02 Setembro 2013
Depois de mais de nove anos de batalhas jurídicas em diversas instâncias e quatro dias de julgamento, Erinaldo de Vasconcelos Silva, Rogério Alan Rocha Rios e William Gomes de Miranda foram condenados por um júri popular no meio da madrugada deste sábado, 31, a penas que, juntas, somam 226 anos de prisão pelos assassinatos de quatro servidores do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a chamada Chacina de Unaí. Os auditores fiscais Nelson José da Silva, Eratóstenes de Almeida Gonçalves e João Batista Soares Lage e o motorista Ailton Pereira de Oliveira foram mortos em 28 de janeiro de 2004 na zona rural do município do noroeste de Minas Gerais.
A reportagem é de Marcelo Portela e publicada pelo jornal O Estado de S.Paulo, 01-09-2013.
Oito pessoas foram acusadas do crime, mas o julgamento encerrado na madrugada foi o primeiro relativo ao caso. A pena mais pesada foi aplicada a Rogério Alan, sentenciado a 94 anos de prisão. Erinaldo, que confessou o crime, recebeu o benefício da delação premiada e recebeu pena de 74 anos. A sentença mais leve aplicada pela juíza Raquel Vasconcelos Alves de Lima, substituta da 9ª Vara Federal de Belo Horizonte, foi para William, condenado a 54 anos porque o júri popular acatou a tese de que ele teve participação de menor importância por estar no local das execuções - ficou encarregado de providenciar o carro para fuga do trio. A lei brasileira determina que o máximo que uma pessoa pode ficar presa é por 30 anos.
Mas, como o crime ocorreu antes de mudança na legislação que agravou punições para crimes como este, os condenados, que já estão presos há nove anos, têm direito a progressão de regime após cumprirem um sexto da pena, além da remissão de prazo com base em dias trabalhados na cadeia. William, por exemplo, tem direito a passar para o regime semiaberto em poucas semanas. Erinaldo ainda terá que cumprir cerca de três anos em regime fechado antes de receber o benefício, enquanto Rogério Alan terá direito ao benefício em aproximadamente seis anos.
Mesmo assim, a sentença foi comemorada por parentes das vítimas e representantes dos servidores do TEM, que cantaram o Hino Nacional após ouvirem a sentença. Para os integrantes do Ministério Público Federal (MPF), a condenação foi uma dupla vitória porque, segundo o procurador da República Vladimir Aras, "foi comprovado o crime de mando". A avaliação é de que a decisão favorece uma possível condenação dos demais acusados da chacina. Em 17 de setembro começam a ser julgados Hugo Alves Pimenta, José Alberto de Castro, Humberto Pereira da Silva e Norberto Mânica, um dos maiores produtores de feijão do País ao lado do irmão Antério, eleito ainda preso prefeito de Unaí, cargo que ocupou entre 2005 e 2012.
Os Mânica são apontados como mandantes das execuções, mas o julgamento de Antério - cujos filhos Marlon e Márcia acompanharam todo o júri encerrado na madrugada - ainda não tem data marcada. Francisco Élder Pinheiro também era réu, mas morreu em janeiro passado. Todos já estiveram presos, mas, com exceção do trio recém-condenado, todos foram soltos pela Justiça. Segundo o MPF e a confissão de Erinaldo, foi na prisão que Norberto teria oferecido R$ 300 mil para o pistoleiro alegar que o crime foi um latrocínio - roubo seguido de morto.
Debates
Durante o dia, a acusação concentrou-se em convencer os jurados de que a chacina foi um crime de mando que beneficiou fazendeiros autuados por Nelson - principal alvo dos criminosos -, para preparar a acusação para os próximos julgamentos. "O motivo do crime foi acabar com o fiscal porque ele fiscalizava. Se Nelson fosse desonesto, estaria vivo", disse Vladimir Aras, enquanto exibia multas aplicadas a Norberto. Observou ainda que a confissão de Erinaldo não teria validade "se não houvesse provas" para confirmá-la.
A mesma linha de reforçar o peso das provas contra os réus foi seguida pela procuradora da República Mirian Moreira Lima e pelos assistentes da acusação, os advogados Francisco Patente e Rogério Del Corsi. Mirian ainda rebateu as alegações do advogado de Rogério Alan, Sérgio Moutinho, de que o réu foi torturado nas investigações para confessar. Ela lembrou que, ao chegarem a Belo Horizonte, os acusados depuseram à Justiça. "Nos depoimento que deram em juízo, negaram qualquer dano à integridade física", observou.
Defesa
Já a defesa concentrou seus argumentos em críticas às investigações do crime, mas com defesas específicas para cada um dos acusados. Moutinho contestou as provas levantadas pela polícia, principalmente o livro de registro em um hotel de Unaí, que confirmaria a presença de Rogério Alan no município na ocasião do crime. Ele mostrou ao conselho de sentença que as datas de registros não seguiam uma sequência e que não havia auto de apreensão do documento.
Antes, Antônio Filho também havia criticado a investigação e sustentado que a confissão de Erinaldo foi essencial para esclarecer o crime, para garantir o benefício da delação premiada ao cliente. "Ele (Erinaldo) contribuiu para a elucidação dos fatos desde o início. Não soube dizer quem estaria dentro do Marea escuro, mas soube dizer quem pode informar. O Zezinho (José Alberto) conversou com quem estava lá", declarou, referindo-se ao veículo que, segundo o MPF, pertence à mulher de Antério e seria ocupado pelo fazendeiro na véspera do crime.
O último a argumentar foi Celso Rezende, defensor público da União. Ele também tentou convencer os jurados de que o MPF esteve preocupado apenas em acusar os réus ao invés de "promover a lei". E insistiu na tese de "participação de menor importância" de William, acusado de providenciar um veículo para a fuga do trio. "Se alguém pegar um revólver e atirar em alguém, mas for réu primário, de bons antecedentes, pega seis anos de cadeia. Esse moço estava dirigindo para uma pessoa e está há quase dez anos preso. Ele foi jogado nessa situação", disse.
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Júri condena três por Chacina de Unaí - Instituto Humanitas Unisinos - IHU