16 Março 2012
A última coisa que os católicos norte-americanos querem ouvir é que os mórmons estão tomando o seu lugar no cenário político-cultural.
A opinião é de Massimo Faggioli, doutor em história da religião e professor de história do cristianismo da University of St. Thomas, em Minneapolis, nos EUA. O artigo foi publicado no jornal L'Unità, 15-03-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
O candidato Santorum venceu uma batalha importante no sul dos Estados Unidos, com as vitórias nas primárias do Alabama e Mississippi: no sul que redefiniu a paisagem política norte-americana nas últimas décadas, o católico Santorum alinhou, quase hipostaticamente na sua pessoa, "o sul" e o "voto religioso" no fronte conservador que se opõe a Romney.
Do ponto de vista da identidade teológico-política dos candidatos à nomination republicana, é uma batalha difícil para Mitt Romney. Sua fé mórmon é um problema para os eleitores evangelical republicanos, mas também para o mormonismo, que há cerca de um século tenta se livrar da herança de religiosa perseguida.
As derrotas de Romney no sul reanimam fantasmas dos quais não muitos nos EUA, e especialmente os não mórmons, querem falar. Evocar novamente as recordações das guerras de Utah e das leis contra a poligamia dos mórmons é um "forca caudina" através da qual nem Romney nem a sua Igreja tiveram a força de passar. Romney paga o preço de ser candidato de um partido que fez da alteridade religiosa e racial de Obama o primeiro objetivo, evidente, embora não declarado.
Mas a dialética entre identidades religiosas e de valores concorrentes, os do mórmon Romney e do católico Santorum (e do neocatólico Gingrich), é um problema não só para os mórmons, mas também para os católicos.
No mesmo dia das primárias no Alabama e em Mississippi, ocorria no think tank dos jesuítas do Boston College um dia de estudos sobre o tema "Os mórmons são os novos católicos? Romney e o estado da união política nos EUA". Para muitos católicos que se percebem, com razão, como a maior Igreja dos Estados Unidos e não como uma Igreja teologicamente sectária como a mórmon, o título soa como um alarme. Nestes dias, os bispos norte-americanos se reuniram para tentar desbloquear uma situação que os vê em rota de colisão com o governo Obama acerca da questão da obrigação dos empregadores de oferecer uma cobertura de seguro-saúde que inclua os custos para a contracepção.
Mas não são poucos os que esperam uma mudança de rota da Conferência Episcopal: se é verdade que pesquisas recentes veem um número chocante de norte-americanos (51% na última sondagem CBS/NYT) favoráveis a conceder às Igrejas e aos empregadores o poder de decidir sobre as escolhas de moral sexual dos empregados, também é verdade que o catolicismo é percebido como a força motriz do retorno a uma polêmica, sobre a pílula, que está mais no coração dos católicos "politicantes" do que dos praticantes.
A ascensão do candidato católico Rick Santorum dá a muitos católicos norte-americanos (e não só aos católicos liberais) a impressão de que a doutrina ratzingeriana dos "valores inegociáveis" se curvou à retórica totalmente norte-americana da culture war. Com Santorum nas vestes do aprendiz de feiticeiro, o catolicismo norte-americano corre o risco de voltar a um período, anterior ao Concílio Vaticano II, em que a Igreja de Roma era percebida como uma Igreja heterodirigida, uma força estrangeira hostil à democracia e, portanto, essencialmente antiamericana. Santorum é um político católico de um novo tipo, de uma geração muito distante não só dos Kennedy, mas também da geração do catolicismo tradicional norte-americano.
A contaminação entre o catolicismo tradicionalista de assalto de Santorum (de simpatias com a Opus Dei e os Legionários de Cristo) e a cultura evangélica é totalmente prejudicial à tradição intelectual católica, que nos EUA sempre se orgulhou de se alimentar mais de Santo Agostinho e São Tomás de Aquino do que dos telepregadores politizados como Jerry Falwell e Pat Robertson.
Esses sucessos de Santorum estão embaralhando novamente as cartas dentro do Partido Republicano, mas também dentro da Igreja Católica norte-americana e nas suas relações com Roma. É evidente que estão em risco esses últimos 50 anos de "constitucionalização" do catolicismo norte-americano. A última coisa que os católicos norte-americanos querem ouvir é que os mórmons estão tomando o seu lugar no cenário político-cultural.
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Santorum: quando os católicos são muito semelhantes aos evangélicos - Instituto Humanitas Unisinos - IHU