25 Fevereiro 2012
O episódio dos neutrinos demonstra como a ciência contém dentro de si os anticorpos para os seus possíveis erros. É no processo dialético de demonstrações e refutações que se cela o segredo do sucesso da ciência.
A análise é do matemático e lógico italiano Piergiorgio Odifreddi, em artigo publicado no jornal La Repubblica, 23-02-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
O bom e velho Einstein se salvou. A sua teoria da relatividade, posta em causa pelos experimentos do Cern [Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear] sobre os neutrinos velozes, também se salvou. Foi anunciado que as máquinas usadas para o experimento eram defeituosas.
O episódio nos permite fazer algumas considerações. A primeira, antecipada em muitas décadas pelo próprio Einstein, é que "a ciência não é uma república das bananas, onde revoluções acontecem a cada seis meses".
O público sempre se apaixona pelas mudanças epocais, mas, talvez, na ciência, seja mais útil se concentrar nos aspectos já consolidados, nos resultados adquiridos, e não nas novas ideias que ainda aguardam por confirmações e verificações.
A segunda consideração é, porém, que, no anúncio do experimento, o mundo inteiro se aliou na tentativa de compreender quais seriam as consequências teóricas e práticas de uma velocidade superluminal dos neutrinos. Artigos de jornais, discussões em blogs, seminários de pesquisa revisitaram os fundamentos da relatividade de Einstein, iluminando, às vezes, os aspectos escondidos ou abordagens inovadoras que um século de hábito na teoria havia deixado na sombra.
Em uma entrevista ao nosso jornal, poucos dias depois do anúncio dos resultados do experimento, o prêmio Nobel Shelly Glashow sublinhou quais seriam as consequências de uma confirmação da experiência: consequências tão em contraste com o resto da física conhecida que constituiriam quase uma refutação por absurdo do próprio experimento. Mas essas suas contribuições, juntamente com as de muitos outros, no entanto, nos esclareceram que podemos considerar a velocidade da luz como um limite insuperável e podemos continuar usando a teoria da relatividade como insubstituível.
Os olhos do mundo inteiro se concentram agora, depois da embriaguez dos neutrinos, em outros experimentos do Cern e de outros laboratórios. Em particular, a anunciada e provável descoberta da chamada "partícula de Deus", assim como da esperada, mas por enquanto ainda não verificada, existência de "partículas simétricas".
O episódio demonstra, portanto, como a ciência contém dentro de si os anticorpos para os seus possíveis erros e como, em um breve espaço de tempo, a comunidade científica também pode colocar propostas até mesmo revolucionárias sob o microscópio para verificá-las ou refutá-las. É nesse processo dialético de demonstrações e refutações que se cela o segredo do sucesso da ciência.
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A vingança de Einstein. Artigo de Piergiorgio Odifreddi - Instituto Humanitas Unisinos - IHU