01 Abril 2016
“Enquanto as ruas vão se agitando de indignados brasileiros, fica difícil imaginar que existem mais de 100 grupos/povos indígenas vivendo isolados, principalmente na região amazônica. São também conhecidos como índios livres. Pelo menos livres dessa situação de perplexidade, confusão, corrupção... Até quando ninguém sabe. Estão sob fortes ameaças das frentes de expansão econômica, principalmente as mineradoras e garimpeiros, madeireiros e uma série de grandes projeto de infra-estrutura desse modelo desenvolvimentista, que está destruindo essa nação há décadas. Sejamos solidários com os isolados e quem sabe algum dia seremos também livres”, escreve Egon Heck, do secretariado nacional do Conselho Indigenista Missionário – CIMI, ao enviar o artigo que publicamos a seguir.
Eis o artigo.
“O desaparecimento duma cultura pode ser tanto ou mais grave do que o desaparecimento duma espécie animal ou vegetal. A imposição dum estilo hegemônico de vida ligado a um modo de produção pode ser tão nocivo como a alteração dos ecossistemas.”
Denuncia o Papa Francisco na Encíclica Laudato Si, 145
“Estou preocupado com os parentes isolados, porque de uma hora pra outra eles podem ser atacados por garimpeiros, madeireiros, caçadores. Correm o risco de serem exterminados”. Essa afirmação de uma liderança Munduruku reflete uma nova consciência de vários povos indígenas, mais próximos das possíveis localizações dos grupos/povos isolados. Essa foi uma das constatações animadoras feitas no encontro da equipe que atua pelo Cimi na questão dos índios isolados, realizado no Centro de Formação Vicente Canhas, em Luziânia de 29 a 31 de março.
Desde seu início o Cimi, na década de 70, tem se preocupado com a os povos em situação de isolamento ou de contato recente, pois o avanço do sistema capitalista sobre a Amazônia, com as inúmeras estradas e grandes projeto agropecuários, mineração, hidrelétricas, atingiram inúmeras terras/territórios dos povos indígenas isolados. São inúmeros os exemplos de aldeias invadidas, grupos e povos sendo dizimados. Dentre eles podemos destacar os Panará (Krenakarore) atravessados pela estrada Cuiabá Santarém, sendo os sobreviventes levados para o Parque Indígena do Xingu. O extermínio dos Beiço de Pau, no rio Arinos, que de 600 pessoas em pouco tempo ficaram reduzidos a 49 e estes transferidos para o Parque o Xingu. E assim poderíamos levantar inúmeros casos, hoje já mais conhecidos graças ao trabalho de recuperação da memória dos massacres de mais de 8 mil indígenas só no período analisado pela Comissão Nacional da Verdade.
Vamos permitir o extermínio dos “índios isolados”?
Conforme os dados mais recentes da Funai, se tem informações de mais de 100 grupos/povos indígenas isolados no Brasil. A quase totalidade estão na região amazônica, que sofre forte pressão do expansionismo de atividades econômicas de mineração, madeira, projetos geopolíticos, hidrelétricas, dentre muitos.
Conforme publicação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), organização dos Estados Americanos (OEA), “O Brasil é o país onde se registra maior número desses povos (isolados), seguido pelo Peru e pela Bolívia. Além de reconhecer um maior número de registro de povos isolados, o Brasil também possui a política pública mais avançada no que diz respeito à garantia dos direitos desses povos”.
Essa afirmação foi questionada pelos participantes do encontro sobre povos isolados, pois na prática o que se percebe é um inexorável avanço dos interesses econômicos e de desenvolvimento do país, sobre os territórios e recursos naturais aí existentes. Isso faz com que muitos dos princípios que norteiam a política do Estado brasileiro com relação a esses povos, sejam atropelados e anulados pela aceleração do crescimento (programas do PAC), como tem acontecido com recentes construções de hidrelétricas. Só na bacia do Rio Tapajós, na qual existem informações de vários grupos/povos isolados, estão previsto a construção de 43 hidrelétricas de grande porte. Isso fatalmente irá impactar e propiciar o extermínio de vários desses grupos.
O que fazer
Garantir a sobrevivência desses grupos/povos é uma questão humanitária e uma responsabilidade de todos nós brasileiros, em primeiro lugar. Não podemos nos omitir quanto a isso. Por essa razão uma primeira preocupação é ter informações e conhecer essa realidade para lutarmos juntos por ações efetivas de solidariedade e proteção esses povos e seus territórios.
Cobrar coerência e efetiva proteção do Estado brasileiro, através de políticas eficazes, que atuem no sentido da proteção e respeito dos direitos, seja através do Sistema de Proteção dos Índios Isolados (SPII) órgão criado pela Funai na década de 80, segundo a qual “o Estado brasileiro substituiu o paradigma de Ação indigenista vigente, que tinha a atração e contato como medida de proteção – pelo respeito e autodeterminação dos povos isolados de assim se manterem” (blog “Povos Isolados”)
O Cimi, através de sua equipe de apoio a estes povos vem levantando informações e referencias sobre sua existência e sobre as ameaças que sofrem, tornando-as públicas e cobrando das autoridades medidas efetivas de proteção e garantia de seus territórios.
Fotos Laila/Cimi – índios Awá Guajá - MA
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Os índios isolados e os indignados - Instituto Humanitas Unisinos - IHU