20 Setembro 2018
"Estamos todos neste oceano, quer percebamos ou não. (O tubarão sabe que está em um oceano?) Estamos todos conectados inextricavelmente porque nós existimos na mesma água e encontramos nosso sustento neste oceano e tudo mais que precisamos para viver", escreve Patrick T. Reardon, autor de oito livros, incluindo Requiem for David, em artigo publicado por National Catholic Reporter, 18-09-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.
Cheguei a um ponto em que não posso mais seguir com o Deus de Michelangelo no teto da Capela Sistina. Grande arte, mas, Deus como um cara velho com uma longa barba grisalha? Não, obrigado.
Por muito tempo, minha esposa Cathy teve sua própria interpretação sobre isso. Na missa, quando os celebrantes começam, "Pai Nosso...", Cathy acrescenta em voz alta: "...e Mãe Nossa."
Isso faz mais sentido, mas ainda não resolve o caso para mim. Eu sou capaz de pensar em Deus como um pai, ou uma mãe, me amando e querendo o que é melhor para mim, me proporcionando o que preciso para viver uma vida plena e, novamente como um bom pai ou uma boa mãe, dando-me o espaço que preciso para falhar e aprender com minhas falhas.
O que não funciona para mim é a ideia de que, se algo de bom acontece, é Deus no céu puxando os fiozinhos. Digamos que eu esteja correndo para o aeroporto, atrasado para um voo e, contra todas as probabilidades, chego ao voo. Não consigo pensar que Deus fez isso acontecer. E não consigo me fazer orar para Deus para que isso aconteça.
Se eu penso que Deus está interferindo na minha vida para tornar possível que eu chegue ao voo, o que devo pensar se eu aterrissar, pegar um carro alugado e, dentro de 20 minutos, me envolver em um acidente? Deus puxou algum fio para que isso acontecesse? Ou Deus não conseguiu puxar o fio correto?
As coisas acontecem na vida, as boas e as ruins. Coisas boas acontecem com pessoas más. Coisas ruins acontecem com pessoas boas. Como qualquer um que chegou à conclusão de que nascemos para morrer, como os humanos devem, sabe que a vida não é justa. Você e eu vivemos sob uma sentença de morte.
Nos últimos anos, Jó se tornou um dos meus heróis. Você sabe, o cara da Bíblia que é afligido com uma quantidade enorme de coisas ruins, o cara conhecido pela "paciência de Jó".
Jó, no entanto, é tudo menos paciente. Ele lamuria-se para Deus, reclama e diz muito "ai de mim". Sua fé nunca vacila - é aí que entra a "paciência" - mas ele intima Deus, exigindo por que, sendo um bom homem, ele tem que aturar todos esses desastres, incêndios e feridas, bem como a pilha de estrume onde mora.
Finalmente, vem a gota d’água e, "do seio da tempestade", soando mais do que um pouco exasperado, Deus diz: "Onde estavas quando lancei as fundações da Terra? Fala, se tiveres o conhecimento... Algum na vida deste ordens às manhãs? Indicaste à aurora o seu lugar..."
Deus continua assim por 71 versos e, basicamente, Ele está dizendo a Jó: "Olha só, eu sou Deus, e você não é. Eu entendo dessas coisas, e você não entende."
Isso foi muito reconfortante para mim. Eu não sei quanto a vocês, mas a vida me deixa completamente perplexo. Eu tento compreendê-la e descubro jeitos de enquadrar as coisas e encontrar um significado. Mas estou sempre os ajustando e eles nunca estão adequados.
O que é reconfortante é que, mesmo que eu não entenda a vida, Deus o faz. Assim como a flor não entende a tempestade que a está atingindo com chuva e a batendo com o vento, estou tentando florescer na tempestade da vida.
Então, durante uma recente sessão de terapia na qual eu estava falando sobre o câncer generalizado do meu sobrinho e das mortes que estão acontecendo ao meu redor, fiquei um pouco surpreso quando meu terapeuta perguntou: "Onde Deus se encaixa nisso tudo?"
Depois de me enrolar um pouco, o que descobri, essencialmente, é que vejo Deus como o oceano no qual todos nadamos.
Estamos todos neste oceano, quer percebamos ou não. (O tubarão sabe que está em um oceano?) Estamos todos conectados inextricavelmente porque nós existimos na mesma água e encontramos nosso sustento neste oceano e tudo mais que precisamos para viver.
Então, estendendo essa ideia, peguei a mesma imagem e disse que a fé religiosa (ou qualquer fé em algo que dá significado à vida) é o oceano em que todos nadamos, quer percebamos ou não.
Pensando nisso, estou pensando que Deus e fé são a mesma coisa? Acho que sim.
Então eu fui para o amor, querendo dizer toda a gama de conexões nas quais nos tocamos e somos tocados - o amor é o oceano em que todos nós nadamos.
Afinal, somos indivíduos, mas existimos entre outros. Até os eremitas já viveram entre outros e, mesmo quando um eremita vive em isolamento, ele ou ela respira o mesmo ar e vê o mesmo sol que o resto da humanidade.
São Paulo nos diz que Deus é amor, então pensar em Deus e o amor como sendo o mesmo oceano em que todos nós nadamos faz sentido - e a fé sendo esse oceano também.
Onde, o teologicamente inclinado pode perguntar, está Deus como pessoa, uma das fundações do cristianismo? Meu pensamento é que Deus é uma pessoa e um oceano de uma maneira que eu não consigo entender, porque, bem, eu não sou Deus.
Nada disso, é claro, empurra o ser humano que Jesus foi, e é, para fora do palco. Jesus ainda está no centro da fé e do amor, sendo também Deus.
Apesar de 2.000 anos de teorização teológica, acho que é seguro dizer que ninguém entende como Jesus pode ser um ser humano e também ser Deus.
Então, talvez eu não seja tão louco por pensar em Deus como pessoa e como oceano.
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Deus é o oceano no qual todos nadamos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU