15 Fevereiro 2013
Joseph Ratzinger sai. O seu pontificado se rompe contra a barreira da idade, da fraqueza física, da incapacidade de continuar governando uma comunidade de mais de um bilhão de fiéis. Foi um "raio em céu sereno", exclamou o cardeal Sodano, decano do Colégio Cardinalício depois do anúncio da renúncia, pronunciado pelo pontífice ao término do consistório dedicado aos mártires de Otranto. Mas um raio planejado.
A reportagem é de Marco Politi, publicado no jornal Il Fatto Quotidiano, 12-02-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Bento XVI já havia informado anteriormente o seu fiel secretário Gänswein, o secretário de Estado, Bertone, e o próprio Sodano. O papa programou tudo minuto a minuto. O seu "desaparecimento" do trono de Pedro será às 20 horas – a hora dos telejornais – do dia 28 de fevereiro: ele vai se retirar para a residência de Castel Gandolfo, enquanto no Vaticano se desencadeará o mecanismo da Sé Vacante até agora (na era moderna) implementado somente para as morte dos pontífices.
A partir do dia 1º de março, o cardeal Sodano procederá à convocação do conclave. Na Páscoa, será o sucessor que dará ao mundo a sua bênção. A renúncia de Bento XVI não é um abandono por cansaço, a fuga de um boxeador do ringue. É um gesto lúcido, racional, previdente, a seu modo revolucionário para a história da Igreja. Marca o fim da tradição do papado vitalício, torna-se um exemplo e uma sugestão para os futuros pontífices. A advertência de que, na época contemporânea, um papa exausto psico-fisicamente não deve continuar representando um ícone, sob cuja sombra outros comandam.
Celestino V e os outros papas e antipapas que, na Idade Média, foram forçados a deixar o assento supremo, não tem nada a ver. Lá, tratava-se de lutas de poder e de conflitos políticos e eclesiásticos. Aqui, ao invés, o intelectual Ratzinger – desencantado com relação aos mecanismos de governo humanos – reconhece a necessidade de escolher outra personalidade, que esteja no timão da Igreja Católica.
Ao fazer isso, completa uma renovação das estruturas eclesiais, iniciada por Paulo VI, que quis que os bispos renunciassem aos 75 anos e decretou que aos 80 anos os cardeais não pudessem entrar no conclave. Agora, Ratzinger indica que há um limite para o pontificado. É a sua única e grande reforma. Que ficará na história.
Até porque desmistifica o indivíduo-papa, que não é nem uma estrela do rock (como ele disse aos jovens na Austrália), nem um protegido ao extremo do Espírito Santo em todas as decisões que toma na sua escrivaninha.
O seu gesto é de coragem. Diante do mundo, com a solenidade do elóquio latino, reconheceu a "minha incapacidade de administrar bem", a missão de Pedro: o governo da Igreja. E tirou daí as suas conclusões, como honestamente havia anunciado há dois anos ao seu biógrafo alemão Peter Seewald. Se um papa não é mais capaz "física, psíquica e mentalmente" de exercer o seu mandato, é justo e até mesmo "necessário" renunciar.
Não é só uma questão de perturbações cardíacas e de artrite, de dificuldades para viajar e caminhar, tendo que recorrer à plataforma móvel de João Paulo II. A crise do Vatileaks – o espetáculo de lutas internas entre os cardeais, a desagregação da Cúria, o crescente descontentamento contra o secretário de Estado, Bertone, a péssima impressão feita pela Santa Sé com o IOR, que a oito meses desde a demissão de Gotti Tedeschi ainda não tem um novo presidente! – deu o golpe final em um pontificado marcado por crises contínuas e acelerou a decisão papal.
Ratzinger, que não queria se tornar papa, que definiu a eleição como uma "guilhotina" e, no início do pontificado, implorava a Deus para "ajudá-lo", entendeu sobriamente que literalmente não era mais capaz de reger pessoalmente o leme. Provou ser mais realista e corajoso do que muitos dos seus colaboradores, que sempre acusaram a imprensa de não entender o pontífice ou de insistir nas suas carências de homem de governo. Mais racional do que eles, Bento XVI encerrou a partida por si mesmo.
Bem consciente de que existem graves problemas internos, que a Igreja deve enfrentar (a crise dos padres, o papel da mulher, a abordagem ao mundo moderno, a reforma da cúria e do poder papal, as questões da sexualidade) e que ele tendia a remeter ao sucessor.
Há também uma queda de prestígio geopolítico da Santa Sé que deve ser remediada e uma queda de credibilidade da instituição-Igreja depois do Vatileaks e o escândalo dos abusos sexuais: neste ano, a Eurispes revelou que o consenso em torno da Igreja na Itália caiu para 36%.
Nos sagrados palácios, nessa segunda-feira, reinava a atmosfera de um formigueiro enlouquecido. Choque geral. Surpresa total. Poucos acreditaram nas palavras pronunciadas tempos atrás pelo próprio Ratzinger. Poucos haviam entendido que, no relato sobre as palavras do cardeal Romeo pronunciadas na China, que acenavam mais ou menos a um ano de pontificado ainda (publicadas pelo jornal Fatto exatamente há um ano e manipuladas pelos autores anônimos do documento como se fossem uma ameaça à vida do pontífice), perfilava-se o esgotamento da dinâmica do reino ratzingeriano.
Bento XVI lança um sinal com o timing da sua renúncia. Chega a Quaresma, tempo de reflexão. E para pregar os Exercícios Espirituais o papa chamou o cardeal Ravasi, ministro vaticano da Cultura. Como que indicando que o novo pontificado deverá levar em consideração os cristãos como uma "minoria ativa", comprometida com a cultura contemporânea, a ciência, os agnósticos, os "buscadores de verdade" na sua diversidade.
A partir de 1º de março, a Igreja Católica terá dois papas: um reinante e um emérito. Isso nunca aconteceu antes. Quinze anos atrás, o Papa Wojtyla fez essa questão a uma comissão secreta. Responderam-lhe que o mundo católico "não estava preparado para tal eventualidade". Ratzinger decidiu que chegou a hora.
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Cansado e sob ataque, Bento XVI renuncia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU