28 Março 2012
A vida "boa" – nas palavras do arcebispo de Milão, Angelo Scola, em seu livro de entrevistas La vita buona. Un dialogo sulla Chiesa, la fede, l'amore, la vita e il suo senso – é uma vida rica e corajosa, que não renuncia à plenitude das próprias ideias e ao testemunho de uma identidade pessoal e cultural orgulhosamente reivindicada, mas não se rende a uma existência marcada pelo monólogo e pela presunção de uma supremacia.
A opinião é de Pierluigi Battista, publicada no jornal Corriere della Sera, 27-03-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Como Aldo Cazzullo escreve na introdução a essa coletânea de entrevistas com o cardeal Angelo Scola, a literatura e as artes nos habituaram à "dolce vita" ou à "vida bela" ou à "vida amarga". Mas não sabemos lidar com familiaridade a ideia ou o conceito de uma "vida boa": "A vida pode ser ruim, dura, afortunada, aventureira. Eu nunca tinha ouvido falar de 'vida boa'".
A vida "boa", como ganha forma nas palavras do arcebispo de Milão, é uma vida rica e corajosa, que não renuncia à plenitude das próprias ideias e ao testemunho de uma identidade pessoal e cultural orgulhosamente reivindicada, mas não se rende a uma existência marcada pelo monólogo e pela presunção de uma supremacia.
Uma vida, para retomar a síntese que o entrevistador Cazzullo faz dela ao interpretar o entrevistado Scola, inspirada em um cristianismo que "não penalize as paixões, os desejos, até os instintos; ao contrário, que exalte a humanidade… a atração pelo belo".
A vida "boa" é uma meta difícil de alcançar. Para alcançá-la, é preciso tomar estradas intransitáveis. Angelo Scola traça um itinerário ideal que permite que os seres humanos tendam a essa meta. Nessas páginas, como no indica o próprio Cazzullo, as ideias formuladas pelo cardeal Scola não são só aquisições intelectuais, mas também o fruto de experiências existencialmente duras, que equilibraram o caráter do novo arcebispo de Milão e ex-patriarca de Veneza.
Scola teve que lutar, estudar, refinar os instrumentos teológicos que dão vigor cultural à sua fé, conquistando, pedaço a pedaço, fragmento a fragmento, o mosaico de uma personalidade coerente com aquele ideal de "vida boa". Mas precisamente a dureza de uma biografia rica em humanidade, mas nunca gratificada por aquele quê de "pré-cozido" e óbvio que torna mais insípidas as vidas de quem cresceu no privilégio e no facilismo, confere à prosa de Scola um senso de autenticidade vivida, de respeito pelo "povo", de atenção à concretude da existência, muito distante da álgida rarefação do estudioso puro.
Se é possível captar o núcleo comum a todos os argumentos propostos por Scola, solicitado por Cazzullo, esse poderia ser a obstinação "dialógica" de um homem que não pretende enfraquecer as próprias convicções para encontrar um ponto de entendimento qualquer com quem é portador de um pensamento diferente ou até mesmo oposto.
O cardeal Scola fala de "mestiçagem" de um modo que mais distante da retórica "multiculturalista" não pode ser. Seja falando de santidade da vida, de embriões, de tecnociência, de família, seja de leis sobre o "fim da vida", o cardeal Scola permanece fiel ao seu princípio fundamental: que, para dialogar, é preciso estar em dois, e ambos na plenitude da própria identidade. O encontro entre diferentes não pode ocorrer em um campo neutro. A "mestiçagem" não é o meio exato, o centro que anula a radicalidade dos opostos. O "diálogo" é entre sujeitos culturais que reivindicam uma sua posição clara, mas, eis o ponto, alheia à lógica da prevaricação e da imposição de um ponto de vista exclusivista.
É o empreendimento cultural e existencial mais difícil, mas justamente por isso mais fascinante. Como pensar em estar em uma Verdade de fé, mas não querer impor uma verdade histórica a quem não a reconhece. Como ser intransigentes sobre as coisas fundamentais, sem impor com a prepotência o conteúdo da própria intransigência.
Esse é o grande problema da Igreja Católica pós-conciliar e da Igreja Católica italiana em particular. A reivindicação de um papel público e de uma fé vivida em uma dimensão pública e não só confinada à privacidade separada da própria interioridade, e ao mesmo tempo o repúdio do fundamentalismo, se entendermos por integralismo a pretensão de impor a integralidade de um único ponto de vista em uma sociedade pluralista e diversificada.
Por isso, o trabalho comum de Cazzullo e de Angelo Scola produz um livro interessante e cheio de desafios culturais. Interessante também para aqueles que não compartilham as posições do arcebispo de Milão e são instados nessas páginas a enfrentar muitas interrogações e a fazer perguntas que soam como mais objeções ao discurso de Angelo Scola. Como esperar possuir a Verdade e depois abster-se da tentação de querer realizá-la na história, mesmo que com instrumentos que não desdenham o recurso à coerção e à proibição? Ou como não pensar que o vínculo de uma lei que exclui a autonomia das pessoas no seu "testamento em vida" ou que proíbe a proteção de direitos também para os casais de fato hetero e homossexuais não constitui ela mesma uma "imposição", mesmo que tão combatida por Angelo Scola?
Desse livro, saímos mais rico, mesmo na eventual discordância ou na dúvida pelas argumentações individuais propostas. Mas mais ricos. Talvez não seja suficiente para construir um pedaço de "vida boa". Mas, para enfrentar as interrogações de uma "vida interessante", isso sim.
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Um ideal de ''mestiçagem'' que não é multicultural - Instituto Humanitas Unisinos - IHU