Por: Cesar Sanson | 01 Abril 2013
Terra de Direitos, Comissão Pastoral da Terra – CPT (BR 163 e Santarém) e o Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB protocolam nesta segunda-feira, 1º de abril, documento no Ministério Público Federal denunciando a situação de tensão e conflito iminente nas comunidades afetadas pelo projeto da Usina Hidrelétrica São Luis do Tapajós, e solicitando a suspensão imediata de todos os estudos e trabalhos realizados no interior das comunidades e aldeias indígenas.
A reportagem é do sítio Terra de Direitos, 01-04-2013.
O povo amazônida, indígena, quilombola, caboclo, ribeirinho, trabalhador rural, das cidades, rico por e pela natureza, vem progressivamente sendo ameaçado, violentado, expulso e alienado pelo modelo de desenvolvimento implementado pelos grandes empresários, corporações multinacionais e pelo Estado Brasileiro na região.
Considerados prioritários para governo, mas ainda não discutidos com qualquer cidadão ou comunidade afetada, a previsão de sete projetos hidrelétricos no Tapajós e a imposição dos procedimentos para sua a construção não difere dos métodos utilizados no restante na Amazônia, tão pouco dos tempos de ditadura militar e do Brasil-Colônia: implementação forçada e autoritária de grandes projetos, criminalização de movimentos sociais, invisibilização e expulsão das populações tradicionais e indígenas dos seus territórios, aumento do desmatamento, violação de direitos humanos, geração de migração artificial, inchaço das periferias urbanas, aumento da criminalidade e violência contra as mulheres e crianças, precarização dos serviços básicos de saúde e assistência públicas, aumento da desigualdade social, econômica e ambiental, privatização dos bens comuns, entre outros.
Nesse sentido, o Estado Brasileiro, na região Oeste do Pará, vem demonstrando total desrespeito com a Constituição Federal, com os direitos indígenas e dos povos tradicionais, com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho e com a decisão da Justiça Federal em Santarém. Na ultima quarta-feira, dia 27, o Governo Federal enviou 250 integrantes da Força Nacional de Segurança Pública, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Força Aérea Brasileira à cidade de Itaituba-PA para garantir a execução da ultima etapa de levantamento de informações ambientais na região do médio e alto Tapajós, que irá compor o Estudo de Impacto Ambiental para a obtenção das licenças ambientais do complexo hidrelétrico.
Ao contrário do que alega o governo brasileiro, o licenciamento ambiental do Complexo Tapajós segue violando os direitos humanos ao território, ao meio ambiente, à dignidade humana, à defesa da cultura e à garantia social. A presença hostil de forças policiais inibe qualquer manifestação ou ato indígena em defesa do seu próprio território. Sem qualquer informação oficial, o processo segue sem a realização da Consulta Prévia, Livre e Informada das comunidades afetadas, o que é exigida pela Convenção 169 da OIT, da qual o Estado brasileiro é signatário e que goza de status materialmente constitucional, em razão dos direitos que assegura.
Dessa forma, a operação ainda é uma patente violação à decisão da Justiça Federal em Santarém, que suspendeu o licenciamento ambiental por justamente não haver ocorrido as consultas prévias aos povos indígenas. Neste sentido, as entidades signatárias desta nota protocolaram na data de hoje, junto ao Ministério Público Federal, documento denunciando as situações de tensão e conflito decorrentes da continuidade dos estudos e trabalhos realizados pelas empresas nas comunidades afetadas pela UHE São Luis do Tapajós, reivindicando que seja requerido na justiça a imediata suspensão de todos os estudos e trabalhos, até que a devida consulta prévia seja efetivamente realizada.
DENUNCIAMOS A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS promovida pelo ESTADO BRASILEIRO na região do Tapajós, REPUDIAMOS a REPRESSÃO ARMADA para a realização do LICENCIAMENTO AMBIENTAL sem a devida realização da CONSULTA LIVRE, PRÉVIA E INFORMADA e EXIGIMOS o IMEDIATO CUMPRIMENTO DA DECISÃO JUDICIAL E DOS DIREITOS GARANTIDOS PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E OS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS.
Por isso, vimos a público declarar nossa solidariedade ao povo Munduruku, à comunidade de Pimental (Trairão/PA) e à luta pelo nosso rio Tapajós, pelo nosso território, pela nossa cultura e identidade, por justiça!
Na oportunidade, divulgamos a “Carta de Itaituba”, resultado do encontro que reuniu os Povos do Tapajós, realizado no dia 23 de março e assinado pelos movimentos, comunidades e organizações presentes.
