23 Julho 2012
Gravado no frontão ideal de todo edifício religioso cristão, deve sempre brilhar aquele apelo de Jesus: "Todas as vezes que vocês fizeram isso a um dos menores de meus irmãos (famintos, sedentos, estrangeiros, nus, doentes, encarcerados), foi a mim que o fizeram" (Mateus 25, 40). Foi ele, de fato, que introduziu a lei, paradoxal (mas não muito) na economia, do "perder para encontrar", convencido de que "há mais felicidade em dar do que em receber" (Atos 20, 35).
A análise é de Gianfranco Ravasi, cardeal presidente do Pontifício Conselho para a Cultura, em artigo publicado no jornal Il Sole 24 Ore, 15-07-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o artigo.
Roba mia, vientene con me! [Coisa minha, vem comigo]. O grito de Mazzarò que mata a golpes de bastão os seus patos e os seus perus para que o sigam ao túmulo é o lema fulminante que expressa melhor do que qualquer análise psicológica a pulsão compulsiva e impulsiva pela "coisa", como, aliás, se intitula a célebre "novela rusticana" de Giovanni Verga. É difícil não dar razão a São Paulo quando ele classifica "a avareza insaciável como uma idolatria" (Colossenses 3, 5), e é significado notar que o vocábulo fenício-aramaico com o qual Cristo define a riqueza, mammon, está fundamentado na mesma raiz ('mn) do verbo "crer". Ainda dois ou três séculos antes, alinhando-se às ardentes críticas dos profetas, o mais gélido Qohelet-Eclesiastes anotava: "Quem gosta de dinheiro nunca se sacia de dinheiro" (5, 9).
Poderíamos continuar multiplicando longamente as depreciações literárias e espirituais contra esse "antiga loba", cuja "fome jamais se mitiga", como declarava Dante no Canto XX do Purgatório. Anos atrás, quando eu preparei um livro sobre os vícios capitais, os cartões que eu acumulei sobre a avareza se equiparavam aos da luxúria, revelando assim que são essas as duas dominantes também na literatura ("dinheiro", "sexo"), além da história, prevalecendo sobre outras delas como "soberba" e "soldados", que também têm um poder próprio. Pois bem, um renomado filósofo moral, Silvano Petrosino, nos ofereceu o último elo de uma interminável literatura sobre o dinheiro como sinal existente mais do que de instrumento financeiro.
E o fez de modo emblemático, percorrendo livremente textos sugestivos de Kafka, Kojève, Lacan, do amado Levinas e de Simmel, cruzados com outras evocações, ficando sempre atento para marcar a investidura de "fantasma" que o dinheiro que recebe. Mas não caiamos em um equívoco: "O fantasma tem uma tal consistência de ser a ponto de produzir contínuos efeitos da presença". Na verdade, o desejo que o gera o torna mais decisivo do que qualquer outra realidade, faz dele um "paraíso", de meio o entroniza como fim, o venera como onipotente e faz dele uma religião, a idolatria justamente à qual se fazia referência acima.
Divertida, mas pertinente, era a definição de "felicidade para o homem moderno" cunhada por Erich Fromm na sua Arte de amar: "Olhar as vitrines e comprar tudo o que se quiser em dinheiro ou em prestações". Nessa linha, o dinheiro se torna – como escreve Petrosino em um belo capítulo – "o trocador universal" (ou, com Simmel, "o meio absoluto"): "A identidade do dinheiro é justamente o de não tê-la, já que através dele é possível se apossar de qualquer outra identidade".
Karl Kraus, nos seus Ditos e contraditos, nos deixou, porém, uma observação iluminadora: "O vício e a virtude são parentes, assim como o carvão e os diamantes por causa do carbono comum", ou, se se quiser, com Taine, "como o vitríolo e o açúcar", que têm ambos a glicose como base. É por isso, então, que o dinheiro e os bens materiais podem ser, na realidade, instrumentos de uma virtude igualmente capital, a caridade. Precisamente com o subtítulo "Uma teologia dos bens materiais", o estudioso norte-americano de Denver Craig L. Blomberg apresenta uma análise religiosa sua de corte sobretudo bíblico sobre essas realidades cuja moralidade é definida pelo uso que a humanidade faz delas. E a medida de como é escandaloso esse uso resulta do dado estatístico de base: 2% da população adulta do nosso planeta possuem mais da metade da riqueza mundial.
Por isso, é necessário introduzir um conceito diferente de "economia", que a faça voltar a ser realmente nómos (lei) da oikos (casa) da terra na qual todos vivemos, e não uma pura (ou, melhor, impura) e simples (ou, melhor, obscura) técnica financeira, monetária e comercial.
O ensaio de Blomberg percorre todas as Sagradas Escrituras levando em conta a sua mensagem com relação às riquezas, mostrando também a sua evolução, as oscilações, as estruturas permanentes. Tudo é posto sob a insígnia de um lema moderado proposto pelo livro bíblico dos Provérbios, mas curiosamente atribuído a um árabe, um certo Agur, pertencente à tribo de Massa, um clã da Arábia setentrional: "Não me dês riqueza, nem pobreza" (30, 8). A invocação a Deus continuava assim: "Concede-me apenas o meu pedaço de pão, para que, saciado, eu não te renegue, dizendo: 'Quem é o Senhor?'. Ou então, reduzido à miséria, chegue a roubar e profanar o nome do meu Deus".
Naturalmente, o ensinamento bíblico, sobretudo neotestamentário, é mais articulado, e o estudo o mostra, às vezes com aplicações um pouco "à la americana", não sem alguma simplificação. A obra, contudo, continua sendo um instrumento precioso para compreender como a religião judaico-cristã é "encarnada", e como a sua "utopia" é, paradoxalmente, muito mais realista do que o vanilóquio de uma certa política ou das ilusões de finanças enganosas.
Certo é que o princípio regulador supremo continua sendo a caridade, e um estudioso espanhol, Juan Maria Laboa, tentou elaborar uma "história da caridade" ao longo do itinerário bimilenar do cristianismo, partindo justamente daquela advertência que Jesus dirigiu aos seus seguidores na última noite da sua vida terrena: "Nisso todos reconhecerão que vocês são meus discípulos" (João 13, 35).
A trama do livro é necessariamente diacrônica e se confia a uma sequência vivaz de cerca de 50 cenas emblemáticas que veem desfilar, por exemplo, os Padres da Igreja com os seus apelos à justiça social, o monaquismo, um Martinho impresso na memória de todos com o seu manto dividido com o pobre, Francisco de Assis e as Ordens mendicantes, as infinitas instituições de caridade cristãs, a educação dos pobres, as Reduções jesuíticas, até chegar aos padres operários, a Helder Câmara e Oscar Romero, a Madre Teresa e às seu irmãs, à Cáritas e assim por diante.
Apesar dos desvios, das infidelidades, do triunfalismo de alguns dos seus membros, a Igreja empunhou constantemente o estandarte da caridade, e ainda hoje muitos sacerdotes e leigos são a alma do voluntariado social de modo radical e exemplar.
Gravado no frontão ideal de todo edifício religioso cristão, deve sempre brilhar aquele apelo de Jesus: "Todas as vezes que vocês fizeram isso a um dos menores de meus irmãos (famintos, sedentos, estrangeiros, nus, doentes, encarcerados), foi a mim que o fizeram" (Mateus 25, 40). Foi ele, de fato, que introduziu a lei, paradoxal (mas não muito) na economia, do "perder para encontrar", convencido de que "há mais felicidade em dar do que em receber" (Atos 20, 35).
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O dinheiro sem identidade. Artigo de Gianfranco Ravasi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU