14 Janeiro 2014
Wunibald Müller é teólogo, psicólogo e diretor da Recollectio-Hauses, uma instituição da abadia beneditina de Münsterschwarchach, que é sustentada financeiramente por diversas dioceses. Suas atividades se direcionam a padres, religiosos e colaboradores eclesiais em situação de crise pessoal e profissional. O psicoterapeuta católico Wunibald Müller não vê nenhuma contradição entre a homossexualidade e uma vocação presbiteral – desde que o padre viva de maneira celibatária. Müller fala na entrevista do coming-out do ex-jogador de futebol Hitzlsperger.
A entrevista foi publicada no sítio www.domradio.de, 09-01-2014. A tradução é de Benno Dischinger.
Eis a entrevista.
Uma pessoa admite abertamente um aspecto íntimo de si. Ter-se-ia esperado que o coming-out de ex-jogador de futebol provocasse tanta celeuma?
Verdadeiramente não. Eu pensava, depois que políticos e ministros haviam revelado sua homossexualidade, que isso não provocasse mais tão grande sensação.
Que significado tem então esta celeuma midiática: percebe-se homofobia na sociedade?
Evidentemente sim, pelo menos sutil. Porque, por exemplo, depois que um ministro do exterior ou um político em função fizeram coming-out, se pode pensar que se trate de algo a que a população reaja mais tranquilamente. Mas, evidentemente ainda há uma sutil homofobia.
Homofobia significa, por exemplo, que as pessoas tem um medo irracional de entrar em contato com os próprios impulsos homossexuais. Ou então, que vejam a família colocada em perigo. Ou então, em contexto teológico: a convicção que a homossexualidade não esteja em harmonia com a ordem da criação. Ainda há, portanto, estas sutis reservas. Se, por exemplo, se pensa no carnaval, quando são feitos comentários sobre o ministro do exterior homossexual, também isto está um tanto no limite. Aqui já se entende que muitos ainda pensam de maneira muito grosseira, estúpida e primitiva sobre a homossexualidade.
Também não poderia ser o fato de que se tratava precisamente de um jogador de futebol ter suscitado tal eco?
Naturalmente, porque precisamente um famoso futebolista é muito idealizado e é chato por em relação a homossexualidade com uma pessoa tão idealizada. Ainda mais se é um esportista: nele se concentra tudo o que se atribui à virilidade, coisa que com frequência não se consegue conciliar com a homossexualidade.
Depois da Jornada Mundial da Juventude no Brasil, no verão passado, o Papa Francisco havia dito: “Se uma pessoa é homossexual e procura o Senhor e tem boa vontade, quem sou eu para julgar?” O que significa isto para a teologia e para a doutrina da Igreja?
Significa que sempre, também perante os homossexuais, antes de tudo se deve ver a pessoa e que não se deve reduzir a pessoa homossexual à sua homossexualidade. Mesmo sabendo que naturalmente a homossexualidade representa uma parte importante de sua vida. Significa, por exemplo, que a Igreja se expressa muito fortemente a favor de relacionar-se com respeito e amizade com as pessoas homossexuais. E que a uma pessoa homossexual deve ser oferecido respeito e amizade exatamente como a uma pessoa heterossexual. Isto significa, fundamentalmente que poderia levar naturalmente a determinadas consequências, mas eu não sei naturalmente se a Igreja chegaria a tanto.
A discrição do Papa Francisco durante a conferência de imprensa no avião já havia provocado certo movimento midiático. Mas, então é possível para um padre que vive de maneira celibatária admitir a própria homossexualidade?
Efetivamente deveria ser possível que um padre que vive de maneira celibatária possa dizer que sua tendência sexual é homossexual. De fato a Igreja distingue ela própria entre orientação homossexual e comportamento homossexual e diz que a orientação homossexual em si é, sim, objetivamente desordenada, mas que é algo que no fundo não se deve esconder. Acho que seria bom que os padres pudessem admitir com naturalidade, mais abertamente de quanto no momento não ocorra, ter uma orientação homossexual e viver de maneira celibatária. Coisa que é possível para quem é heterossexual e padre.
Mas, a seu ver, por que os padres não o fazem?
Porque, naturalmente, agora como anteriormente, têm medo. O problema da homofobia, naturalmente, também na Igreja é muito forte. Têm medo que o povo possa tratá-los como pessoas de segunda categoria, têm medo de ser postos de lado. Medo que uma parte importante de si mesmos possa levar outras pessoas a ter um comportamento de reserva.
Você se ocupou longamente deste argumento. Enquanto ainda era estudante já se ocupara com a homossexualidade na Igreja. Como vive este debate nos últimos anos? Mudou alguma coisa?
O Papa chega a falar numa conferência de imprensa... Claramente, usou a palavra “gay”, o que já significa que é, por si, aberto sobre o tema da homossexualidade. Creio que isto vá juntamente com o fato que na Igreja se possa discuti-lo mais abertamente. Também pode levar ao fato de que um número sempre maior de padres homossexuais tenham a coragem de admitir sua homossexualidade, não tenham mais aquele medo que existia antes e que os impediu de admitir uma parte importante de si mesmos.
Pensa, então, que este debate prosseguirá e que a agitação midiática não será superada no decurso de duas semanas?
A agitação midiática passará, mas o debate continuará. Esperamos que leve a considerar a homossexualidade como algo natural, a propósito do qual talvez não se deva mais agitar-se tanto. Quanto mais se conseguir fala de homossexualidade de maneira normal, menos ela será considerada um enorme problema.
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“É algo normal” – Wunibald Müller sobre homossexualidade. A Igreja e o caso Hitlsperger - Instituto Humanitas Unisinos - IHU