18 Julho 2011
Paulo de Tarso, hoje, passa a ser retomado fora do âmbito teológico e exegético, levando alguns autores a falarem de uma "ressurreição política de São Paulo". Para José Antônio Zamora (foto), professor do Instituto de Filosofia do Conselho Superior de Investigações Científicas - CSIC da Espanha, essa "manifestação de um vivo interesse pela figura e pela mensagem do apóstolo Paulo" também se deu "entre alguns pensadores políticos de esquerda".
E essa é a análise que o autor realiza na edição 53 dos Cadernos Teologia Pública, publicados pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, intitulado Escatologia, militância e universalidade: Leituras políticas de São Paulo hoje.
Em seu texto, Zamora, doutor pela Universidade de Münster, na Alemanha, com uma tese sobre Theodor Adorno, orientada por Johann Baptitst Metz, aborda quatro estudiosos principais:
Segundo Zamora, Taubes relaciona o apóstolo dos gentios com Walter Benjamin "empenhado em recuperar o significado político do messianismo", reivindicando assim a modernidade do primeiro. "Paulo proclama um novo universalismo que rompe com o consenso da lei e da ordem, e que passa pelo crucificado. Não busca substituir o nomos da terra pela Tora, o poder do imperador por uma teocracia, senão negar radicalmente a lei como poder da ordem política", afirma.
Badiou, por sua vez, encontra em Paulo uma resposta à "busca de uma nova figura de militante", pois em seu apostolado "encontramos traços invariantes dessa figura e de suas condições formais". Segundo Zamora, Badiou reconhece que "o que a figura de Paulo nos permite é pensar o acontecimento e a vida militante num momento de desilusão revolucionária após a morte de todas as utopias mobilizadoras. O essencial é a fé de Paulo em Cristo e o acontecimento do Messias. Ambas se constituem mutuamente".
Já Žižek considera o apóstolo Paulo como um "leninista avant la lettre". Para Žižek, "a dimensão-chave do gesto de Paulo é sua ruptura com qualquer forma de comunitarismo: seu universo já não é o da multidão de grupos que querem `encontrar sua voz` e afirmar sua identidade particular, seu `estilo de vida`, senão o de uma coletividade em luta baseada na referência a um universalismo incondicional".
E Agamben considera que "o conceito paulino de `resto` permite situar numa perspectiva nova nossas noções de povo e democracia". Esse é o "legado político imediatamente atual das Cartas de Paulo", segundo o filósofo italiano. "O povo não é nem o todo nem a parte, nem maioria nem minoria. O povo é antes o que jamais pode coincidir consigo mesmo, nem como todo nem como parte, isto é, o que permanece infinitamente ou resiste a toda divisão, e que – apesar daqueles que governam – não se deixa jamais reduzir a uma maioria ou minoria", afirma Agamben. Para Zamora, portanto, a vocação messiânica não tem a ver com a atribuição de uma nova identidade: "É antes a revogação de todas as vocações e a suspensão de todas as identidades".
Esse interesse político pelo apóstolo Paulo "coincide com o que poderíamos chamar uma nova reivindicação do `político` sob as condições de despolitização impostas às sociedades atuais pela globalização neoliberal", afirma Zamora. O que se apreende de uma leitura de Paulo sob esse viés é que o apóstolo "não é um patrimônio exclusivo dos cristãos e das igrejas e menos ainda dos teólogos".
O diagnóstico do autor é a "perda de confiança de que a democracia possa pôr um freio ao capitalismo" e que, na crise atual, "a emancipação necessita de uma reinvenção completa do político que também envolva um novo modo de produção, não só do econômico, senão também do social".
Diante desse panorama, "as leituras de Paulo […] têm muito de gesto de libertação, de grito de protesto, de reclamação de alternativas que mereçam este nome", resume Zamora.
A edição impressa do Cadernos Teologia Pública nº 53 está disponível no IHU e na Livraria Cultural. Sua versão online, no formato PDF, está disponível aqui.
(Por Moisés Sbardelotto)
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Leituras políticas de Paulo de Tarso - Instituto Humanitas Unisinos - IHU