26 Outubro 2018
Jesus «curou» o cego de sua cegueira, mas concluiu dizendo: «Vai, tua fé te salvou». Jesus curava os doentes para levar-lhes a Salvação de Deus. Jeremias e o salmista também deram testemunho do Deus que salva, curando o povo dos sofrimentos do exílio. A Palavra deste domingo é um convite à alegria. Deus nos convida à alegria, sejam quais forem as provações que tenhamos de atravessar, depositando nossa confiança em Jesus. Com Bartimeu, cabe-nos gritar: "Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!"
A reflexão é de Marcel Domergue (+1922-2015), sacerdote jesuíta francês, publicada no sítio Croire, comentando o evangelho do 30º Domingo do Tempo Comum, do Ciclo B (28 de outubro de 2018). A tradução é de Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.
1ª leitura: «Eu os trarei do país do Norte e os reunirei desde as extremidades da terra; entre eles há cegos e aleijados, mulheres grávidas e parturientes: são uma grande multidão os que retornam» (Jr 31,7-9).
Salmo: Sl. 125(126) - R/ Maravilhas fez conosco o Senhor, exultemos de alegria!
2ª leitura: «Tu és sacerdote para sempre, na ordem de Melquisedec» (Hb 5,1-6)
Evangelho: «Mestre, que eu veja!» (Mc 10,46-52)
Haviam saído de Jericó. Então, não estamos longe de Jerusalém, onde Jesus será morto. O evangelho de João nos apresenta insistentemente Jesus como a luz do mundo. Este, aliás, é um tema comum em todo o Novo Testamento: o Cristo-Luz. Em João 8,12, Jesus diz: "Quem me segue não andará nas trevas". Mas será que todas as pessoas que o seguiam, na verdade o estavam seguindo? Ou não estariam cegos para o que estava por acontecer na "cidade que mata os profetas"? Bartimeu, no fundo, representa todos eles; é o símbolo da cegueira geral. Se as pessoas queriam impedi-lo de ir ao encontro de Jesus, era para que a cegueira delas não fosse curada nem manifestada. "Acaso também nós somos cegos?", perguntavam os fariseus em João 9,40.
Tudo isto nos é relatado para nos fazer compreender que todos nós, humanos, somos cegos diante do mistério que está por se realizar. Lembremos que até mesmo Tiago e João haviam pedido a Jesus, como favor, algo que estava em total contradição com a sabedoria da Cruz (comentário do domingo passado). Seguimos o Cristo de olhos fechados, mas a aventura de Bartimeu nos ensina que um dia veremos a luz. O que nos acontece desde já, sermos iluminados por lampejos fugidios, verdadeiros viáticos para a nossa caminhada. Cegos, não sabemos o que será do amanhã, seja para o nosso corpo, para o nosso espírito ou para as nossas relações, mas podemos contar com esta luz que nos virá do Cristo.
Mas isto tudo não é contraditório? A "grande multidão" que segue Jesus, saindo de Jericó, são pessoas que a princípio estão vendo, e sabem muito bem aonde estão indo. Quase diria que são bons cristãos, praticantes. Bartimeu não é só cego, mas está imobilizado, "sentado à beira do caminho". É um marginalizado em relação ao povo que segue o bom caminho. Somente no final é que vai recuperar a visão, passando a enxergar como todo mundo e a "seguir Jesus pelo caminho".
Mas por que e como levantar suspeita de cegueira contra esta multidão? Lembremos João 9,40-41: "Alguns fariseus (...) lhe disseram: ‘Acaso também nós somos cegos?’ Respondeu-lhes Jesus: ‘Se fôsseis cegos, não teríeis pecado; mas dizeis: ‘Nós vemos!’ Vosso pecado permanece."
Neste evangelho, as pessoas manifestam sua cegueira procurando impedir o cego de ir até Jesus: o que interessa este pobre coitado, se estão marchando para uma espécie de tomada de Jerusalém? Seguem o Cristo, com certeza, mas não para onde ele está indo. Seus olhos, sem dúvida, um dia se abrirão, mas ainda não é esta a hora.
Bartimeu, por sua vez, sabe que é cego. Sabe que lhe falta alguma coisa, da mesma forma que o homem rico de Marcos 10,17-22. A sua cegueira é o sinal exterior de uma carência fundamental, que é a mesma de todo ser humano, que não sabe para onde está indo nem aonde ir. E que, por isso, permanece sentado.
A fé deste homem de desejo irá crescer ao longo do relato: no versículo 47, o Cristo para ele é "Jesus, o Nazareno", ou seja, o homem conhecido por curar a todos. Em seguida, o chama de "Filho de Davi" (v. 47 e 48), que é um título messiânico; e, finalmente, no versículo 51, Jesus torna-se "Rabbouni ", o Mestre: "Quanto a vós, não permitais que vos chamem de ‘Rabbi’, pois um só é o vosso Mestre e todos vós sois irmãos", diz Jesus em Mateus 23,8.
Pois este Mestre único vai se fazer servidor: o texto que vem em seguida ao episódio de Bartimeu nos conta a entrada de Jesus em Jerusalém. Aquele que é a Luz vai entrar nas trevas, mas, como diz o Prólogo de João, «as trevas não a apreenderam», não abafaram a Luz. Mais ainda; as trevas tornaram-se luz: "A treva não é treva para ti, tanto a noite como o dia iluminam", diz o Salmo 139 no versículo 12.
Assim como os Quatro Animais, de Apocalipse 4,1-11, os evangelistas, longe de serem cegos, estão "cheios de olhos pela frente e por trás". Olhando para trás, sabem que o Antigo Testamento nos dá o próprio Deus e a sua Palavra como a luz dos homens; "Tua Palavra é lâmpada para os meus pés e luz para o meu caminho" (Salmo 119,105). O salmista pensava com certeza na coluna de fogo que guiava Israel para a terra prometida. Mas o Cristo já não está dizendo a última palavra de tudo isto?
Olhando para o futuro, Marcos vê a Luz da Ressurreição. Parece que Bartimeu, iluminado com a sua cura, já estava entrevendo tudo isso, pois o que Jesus lhe diz é: "Tua fé te salvou". Fé e salvação (bem além do que somente a cura), duas palavras carregadas de sentido.
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Um olhar de fé - Instituto Humanitas Unisinos - IHU