02 Setembro 2013
A relação fé e política não se reduz à questão da presença e da relevância dos católicos na vida pública, como se o problema fosse contar e ter influência. Não significa condenar-se à insignificância, não tomar a palavra, confinar a fé ao privado, mas sim viver o compromisso como ação educativa, inspiradora, na maneira evangélica do fermento na massa.
Publicamos aqui a apresentação do livro Politica e spiritualità, organizado por Daniele Aucone e Alessandro Cortesi (Ed. Nerbini). O artigo foi escrito pelo teólogo leigo italiano Christian Albini, para o sítio Viandanti, 30-08-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
"E se a vida espiritual fosse uma das condições fundamentais de uma intensa vida social e política?" (Paul Valadier).
Essa interrogação do teólogo e filósofo jesuíta toca um tema um tanto subestimado no debate católico. Parece que a relação fé e política se reduz à questão da presença e da relevância dos católicos na vida pública, como se o problema fosse contar e ter influência. Por isso, é útil esse livro, que reúne as atas de um congresso promovido em Pistoia pelo Centro Espaces Giorgio La Pira, junto ao convento dos dominicanos. Refletir sobre o nexo entre espiritualidade e política traz uma benéfica lufada de oxigênio em três âmbitos.
1. Na política, hoje muitas vezes reduzida a uma luta entre interesses de partido ou, pior ainda, entre interesses pessoais perseguidos mediante o controle das instituições. Trata-se de recuperar o significado profundo dessa atividade humana. "Na política, trata-se de abrir espaço para a dimensão metapolítica, porque existe um vínculo indissolúvel entre política e sentido profundo da vida, entre a atividade política do ser humano e o seu destino final (independentemente se se pensa nele)" (Vincenzo Caprara, p. 67).
Não é o debate para prevalecer sobre o outro que constitui a essência da política, mas sim a busca de uma comunhão, de unidade mais alta das diferenças em campo. A espiritualidade torna-se política, porque se explicita em uma relação com o outro que encerra um sentido, não se detém no instrumental e no útil.
2. Tudo isso também implica um conceito preciso da espiritualidade, que não se detém no devocionismo ou na prática religiosa como fim em si mesma. Estamos do lado oposto do chamado espiritualismo, em um espaço que poderíamos definir, com Raimon Panikkar, como secularidade sagrada. Em outras palavras: laical e não clerical.
"A espiritualidade refere-se ao cuidado do espírito como centro e eixo da vida de toda a pessoa, que afeta a totalidade e a integridade da pessoa, todos os centros da vida, dos mais terrenos, como podem ser a gestão dos bens materiais e o trabalho manual, até as dimensões mais contemplativas da vida; das experiências mais interiores do sujeito até às mais sociais da pessoa..." (Felicísimo Martinez Diez, p. 77).
A espiritualidade diz respeito à vida, incluindo a política, e não a uma esfera religiosa separada e distinta do resto da realidade. A autêntica espiritualidade está imersa na história. É um campo em que também podemos nos entender com o não crente, em uma acepção ampla de espiritualidade entendida como "tudo o que me ajuda a ver, acolher e promover o humano que há em mim e nos outros" (Stefano Grossi, p. 94), um humano que no específico cristão assume o rosto de Jesus de Nazaré.
3. A partir do que foi dito até agora, deriva uma visão precisa do compromisso do católico na política. Não se trata, em primeiro lugar, de uma relevância ou de um "fazer" mensuráveis no número de parlamentares ou de leis às quais se possa aplicar uma etiqueta de "católica". Isso significaria esquecer que, em um contexto democrático, o compromisso histórico do crente permite diversas opções partidárias e legislativas, mas, acima de tudo, pôr de lado o próprio da espiritualidade cristã que, na política, é um estilo de habitar a polis segundo a forma do Evangelho.
"Assim, Cafarnaum é cidade enquanto vilarejo das relações e dos encontros na estrada, no mar, na frente das casas (Mc 1,21-2,17). O que constrói a cidade não são tanto as construções e as arquiteturas de edifícios e de casas, mas sim a articulação de percursos humanos que são chamados a se cruzar, a se entrelaçar, a encontrar nos espaços à medida do homem a possibilidade de viver as dimensões fundamentais do viver humano, o trabalho, a festa, o cuidado, o amor, a intimidade, o serviço" (Alessandro Cortesi, p. 199).
O compromisso político se configura, assim, como ocasião de encontro, diálogo, mediação, construção de uma casa comum. Poderíamos dizer, com uma expressão sintética, que é um ato de laicidade no sentido alto da palavra. Eis o que o cristão deveria buscar, em vez de qualquer forma de "ocupação" do espaço público, por mais pacífica e com bons fins. O que não significa condenar-se à insignificância, não tomar a palavra, confinar a fé ao privado, mas sim viver o compromisso como ação educativa, inspiradora, na maneira evangélica do fermento na massa.
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Dar uma nova alma à política. Artigo de Christian Albini - Instituto Humanitas Unisinos - IHU