19 Mai 2011
Um novo e extenso relatório sobre o escândalo dos abusos sexuais do clero compara a Igreja Católica Romana aos departamentos de polícia, com hierarquias, autoridade moral e ambientes de trabalho isolados semelhantes.
A reportagem é de Daniel Burke, publicada no sítio Religion News Service, 18-05-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
E como a Igreja, assim como a polícia, tem "`se policiado` historicamente", como diz o relatório, alguns leigos católicos e defensores das vítimas dizem que até mesmo uma pilha de relatórios condenatórios não vai mudar uma Igreja que tem sido historicamente resistente à reforma.
Um recente relatório do Grande Júri, que descobriu dezenas de padres acusados ainda ativos no ministério da arquidiocese de Filadélfia, dizem os críticos, lhes dá poucas evidências de esperança.
O estudo do John Jay College de Justiça Criminal de Nova York, lançado nesta quarta-feira, retrata o escândalo dos abusos como algo em grande parte confinado ao passado. Mais de 90% das cerca de 10.700 denúncias contra padres católicos ocorreu antes de 1990, segundo o relatório.
Os pesquisadores disseram que o abuso de menores relacionava-se a um salto nos comportamentos desviantes na sociedade em geral, como o sexo antes do casamento, o uso experimental de drogas e o crime.
"O problema dos abuso sexuais de menores por padres católicos nos Estados Unidos é, em grande parte, histórico", disse Karen Terry, o a principal investigadora para o estudo, "e a maior parte dos casos ocorreram décadas atrás".
A crise em curso na Filadélfia – que até mesmo os bispos da Igreja ficaram sem palavras para explicar – mostra que o escândalo irá continuar, a menos que os bispos sejam responsabilizados por suas ações, de acordo com os advogados das vítimas.
As novas e não vinculantes linhas diretrizes emitidas pelo Vaticano nesta segunda-feira também dão pouca indicação de que essa vigilância irá ocorrer. Apenas um bispo dos EUA, o cardeal Bernard Law, de Boston, foi forçado a renunciar por não ter impedido o abuso sexual de crianças.
Ao longo dos 60 anos cobertos pelo estudo, a resposta dos bispos aos padres abusadores "mudou substancialmente", segundo o relatório do John Jay. "Por exemplo, era menos provável que os padres abusadores voltassem ao ministério ativo e/ou mais provável que fossem colocados em licença administrativa durante os últimos anos", afirma o relatório.
O relatório disse que os bispos, assim como muitos norte-americanos durante os anos 1950 a 1980, não conseguiram entender o dano resultante do abuso sexual. Os pesquisadores, no entanto, não aliviaram a responsabilidade dos bispos.
"Embora essa falta de entendimento tenha sido consistente com a total falta de entendimento da vitimização nesse momento, a ausência de reconhecimento dos danos foi um lapso ético significativo por parte das lideranças de algumas dioceses", afirma o relatório.
De acordo com as reformas mais firmes adotadas pelos bispos em 2002, as denúncias confiáveis de abuso devem ser comunicadas às autoridades civis, e as dioceses devem ser auditadas anualmente. Mas nenhuma dessas políticas é obrigatória.
O relatório do John Jay descobriu que os bispos denunciaram apenas 14% das acusações contra padres à polícia. E dois bispos se recusaram a permitir auditorias em suas dioceses.
Em janeiro, o Papa Bento XVI promoveu um desses dois bispos, Dom Robert Vasa, de Baker, Oregon, a uma diocese maior, em Santa Rosa, Califórnia.
"Que tipo de mensagem isso envia?", disse Nicolas Cafardi, professor de direito canônico e ex-presidente da comissão dos bispos que elaborou as diretrizes contra os abusos.
O relatório do Grande Júri da Filadélfia alegou que as autoridades da Igreja teriam mantido 37 padres no ministério ativo, apesar das denúncias confiáveis de abuso sexual. A arquidiocese posteriormente suspendeu 26 padres e instaurou uma investigação interna.
Silêncio episcopal
Em um artigo do dia 12 de maio na revista Commonweal, Ana Maria Catanzaro, que chefia o conselho de vigilância contra abusos sexuais da arquidiocese da Filadélfia, acusou o cardeal Justin Rigali e seus subordinados por terem fracassado "miseravelmente em serem abertos e transparentes".
"Se os bispos da Filadélfia tivessem seguido o seu chamado a viver o evangelho, eles teriam agido de forma diferente", disse Catanzaro.
Nenhum bispos exortou os líderes da arquidiocese de Filadélfia a serem responsabilizados pela Igreja ou pelas autoridades civis.
"O silêncio por parte dos bispos era ensurdecedor", disse Cafardi. "Sem bispos dispostos a se pronunciar contra seus irmãos bispos e a dizer: `Você não está seguindo as regras`, as linhas diretrizes perdem sua força moral", disse ele.
Falando aos repórteres em Washington, depois do lançamento do relatório do John Jay, Dom Blase Cupich (foto), de Spokane, Washington, que preside a Comissão Episcopal de Proteção às Crianças, disse: "Nós simplesmente não saberemos o que aconteceu na Filadélfia" até que a arquidiocese complete a sua investigação.
"O que eu posso dizer-lhes, depois de ter falado com os bispos de todo o país, é que eles ficaram muito surpresos que isso tenha acontecido", disse Cupich.
Os bispos planejam revisar a implementação de suas diretrizes de proteção às crianças em um encontro em junho, em Seattle. Os defensores da reforma estão céticos e não acreditam que muita coisa vá mudar.
"A Igreja é uma instituição que é muito resistente à mudança", disse Terence McKiernan, presidente do site de controle permanente BishopAccountability.org. "Esses não são movimentos para consertar as coisas, mas sim para fazer com que a Igreja seja bem vista".
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Bispos dos EUA no centro do escândalo da pedofilia: "Medidas só buscam melhorar a imagem da Igreja" - Instituto Humanitas Unisinos - IHU