o ano passado, consiste em um método viável para a remoção de detritos da mancha de lixo entre o Havaí e a Califórnia, onde correntes marinhas se encontram, concentrando toneladas de plástico e outras substâncias poluentes.
Essa “ilha de lixo” fica distante da costa, dificultando sua retirada e a responsabilização de algum país – já que muitos são banhados pelo oceano e nenhum fica, de fato, encarregado da área.
Outro obstáculo para a limpeza dessa mancha é que as águas ali são pouco transitadas pela navegação mercantil e turística, criando assim um problema que incomoda principalmente ecologistas e cientistas. A placa de sujeira existe há muitos e muitos anos, mas foi descoberta somente em 1997.
A própria existência de depósitos involuntários de lixo como esse no oceano dificulta uma solução. Uma expedição programada para 2012 fracassou por conta de incidentes causados por detritos plásticos, e um explorador francês partiu rumo ao desconhecido no ano seguinte apenas para entender o fenômeno. Na semana passada, o chefe da diplomacia americana pediu o desenvolvimento de uma estratégia global.
– Como seres humanos, não há nada que compartilhemos tão completamente quanto o oceano que cobre cerca de três quartos do nosso planeta, afirmou o secretário de Estado americano, John Kerry, ao abrir uma conferência sobre o tema que reuniu chefes de governo e ministros de 80 países.
“Acreditamos que é possível”
Boyan Slat, fundador da The Ocean Cleanup, mergulhava na Grécia quando viu mais plástico ao seu redor do que peixes. Decidiu que limparia parte do Pacífico. A entrevista é de Guilherme Justino, publicada pelo jornal Zero Hora, 24/06/2014.
Eis a entrevista.
Como você decidiu agir para combater a poluição?
Tinha 16 anos quando percebi esse problema sobre a poluição por plásticos. Fiz um projeto na escola e, a partir daí, isso saiu de controle, eu não consegui mais parar de pensar no assunto.
Você ouviu pessoas dizerem que uma solução assim seria impossível?
Percebi que muitas pessoas mencionavam que era impossível, mas, ao mesmo tempo, não havia qualquer pesquisa para provar essa afirmação, apenas gente dizendo que não poderia ser feito. Decidi ver por mim mesmo, e desenvolvi esse conceito há dois anos.
Quais são os maiores obstáculos para pôr a ideia em prática?
Há um ano e meio, tudo estava muito parado: não havia financiamento, apenas o dinheiro do meu bolso. Foi um período difícil, mas, em março de 2013, o conceito se tornou viral e passamos a receber apoio. Há alguns desafios óbvios como descobrir se a estrutura consegue suportar tempestades ou como mantê-la no lugar. Esse tem sido nosso foco desde o ano passado.
Também precisamos nos preocupar com o transporte (se o navio tem de ser registrado em algum país específico, por exemplo), se isso não interferiria no tráfego marítimo, e investigamos se o conceito não faria mesmo mal ao ambiente. O destino dado ao plástico foi outra preocupação, e descobrimos que o material pode ser transformado em óleo ou aproveitado em outros produtos. Tivemos muitos desafios, mas identificamos os problemas, inclusive com a ajuda de críticos ao projeto, e acreditamos que é possível colocar tudo em prática.
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O jovem que quer limpar os mares - Instituto Humanitas Unisinos - IHU