07 Abril 2011
O massacre ocorrido ontem na Escola Municipal Tasso da Silveira, no Rio de Janeiro, revela uma situação preocupante: a violência na educação não é um fato isolado e autoridades não têm pleno controle do problema.
A reportagem é de Luciano Máximo e Sérgio Bueno e publicada pelo jornal Valor, 08-04-2011.
Simples busca na internet descortina dezenas de casos ocorridos nos últimos anos envolvendo pessoas portando armas de fogo dentro dos muros das escolas em todo o país, sejam elas públicas ou particulares. O Valor procurou os educadores envolvidos em alguns destes casos e os relatos mostram a dificuldade em lidar com a violência quando ela entra no ambiente escolar.
"No cotidiano, nem o governo nem as escolas sabem como agir diante da violência. Deveria existir um plano maior, de prevenção e esclarecimento, principalmente com a participação de pais e da comunidade", avalia Volmer Pianca, diretor do Sindicato de Especialistas em Educação do Magistério do Estado de São Paulo (Udemo).
Em um universo de 496 escolas estaduais que participaram de pesquisa da entidade, 84% registraram ocorrências relacionadas à violência em 2009. Constam do levantamento ameaça a professores, arrombamentos, explosão de bombas, uso de drogas e porte de armas. Mais de 200 escolas disseram ter problemas com drogas e mais de 90, com porte de armas.
Em nota, o secretário Estadual de Educação de São Paulo, Herman Voorwald, informou que "o processo de universalização do ensino trouxe a sociedade para dentro da escola pública e incorporou muitos problemas sociais, antes estranhos ao ambiente escolar".
As escolas paulistas contam com o apoio de 23 mil agentes que, entre outras funções, coordenam a entrada e saída dos estudantes, também vigiados pela ronda escolar da Polícia Militar. Em 2009, a Secretaria criou o Sistema de Proteção Escolar para combater a violência, com a difusão de práticas para identificar, prevenir e mediar conflitos nas escolas. São 1,2 mil professores-mediadores, em mil escolas da rede estadual. O Estado tem 5 milhões de alunos, 220 mil professores e 5,3 mil escolas.
Há menos de uma semana, o ex-marido de uma professora da Escola Estadual Gonçalo Antunes Bezerra, em Alagoinha, interior de Pernambuco, invadiu uma escola e atirou em dois alunos, que sobreviveram ao ataque. No mês passado, um funcionário da Escola Estadual Armando Nogueira, em Rio Branco, no Acre, foi ferido nas dependências da unidade. "Houve investigação, pegaram um dos rapazes envolvidos, e depois do que aconteceu, os vigias passaram a trabalhar armados", relatou o professor Luiz Rodomilson.
Em 2009, o estudante Eduardo Lucas da Silva foi atingido por um tiro enquanto participava da aula de educação física na Escola Estadual Governador Milton Campos, em Belo Horizonte. A secretaria do colégio informou que, desde então, até quatro policiais militares fazem ronda dentro da escola durante o intervalo.
A diretora da Escola Estadual Agalvira Pinto, em Araucária (PR), Gislene Busch, teve de lidar com a morte de um aluno de 15 anos, baleado na quadra da escola por um morador da comunidade, que levou um revólver para exibir aos amigos. "Não tínhamos controle do acesso à quadra, porque os portões foram arrancados. O policiamento perto da escola aumentou, mas os portões ainda não foram colocados por causa de burocracia na liberação de recursos", conta.
Em Teresina, no Piauí, o diretor da Unidade Escolar Monsenhor Cícero Portela Nunes, Carlos Fortes, afirma que o pelotão escolar, unidade da Polícia Militar responsável por fazer a ronda escolar no Estado, "tem número baixo de soldados e demora para chegar quando acionado". Em 2009, um funcionário da escola foi baleado. Procuramos fazer o possível para manter a segurança: impedimos que alunos fiquem na frente da escola, abolimos a entrada no segundo horário e nem mesmo pais de alunos têm acesso às classes", diz Fortes.
Para o educador e psicólogo Marcos Meier, as políticas governamentais devem focar o professor. "A formação profissional hoje é muito focada em conteúdo, num momento em que o professor está perdendo autoridade diante do aluno. Isso não ocorre só na escola, vem de casa, da ausência de autoridade dos próprios pais. A formação deve reforçar o relacionamento social e as escolas devem estar mais perto das famílias", opina ele.
Apesar da falta de estatísticas específicas sobre o assunto, o aumento da violência escolar é perceptível em Porto Alegre, segundo professores e autoridades. O delegado do Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (Deca), Andrei Vivian, diz que há casos de estudantes flagrados com armas em escolas da rede pública e privada. Até agora, não há registro de assassinatos na capital gaúcha, mas em maio de 2010 um estudante de 15 anos foi morto com um tiro por outro adolescente de 14 anos logo após descer de um ônibus. Na época, a mãe da vítima relatou que há dois anos o filho era alvo de "bullying", porque era gordo. O assassino disse ser amigo dos colegas que assediavam a vítima.
Preconceito, tráfico de drogas, desemprego, desagregação social e desavenças pessoais são os motivos mais frequentes para a violência, na visão do delegado. Segundo ele, as escolas não conseguem se isolar do ambiente violento que as rodeiam e acabam refletindo o aumento dos índices gerais de criminalidade. A situação não é mais grave, diz, porque as escolas estaduais contam com policiamento da Brigada Militar. "Não temos como blindar as escolas, mas podemos reduzir a violência", diz o diretor do departamento de articulações com municípios da Secretaria da Educação do Estado, Glauber Lima. Segundo ele, 484 dos 2,6 mil colégios estaduais têm policiais "residentes", que moram no local.
FECHAR
Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:
Violência desafia governos e educadores - Instituto Humanitas Unisinos - IHU