A carta, elaborada às vésperas desta operação autoritária sem qualquer conhecimento sobre a sua existência ou realização, acaba por anunciar a situação de tensão permanente e risco iminente da explosão de conflitos decorrentes do conjunto de violações concretizadas na grilagem terras, na exploração ilegal de madeira, na expansão dos monocultivos exógenos à região, e na imposição dos trabalhos de empresas e forças de segurança responsáveis pela implementação autoritária dos projetos de infraestrutura sem o devido debate e consulta às comunidades.
Eis a carta.
Nós, movimentos sociais e populares, entidades, federações, associações, organizações e lideranças abaixo assinados, presentes no encontro que reuniu os Povos do Tapajós, realizado no dia 23 de março de 2013, na cidade de Itaituba, estado do Pará, debatemos e deliberamos pela construção e realização de um processo de luta unificada em defesa dos direitos humanos, do meio ambiente, dos direitos territoriais, da floresta e dos povos amazônicos.
O modelo de desenvolvimento implementado na Amazônia, de grandes obras de infraestrutura, como o Complexo Hidrelétrico Tapajós e grandes projetos como a expansão dos monocultivos, não trazem o prometido “desenvolvimento” para a região. Entendemos que esses projetos, na verdade, servem para atender os interesses de grandes empresas nacionais e internacionais, são implantados sem o consentimento do povo da Amazônia e acabam por destruir as formas locais de vida, pois geram grandes danos ambientais e se apropriam de terras que são reivindicadas por indígenas e povos e comunidades tradicionais.
Assim, o nosso entendimento comum é que esse modelo de desenvolvimento intensifica a ofensiva do capitalismo sobre os territórios e os recursos naturais da Amazônia; as violações de direitos humanos e a criminalização dos movimentos sociais tudo com a conivência do Estado brasileiro.
Dessa forma, contrário do que alega o governo, nesse modelo não há participação democrática das populações locais. O licenciamento ambiental do Complexo Tapajós, por exemplo, segue violando os direitos de participação e informação das comunidades e populações urbanas afetadas. O processo segue sem a realização da Consulta Prévia, Livre e Informada das comunidades afetadas, o que é exigida pela Convenção 169 da OIT, a qual o Estado brasileiro é signatário e que goza de status materialmente constitucional, em razão dos direitos que assegura.
Diante da falta de consulta prévia às comunidades afetadas e de Avaliação Ambiental Integrada (AAI) o Ministério Público Federal em Santarém pediu a suspensão dos estudos da UHE de São Luiz do Tapajós (processo n. 3883-98.2012.4.01.3902). A Justiça Federal de Santarém em 19 de novembro de 2012, proferiu decisão judicial em que proíbe a concessão de licença ambiental prévia para a construção da usina. No entanto, decisão judicial tem sido ineficaz na medida que as empresas continuam a entrar nos territórios das comunidades para realizar estudos e levantamentos, sem um amplo debate democrático sobre a implementação do complexo tapajós e sem o cumprimento do direito de consulta livre, prévia e informada aos povos indígenas e populações tradicionais.
Nesse sentido, de modo a prevenir o agravamento dos conflitos na região, exigimos a tomada de providências pela Justiça Federal e Ministério Público Federal, a fim de que seja determinada a imediata suspensão dos trabalhos e dos estudos para a construção da UHE de São Luiz do Tapajós, até que seja realizada de maneira efetiva, e com garantia dos direitos, da opinião e da vontade das comunidades afetadas, a consulta livre, prévia e informada sobre os rumos do desenvolvimento na nossa região.
Entidades, movimentos e povos que assinam a presente carta:
Associação de Mulheres do Município de Aveiro/Pa
Associação Indígena Açaizal Sagrada Família – Santarém/Pa
Associação indígena PUSSURU – AIP – Jacareacanga/Pa
Associação indígena Pahyhyp – Itaituba/Pa
Associação de Moradores a Agricultores da Comunidade São Francisco
CPT – Comissão Pastoral da Terra BR 163 e Santarém
Comissão Justiça e Paz – Município de Placas/Pa
CITA – Conselho Indígena Tapajós Arapiuns
FOQS – Federação das Organizações Quilombolas de Santarém
FDA – Frente em Defesa da Amazônia
GUATAMURU – Associação dos Extrativistas da Resex Renascer – Prainha/Pa
MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens
Movimento Nacional dos Pescadores e Pescadoras Artesanais – Aveiro/Pa
Pastoral Social do Município do Município de Trairão/Pa
Pastoral Social da Diocese do Município de Óbidos/Pa
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Município de Itaituta/Pa
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Município de Aveiro/Pa
SDDH – Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos
Terra de Direitos – Organização em Direitos Humanos
Veja também:
Conjuntura da Semana. Amazônia: A última fronteira de expansão do capitalismo brasileiro
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Em defesa da luta das comunidades e povos indígenas em face da imposição de projetos de desenvolvimento na Amazônia - Instituto Humanitas Unisinos - IHU