18 Abril 2017
Donald Trump recebeu apoio bipartidário irrestrito para ordenar que 59 mísseis de cruzeiro bombardeassem um campo aéreo no noroeste da Síria em 6 de abril. O presidente foi elogiado por tomar medidas decisivas e por mostrar determinação no combate ao regime perverso do presidente sírio Bashar Assad. Nós não compartilhamos deste apoio, destas ações de Trump tiramos uma lição bem diferente. Para nós, está claro que ele segue os seus dois antecessores num caminho pantanoso de guerra interminável e sem esperança.
A opinião é do editorial do National Catholic Reporter, 13-04-2017. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Indubitavelmente, o emprego de armas químicas é repreensível. No entanto, citar isto como um evento desencadeador para a ação depois de seis anos a sangrar cruelmente uma população civil com armas regulares parecesse hipocrisia. Em março, no sexto aniversário da guerra na Síria, a Rede Síria de Direitos Humanos informou que 207 mil civis foram mortos, incluindo 24 mil crianças e 23 mil mulheres.
Quase 750 trabalhadores da saúde e mais de 600 profissionais de imprensa morreram até o mês de março. O Observatório Sírio de Direitos Humanos relata que mais de 220 mil combatentes de todos os lados do conflito morreram desde 2011.
A Rede Síria de Direitos Humanos diz que os ataques aéreos causaram a maioria das mortes. Nos demais casos, estão vários tipos de armas, incluindo metralhadoras, atiradores de elite, morteiros e munições cluster.
Portanto, sim, as armas químicas são, sem dúvida, repreensíveis, mas também o são as casualidades decorrentes de bombas de barril [artefatos explosivos improvisados] e os atiradores de elite, a desnutrição e falta de cuidados médicos. Esta maluquice precisa parar, mas bombardear uma única faixa aérea na Síria com 59 mísseis de cruzeiro não irá realizar muita coisa, por fazer parte de uma estratégia mais ampla.
Trump usou este ataque aéreo da mesma forma como usa o Twitter: depois de testemunhar algo de que não gostou, ou que ameaçou a ele ou a seus interesses, lançou o seu ataque. Trump construiu a aparência de ser um alguém resoluto nas decisões que toma, mas, no fundo, sempre são ações vazias.
O que precisamos é de uma coisa que os EUA não têm há muito tempo: um plano coerente de ação para o Oriente Médio. Por mais de uma década de meia, temos passado de campo de batalha a outro, aos tropeços, e então, de novo, nos encontramos no Afeganistão, no Iraque, na Somália e, agora, na Síria.
O presidente George W. Bush ergueu a sua infame bandeira “Missão Cumprida” em 2003 e o presidente Barack Obama declarou o fim da missão militar americana no Iraque em 2010 e no Afeganistão, em 2016. Mas a matança continua em todos estes lugares e nada temos a mostrar para as centenas de milhares de vidas perdidas e para os trilhões de dólares do tesouro nacional desperdiçados. Hoje, os EUA possuem cerca de 9 mil tropas no Afeganistão e aproximadamente 6.500 tropas no Iraque. Continuamos gastando anualmente bilhões de dólares para mantê-los.
Desde a sua inauguração, Trump moveu tropas adicionais para ambos os países, e 400 tropas diretamente para a Síria com a promessa de enviar mais outra remessa. Duas tentativas de se parecer durão – uma investida das Forças Especiais no Iêmen e ataques aéreos em Mossul, no Iraque – mataram mais civis do que combatentes.
O Congresso não debateu nenhum destes movimentos, e o governo Trump não apresentou programa algum a longo prazo para o Afeganistão, o Iraque, a Síria ou qualquer outro país onde tropas americanas se fazem presentes. Sob a liderança de três presidentes, o Pentágono tem se baseado em uma única peça legislativa para toda a sua prática bélica: a Autorização para o Uso de Força Militar, ou AUMF (como é conhecida em inglês), que o Congresso aprovou na esteira dos ataques de 11 de setembro, em Nova York e Washington.
Esta resolução vem definindo a nossa política externa e modelando a nossa política nacional por quase 16 anos. Ela deu ao presidente a autoridade para “usar toda a força necessária e apropriada contra as nações, organizações ou pessoas que ele determina terem planejado, autorizado, cometido ou ajudado nos ataques terroristas que ocorreram em 11 de setembro de 2001”.
Há tempos estes atores se foram, mas a resolução não conta com uma data de validade, nem sinaliza qual ação ou evento desencadearia um final para a tal autorização. Três governos usaram a AUMF para mandar tropas, aviões e drones a uma dúzia de países no Oriente Médio e na África. E não vislumbramos um fim aqui.
Chegou a hora de o Congresso recuperar a sua autoridade constitucional no tocante a guerras. Ele deve revogar a Autorização para o Uso de Força Militar de 2001 e exigir que o presidente e o Pentágono voltem-se aos congressistas quando da obtenção de uma nova autorização, solicitação que deve conter um plano amplo de ação para findar o envolvimento americano nestas guerras.
A exigência de uma solicitação para a autorização de força militar diante do Congresso permitirá, acreditamos, que ocorra um debate nacional sobre a posição dos EUA na comunidade global. Esperaríamos que o novo plano tivesse uma forte centralidade na diplomacia e incorporasse uma coalizão com atores internacionais.
O plano em vigor já 16 anos nada conquistou. Revogar a AUMF é o primeiro passo na busca de acabar com estas guerras.
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EUA: Revogar a resolução de 2001 sobre o uso da força militar - Instituto Humanitas Unisinos - IHU